Título: Aumenta a presença estrangeira
Autor: Ribas, Sílvio
Fonte: Correio Braziliense, 08/07/2012, Economia, p. 16

O capitalismo brasileiro começou o semestre menos verde e amarelo. A perda para investidores estrangeiros do comando acionário de empresas símbolos em diversos setores, uma delas até centenária, evidenciou dificuldades da livre-iniciativa em resistir à crise internacional e em obter financiamento barato. Nos últimos meses, em particular o último, orgulhos nacionais jogaram a toalha. De uma hora para outra, as marcas líderes do varejo no país — Pão de Açúcar e Carrefour — reproduzem o mesmo embate que travam pelo mercado francês. Isso porque, após seis décadas sob controle da família do empresário Abílio Diniz, o sócio francês Casino tomou as rédeas do Pão de Açúcar.

Ao lado da expressiva presença estatal na economia, a desnacionalização de companhias privadas revela ainda a impossibilidade de o setor privado nacional capturar plenamente os bônus do cobiçado mercado interno. Nessa mesma toada, a rede de churrascarias Fogo de Chão passou às mãos do fundo norte-americano THL, e a Yoki se incorporou ao grupo alimentício General Mills, também dos Estados Unidos. Não escapou nem a tradicional cachaça cearense Ypióca, fundada em 1846, que agora faz parte do leque da britânica Diageo, dona do uísque Johnnie Walker.

Para completar a invasão estrangeira, a maior companhia aérea do país, a TAM, fundada há 36 anos pelo comandante Rolim Amaro, passou a pertencer à chilena LAN dentro da operação que criou o grupo Latam. A onda de desnacionalização em curso começou no fim do ano passado, quando a Camargo Corrêa e a Votorantim venderam sua participação na Usiminas para o conglomerado argentino Techint, que agora controla a gigante do aço ao lado dos japoneses da Nippon Steel. Com grande carga simbólica, a primeira siderúrgica brasileira a ser privatizada, em 1991, é presidida desde janeiro pelo argentino Julián Eguren, em substituição a Wilson Brumer, que ficou quase dois anos no cargo.

Desvantagem Júlio Gomes de Almeida, diretor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), explica que a perda de mercado e de investidores das empresas de capital nacional se deve a uma combinação de fatores que minam a competitividade do país. O principal deles é ter apenas o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) como fonte de financiamento de longo prazo cobrando juros mais próximos dos praticados no exterior. "A situação externa é extremamente grave para a indústria e fica mais complexa tendo um único financiador", ressalta.

O economista acha que a política de redução da taxa básica de juros (Selic), o câmbio mais competitivo e a desoneração de alguns setores industriais foram um alento para o setor produtivo. Mas o maior obstáculo para a redução das desvantagens em relação a competidores externos está na estrutura tributária que onera mais os insumos e as linhas de produção do que o consumo e os serviços. "Isso dificulta tanto baratear nosso produto exportado quanto onerar o produto importado", resume.

Luiz Aubert Neto, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), acredita que a atual onda de desnacionalização de empresas é a etapa posterior da rápida desindustrialização do país, iniciada há quatro anos. Na sua opinião, a política econômica centrada no estímulo ao consumo, em vez de focada na redução de custos da produção e no investimento, enfraquece a cadeia produtiva local e favorece a importação. "Compramos de fora cada vez mais peças e até produtos inteiros para atender a demanda. O país corre risco e podemos voltar a ser colônia", afirma. O setor de bens de capital ainda não se recuperou da crise de 2008, quando faturou R$ 84,4 bilhões. Ano passado, a receita do segmento somou R$ 81,2 bilhões.

Para Luiz Motta, sócio da KPMG, o investimento externo ganha impulso até em setores onde o capital nacional é tradicionalmente majoritário, como a tecnologia da informação. "É a consolidação da tendência de fortalecimento da presença estrangeira no país verificada há algum tempo", diz ele.

Apetite voraz O avanço da participação de estrangeiros em fusões e aquisições de empresas brasileiras levou o primeiro semestre a bater novo recorde no total de operações deste tipo. Segundo pesquisa da KPMG, os seis primeiros meses de 2012 somaram 433 operações, 54 a mais que em igual período do ano passado, uma alta de 14,2%. Do total de operações, 225 envolveram ativamente empresas estrangeiras, enquanto que as brasileiras somaram 183.