Correio braziliense, n. 20241, 21/10/2018. Economia, p. 8

 

Pauta cheia para depois das urnas

Rodolfo Costa 

21/10/2018

 

 

O presidente Michel Temer está ansioso para o fim das eleições. O governo federal pretende colocar para votação a toque de caixa 10 projetos que estão no Congresso Nacional, encerrando o ano e o mandato com algum prestígio. A aprovação dessas medidas — todas de ordem econômica — pode depender, no entanto, do presidente eleito. Especialistas avaliam que, independentemente do vencedor, o emedebista enfrentará dificuldades. Com Jair Bolsonaro (PSL) se sagrando o campeão nas urnas, o Palácio do Planalto teria mais facilidades para aprovar algumas das medidas. Caso Fernando Haddad (PT) o supere, os obstáculos de convencimento com o atual Parlamento seriam maiores.

A prioridade de Temer é aprovar a reforma da Previdência depois das eleições. Bolsonaro já se mostrou contrário a isso, mas ontem se manifestou de forma favorável a um texto mais ameno (leia na página 9). A vontade do atual ocupante do Planalto é articular o encaminhamento da proposta com o eleito, argumentando que seria um favor à próxima gestão e ao país. Se Haddad for eleito, isso ficará nos sonhos do emedebista. O diálogo com o PT é inexistente, sobretudo no que se refere à atualização das regras de aposentadoria propostas pelo governo.

Independentemente da reforma da Previdência, Temer pode articular a aprovação de 10 medidas. São seis projetos de lei, sendo três no Senado e três na Câmara, além de quatro Medidas Provisórias (MPs). Entre as propostas, duas tratam sobre impactos orçamentários: a MP 846/18, que trata do financiamento dos ministérios da Segurança Pública, Cultura e Esporte por meio de arrecadações das loterias federais, e a MP 849/18, que trata do cancelamento do reajuste dos servidores públicos.

Entre as MPs, duas são polêmicas e o governo tenta aprová-las desde antes da Copa do Mundo. A PLC 78/18 aborda a cessão onerosa da Petrobras. Trata de um contrato firmado em 2010, em que o governo cedeu uma parte da área do pré-sal para a Petrobras, que teve o direito de explorar cinco bilhões de barris de petróleo. Com a descoberta de volume maior de petróleo na área, o governo irá vender o excedente da área. Outra é o PLC 77/18, sobre a venda das distribuidoras da Eletrobras.

 

Caneta

Ainda que Temer detenha o poder da caneta e o assento presidencial mesmo depois das eleições, não será simples aprovar propostas polêmicas sem o apoio do presidente eleito. Tradicionalmente, o Parlamento evita a aprovação de projetos sensíveis sem o consentimento do futuro chefe do Planalto. Por esse motivo, será difícil imaginar que deputados e senadores aceitem votar projetos como a cessão onerosa e a privatização das distribuidoras da Eletrobras, avalia o cientista político e sociólogo Paulo Baía, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Sendo Haddad ou Bolsonaro, qualquer pauta terá muita dificuldade. Toda pauta será centrada no novo presidente. É difícil imaginar que alguma matéria será aprovada depois das eleições, tendo pressão do Congresso eleito e do novo presidente”, justificou.

O cientista político Cristiano Noronha, sócio e vice-presidente da Arko Advice, endossou a análise. Ainda ressalta que Temer terá menos de dois meses para aprovar as matérias e que, por isso, o foco pode ser a aprovação de MPs. “São matérias que requerem quórum simples e que têm prazo de validade. A aceitabilidade do Congresso pode ser melhor”, sustentou.

A vitória de Bolsonaro nas urnas pode ser favorável para a aprovação de alguns projetos de lei. A visão de abertura da economia e a agenda fiscal do capitão reformado do Exército se assemelha mais à gestão Temer, o que pode facilitar a costura política com o atual Congresso, pondera Antônio Augusto de Queiroz, diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). “Projetos que estão no Senado podem ser mais viáveis. Mas a chance de aprovação é ‘zero’ com Haddad”, analisou.

 

Chave de Ouro

A cessão onerosa e as distribuidoras da Eletrobras são prioridades para o governo. A esta altura do ano, outras propostas outrora prioritárias agora são avaliadas como “desejos”, elenca o ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, Carlos Marun. O momento, admite, é de discutir com o Parlamento o que os presidentes de ambas as casas pensam ser prioritário. “O que nós vamos efetivamente pleitear são as MPs”, afirmou.

Até o fim do ano, outras matérias ainda devem ser encaminhadas para aprovação no Congresso. Devem contemplar textos do programa que o governo denominou “Chave de Ouro”. Consiste na retomada de cerca de 20 obras que passarão a ser tratadas como obras. Para tocar o projeto adiante, Marun explica que serão remanejados recursos para viabilizar a conclusão das obras.