Título: Da sala de aula ao poder
Autor: Filizola, Paula
Fonte: Correio Braziliense, 13/07/2012, Política, p. 4

Comparados constantemente às gerações que lutaram contra a ditadura ou pelo impeachment do então presidente Fernando Collor de Mello, os jovens atuais são criticados pela falta de interesse político e de ideologias e pela acomodação diante das malezas do Brasil. No entanto, estatísticas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) revelam uma juventude disposta a ingressar na vida pública e mudar essa imagem de alienação. As eleições municipais de outubro terão 6.592 candidatos estudantes, estagiários e bolsistas em um universo total de 402.152 registrados em todo o Brasil, de acordo com o último levantamento do TSE, atualizado na tarde de ontem. Há, com este perfil, 68 candidatos a prefeito, 116 a vice-prefeito e 6.408 a vereador. O número tende a aumentar nos próximos dias, já que a Justiça Eleitoral recebe, até domingo, registros deferidos pelos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs).

Nas plataformas defendidas pelos jovens políticos entrevistados pelo Correio, a melhora na qualidade da educação brasileira é a prioridade. Todos eles ingressaram na política por meio da militância estudantil. Candidata pela primeira vez ao mandato de vereadora em Porto Alegre pelo PCdoB, a estudante de economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Ticiana Alvares ocupou, de 2005 a 2007, o cargo de vice-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE). Em sua proposta de campanha, ela critica a expansão sem qualidade do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), do Ministério da Educação (MEC), bem como a falta de auxílio-moradia e de alimentação aos bolsistas do Programa Universidade para Todos (ProUni), além de reivindicar passe livre aos estudantes da rede pública. "As pautas municipais referentes à educação superior são mais restritas. Mas sabemos que a evasão nas universidades está muito ligada à falta de dinheiro para garantir moradia, transporte e alimentação. Acredito que, por ser estudante, percebo as demandas reais desse público", argumenta a jovem de 28 anos.

Em outra parte do país, a amazonense de 28 anos Márcia Rebeca, também candidata pela primeira vez — ela concorre a uma vaga de vereadora, pelo PSB —, conta que o plano de campanha do partido defende a valorização do professor por meio do cumprimento do piso salarial nacional da classe e a restruturação de carreira, bem como a construção de escolas e laboratórios de informática com banda larga em Manaus. "Eu sinto que as pessoas estão totalmente desacreditadas da política. No entanto, acho que, de modo geral, os jovens têm uma avaliação positiva. É uma esperança de mudança", avalia a estudante de ciências sociais na Universidade Federal do Amazonas (Ufam), também formada em química pela mesma instituição.

Candidato pelo PMDB a prefeito no município de Dona Francisca (RS), Beto Fantinel é jovem, mas tem bastante experiência na vida pública. Aos 19 anos, ele atuou como coordenador da área de saúde na prefeitura da cidade. Hoje, com 25, ele já tem um mandato como vereador no currículo, termina a graduação em ciências sociais e a licenciatura em sociologia, pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Caso eleito, Beto planeja instituir polos de educação superior e de cursos técnicos. "Existe um certo preconceito com o fato de eu ser jovem. No entanto, quebrei paradigmas, inclusive dentro do partido. Acredito que as pessoas da cidade estão querendo um novo rosto com novas propostas", opina.

Engajamento

Para o presidente da UNE, Daniel Iliescu, a atual geração de jovens não deixa nada a desejar em relação às antigas. Segundo o dirigente, a vontade da juventude de participar do processo político está em ascensão. "O alto número de candidatos é um sintoma disso. O jovem hoje sabe que precisa de opinião para mudar. Aquela juventude que só reclama percebeu que não adianta." A socióloga Anna Luiza Salles Souto, pesquisadora do Instituto Pólis, concorda. Segundo ela, o senso comum que identifica o jovem como alienado, consumista e individualista não corresponde à realidade. A especialista ainda rechaça a comparação com outras gerações. "Sempre olhar a história pelo retrovisor pode gerar distorções. Os jovens de hoje têm propostas para o Brasil e querem participar da construção do país que eles desejam", analisa. Anna Luiza ainda reforça que os jovens querem se fazer presente no debate. "São essas questões que devem resgatar o sentido verdadeiro da política. Mesmo que os políticos nem sempre correspondam às expectativas, não há como pensar em futuro do país negando a política", defende.

Tucanos, petistas e comunistas Políticos como o atual candidato do PSBD à prefeitura de São Paulo, José Serra, o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, e o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) são alguns exemplos de pessoas que ingressaram na vida pública pelo movimento estudantil. Na juventude, os três foram presidentes da União Nacional dos Estudantes (UNE). A deputada federal Manuela D"Ávila (PCdoB–RS), candidata à prefeitura de Porto Alegre, ingressou na política aos 16 anos, também via participação em entidades do gênero. Na faculdade, ela se filiou à União da Juventude Socialista (UJS).

Plataforma estudantil Veja o que pensam três universitários candidatos

"Sou contra usar a greve de forma eleitoreira e a universidade como palanque para a política. Defendo a educação de qualidade em tempo integral. A escola deve ser um mecanismo de transformação social" Rudolph Hasan, 25 anos, candidato a vereador na capital fluminense pelo PDT e estudante de ciências sociais na Universidade Estadual do Rio (Uerj)

"A educação superior é um dos meus temas principais. Questões relativas à infraestrutura e ao transporte também estarão na pauta do dia" Ítalo Beethoven, 29 anos, candidato a vereador em Quixadá (CE) pelo PT e estudante de letras na Universidade Federal do Ceará (UFC)

"Sou a favor do sistema temporário de cotas para alunos da rede pública. Sou contrário a um modelo fixo porque isso cria o relaxamento do governo, que não vê necessidade de melhorar o sistema" Bruno Cunha Lima, 22 anos, candidato a vereador em Campina Grande (PB) pelo PSDB e estudante de direito em uma instituição particular