Título: Empreendedorismo no combate à pobreza :: Paulo Roberto Feldmann
Autor:
Fonte: Correio Braziliense, 12/07/2012, Opinião, p. 17

Presidente do Conselho da Pequena Empresa da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP) e professor da USP

A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável não deixou saldo expressivo. Mesmo assim, devemos ressaltar o que ficou de positivo na intenção de combater a pobreza no mundo. Consensualmente, definiu-se que acabar com a miséria deve ser meta primordial da humanidade, e os números reforçam a decisão: quase 20% dos 7 bilhões de habitantes do planeta ainda vivem em condições subumanas, abaixo da linha da miséria. Portanto, é hora de traçar medidas efetivas.

Concentrando a análise no Brasil, empregos são fundamentais para essa conquista, mas como gerá-los de forma definitiva, abrangente e sem significativas flutuações? Mesmo tendo a criatividade como uma das virtudes, o empreendedor brasileiro não encontra respaldo, tanto pela ausência de políticas públicas ou programas de incentivo como pela falta de entendimento sobre microcrédito, também um instrumento para o combate da miséria. Embora insuficiente para dar conta da demanda e ainda cercada por burocracias, a criação da categoria Microempreendedor Individual (MEI) vai ao encontro das expectativas de criar um conjunto de ações realmente eficientes para incluir cada vez mais pessoas no mercado formal. Já são quase 2 milhões de trabalhadores integrados ao MEI.

Também são bem-vindas as experiências de países que apostam em mecanismos de fomento e investem em medidas de consolidação do empreendedorismo — se isso não elimina, no mínimo atenua o número de miseráveis. Como consequência, há desburocratização, facilitação do acesso ao crédito, redução das taxas de juros e, sobretudo, formação e capacitação de pessoas. O sistema de microcrédito possibilitou, por exemplo, que mulheres comprassem máquinas e se tornassem costureiras, e jovens adquirissem laptops e os usassem como ferramenta de trabalho.

Na Itália, a legislação prevê a figura do consórcio, estímulo ao fortalecimento de micro e pequenas empresas. Lá, elas assumem 42% das exportações. Aqui, a equação é de um irrisório 1,2%. Mais: no Brasil, elas são 99,1% do total, respondem por 60% dos empregos e participam de 20% do PIB. Ainda na Europa, grandes empresas recebem incentivos para que desempregados comprem equipamentos. A produção é depois negociada com as facilitadoras. Até mesmo o governo cubano, que recentemente demitiu 500 mil funcionários, estimula a criação e a consolidação do empreendedorismo.

Mas um cenário correlato deve ser mencionado e visto como desestímulo ao setor. O país exagera nas exigências burocráticas para a abertura de um negócio. São 120 dias para abrir uma empresa, inconveniência que posiciona o Brasil em 173º lugar entre 183 economias. Os quatro meses equivalem ao dobro exigido na vizinha Colômbia. Há um projeto em discussão em São Paulo que pretende criar uma espécie de Poupa Tempo da Pessoa Jurídica, com o objetivo de encurtar prazos e cortar gastos.

Antes mesmo de encorajar o cidadão a pensar como microempresário, é preciso derrubar substancialmente as taxas de mortalidade das pequenas empresas, consideradas as maiores do mundo (apenas 25% delas sobrevivem depois de cinco anos). Ajudar o segmento a ser competitivo e inovador assola a crônica e histórica baixa produtividade. Sem o setor fortalecido e pronto a encarar desafios, o Brasil não terá desenvolvimento sustentável ou deixará de ser um país com milhares de miseráveis.