Título: A folha polêmica do Legislativo
Autor: Jeronimo, Josie ; Kleber, Leandro
Fonte: Correio Braziliense, 08/07/2012, Política, p. 2/3

Divulgação das remunerações de servidores da Câmara dos Deputados e do Senado trarão os nomes dos cerca de 1,5 mil funcionários que recebem acima do teto constitucional, de R$ 26,7 mil

Muitos servidores se desesperam, a sociedade civil comemora e a Câmara e o Senado adotam a estratégia do "divulga você primeiro" antes de inserirem o Legislativo federal na era da transparência da folha de pagamento. As duas Casa devem divulgar, nos próximos dias, os contracheques de 21 mil funcionários efetivos e comissionados. A partir daí, os cidadãos poderão conhecer os 1.576 servidores identificados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) que recebem acima do teto constitucional de R$ 26,7 mil.

Os supersalários do Congresso também estão na mira do Ministério Público Federal (MPF), que engrossa com pareceres os seis volumes de processo em curso na 9ª Vara do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. A Justiça analisa como as Casas gastam verba pública do Orçamento na composição dos salários, concedendo pelo menos 45 diferentes tipos de gratificações, muitas delas não sujeitas ao abate-teto, drible que possibilita o estouro do limite constitucional.

Só as vantagens eventuais que engordam o contracheque dos servidores do Senado, por exemplo, custam R$ 157,7 milhões por ano aos cofres públicos. Desse montante, R$ 70,6 milhões são gastos considerados irregulares pelo TCU, o equivalente a 44,7% dos penduricalhos salariais.

Em janeiro deste ano, a Procuradoria da República no Distrito Federal publicou portaria convertendo o procedimento administrativo que reunia informações da folha de pagamento da Câmara e do Senado em inquérito civil público. Os indícios de irregularidades na folha de pagamento foram estimados em R$ 2,5 bilhões.

O Correio questionou o Senado e a Câmara sobre qual seria o formato de divulgação dos salários e se eles detalhariam os benefícios que compõem o salário bruto do servidor. As Casas, no entanto, não responderam até a publicação desta edição. O salto salarial, em relação ao rendimento previsto nas horas trabalhadas estipuladas para o funcionário, e o vencimento final chamaram a atenção dos órgãos de fiscalização. Para ilustrar o peso dos penduricalhos, o TCU pinçou o exemplo de um servidor do Senado que tem salário de R$ 6.411 e, após aporte de oito gratificações, recebe R$ 23.764.

Trabalho extra A sociedade também espera que a abertura dos contracheques coloque um fim na caixa-preta das horas extras. Em 2011, o Congresso destinou R$ 64 milhões do seu orçamento de pessoal para pagar o chamado serviço extraordinário. O benefício é protegido contra as regras do abate-teto e a consultoria do Senado chegou a formular parecer deixando claro que o servidor só poderá sofrer desconto se o montante das horas extras recebidas ultrapassar os R$ 26,7 mil.

Nas listas das informações turvas que podem ganhar luz com a divulgação dos salários, está o pagamento de funções comissionadas. O valor do penduricalho e o posto ocupado pelos beneficiados ainda não estão à disposição dos que se interessam pela qualidade dos gastos públicos. Cruzamento de dados da folha do Senado e do cargo de servidores verificou que pelo menos 83 funcionários incorporaram um quinto do valor de função comissionada sem que nem mesmo tenham sido designados para o posto. A informação está no inquérito em tramitação na Justiça Federal.

A política de reajuste de benefícios de inativos e pensionistas no Senado também estará sob o crivo da fiscalização pública após a publicação dos gastos. O Senado foi questionado, na auditoria do Tribunal de Contas que integra o processo do TRF, sobre a regra de atualização aplicada às pensões e aposentadorias. Estudo encontrou paridade de reajuste em relação aos ganhos salariais de funcionários da ativa, desde 19 de abril de 2004, contrariando determinação que define outro índice para a correção dos inativos.

Penduricalhos onerosos As vantagens eventuais são benefícios que não constituem parcela fixa nos vencimentos do servidor, como abonos e recursos oriundos de sentenças judiciais. Na remuneração, acréscimos de auxílio-moradia, alimentação, transporte, diárias e gratificações específicas de categorias funcionais também podem engordar o contracheque. Os benefícios variam de acordo com o órgão gestor, carreira e nível hierárquico do servidor.