O globo, n. 31139, 08/11/2018. País, p. 4

 

Conta de R$ 4 bi

Manoel Ventura

Mateus Coutinho

Carolina Brígido

Amanda Almeida

08/11/2018

 

 

Senado aumenta salário de ministros do STF

Apesar dos apelos do presidente eleito, Jair Bolsonaro, o Senado aprovou ontem o projeto que reajusta o salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) de R$ 33,7 mil para R$ 39,2 mil, que tem impacto sobre todo o funcionalismo. Foram 41 votos favoráveis, 16 contrários e uma abstenção.

Referência para outras carreiras do Judiciário, o aumento de 16,38% provocará um efeito cascata na folha de pagamentos de outras categorias de servidores da União e dos estados. O impacto estimado é de cerca de R$ 4 bilhões ao ano.

Bolso na romani festou preocupação coma ampliação do rombo fiscal, mas os senadores ignoraram apelo público para não votar essa matéria. O texto depende agora da sanção do presidente Michel Temer para entrar em vigor.

Antes da votação, o presidente eleito afirmou que via com “preocupação” o reajuste neste momento. Apesar disso, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), levou a votação adiante. Ele deu prioridade ao tema depois de ter recebido um apelo conjunto do presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, da procuradora-geral da República, Raquel Dodge, e de entidades da magistratura que, em troca do aumento, se comprometeram em rever as regras, ainda neste ano, do auxílio-moradia.

A ideia da Corte é conceder o benefício apenas a juízes que não possuem residência própria no local de atuação. Hoje, boa parte dos magistrados recebe o benefício sem nenhum tipo de restrição.

O presidente do Supremo agradeceu ao Congresso pela aprovação do reajuste e disse que agora será possível “enfrentar” a questão do auxílio-moradia. O ministro Gilmar Mendes, também do STF, foi na mesma linha e disse que o aumento é necessário. Toffoli afirmou que vai conversar com o relator do caso, Luiz Fux, para discutir o melhor momento de pautar as ações sobre o tema.

— Em nome de todo o Poder Judiciário, eu gostaria de agradecer ao Congresso a aprovação desse projeto. Principalmente porque

agora poderemos enfrentar a questão do auxílio-moradia. Vou conversar com o relator do caso, o vice-presidente do Supremo, Luiz Fux, para ver a melhor hora de nós deliberarmos a respeito —disse Toffoli.

Ao ser questionado sobre o apelo do presidente eleito, Eunício disse que não foi procurado por Bolsonaro nem por seus auxiliares e, por isso, não viu motivos para adiar a votação.

— Eu não recebi nenhuma ligação, nenhuma manifestação, nem do presidente eleito nem de ninguém que está na transição. Ele podia ter ligado. Eu teria consultado se alguém tinha interesse de retirar a urgência —afirmou o presidente do Senado.

Fala de Guedes pesou

Ao comentar, na manhã de ontem, a possibilidade de votação do reajuste, Bolsonaro disse que o Judiciário era o poder “mais bem aquinhoado” da República e pediu “um gesto de grandeza” ao não levar adiante a proposta de aumento.

— Nós sabemos que o Judiciário é o mais bem aquinhoado entre os poderes, a gente vê com preocupação. Obviamente não é o momento. Todos têm que colaborar para que o Brasil saia dessa crise e o Poder Judiciário, no meu entender, em um gesto de grandeza, com toda a certeza, não fará tanta pressão assim por esse aumento de despesa.

Pesaram na decisão de Eunício as declarações do futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, que defendeu uma “prensa” no Congresso para votar a reforma da Previdência. O episódio foi o prosseguimento de um entrevero que começou no gabinete de Eunício.

Na manhã de terça, quando diferentes autoridades da República aguardavam no Senado o começo da sessão solene que comemorou os 30 anos da Constituição, Guedes foi abordado amistosamente pelo emedebista, que perguntou quais seriam as preocupações do presidente eleito com o Orçamento de 2019, ainda em tramitação no Congresso.

Guedes respondeu dizendo que não estava muito preocupado com o Orçamento e que a única prioridade do momento era a Previdência. Se não fosse aprovada, disse Paulo Guedes, a responsabilidade por uma eventual “volta do PT” ao poder seria “de vocês”, no caso, de Eunício e dos parlamentares. O diálogo foi relatado ao GLOBO por diferentes senadores. Questionado sobre o episódio, Guedes se limitou a dizer que ap rio rida deéa provara reformada previdência.

A medida é apenas a primeira das chamadas pautas-bomba armadas para o próximo governo. No meio do mês passado, em apenas dois dias de votações, o Congresso aprovou projetos que deixam uma despesa de R$ 8,5 bilhões para o presidente eleito. Apenas a derrubada do veto de Temer ao piso salarial para agentes comunitários de saúde deixará uma fatura de R$ 4,8 bilhões. Também foi aprovada uma medida que permite a renegociação de dívidas de produtores rurais.

Além dos ministros do Supremo, o Senado também avalizou o aumento do salário do procurador-geral da República em votação simbólica.

39,2 mil

Será o novo salário dos ministros do Supremo O reajuste de 16,38% é usado como base para outras categorias de servidores da União e estados

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Bolsonaro diz que consultará Toffoli antes de decisões

André de Souza

08/11/2018

 

 

Em reunião, presidente eleito sinaliza que buscará avaliação do comando do Supremo para reduzir ‘resistência’ no Parlamento

O presidente eleito, Jair Bolsonaro, disse ontem ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, que pretende consultá-lo antes de tomar algumas decisões. O objetivo é diminuir eventuais resistências do Congresso a propostas enviadas pelo Executivo. Em resposta, Toffoli concordou. Os dois se encontraram ontem de manhã no Supremo.

— Muitas vezes, antes de tomar uma decisão, vou procurar Vossa Excelência para que essa decisão seja o melhor embasada possível e tenha menor grau de resistência por parte do Parlamento — disse Bolsonaro, que depois ainda acrescentou: — Pode ter certeza, Vossa Excelência, de que, muitas vezes, antes de tomar uma iniciativa, o procurarei para que a gente possa aperfeiçoar essa ideia e, ela, de forma mais harmônica, siga seu curso no Parlamento.

Toffoli respondeu dizendo que o diálogo pode evitar “choque posterior”:

— Eu acho que antes de uma medida ser tomada do ponto de vista legislativo, muitas vezes dialogando aqui poderemos evitar que depois, lá na frente, venha a se ter uma declaração ou uma decisão do Supremo que entre em choque.

Na última segunda-feira, o GLOBO mostrou exemplos de possíveis conflitos entre o futuro presidente e a Corte, a partir de ideias defendidas por Bolsonaro que já tiveram decisões contrários do Supremo. Uma delas é sobre a superlotação dos presídios.

Ao falar sobre a gestão de Bolsonaro, o presidente do STF apontou três desafios que considera os principais do novo governo: Previdência, área fiscal e segurança pública. Ele propôs um pacto republicano, em que os diferentes poderes mantêm sua independência, mas atuam de forma harmônica, colaborando para soluções.

Toffoli deu de presente a Bolsonaro uma edição comemorativa de 30 anos da Constituição. Eles também falaram de futebol. Ambos torcem para o Palmeiras, que lidera o Campeonato Brasileiro com cinco pontos à frente do segundo lugar, o Internacional, faltando seis rodadas para o final.

—Vamos ser campeões este ano? — perguntou o presidente eleito.

— Vamos ser campeões — respondeu Toffoli.

Também participaram do encontro três dos filhos de Bolsonaro, entre eles o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que causou polêmica ao dizer que bastavam um soldado e um cabo para fechar o STF.