O globo, n. 31142, 11/11/2018. País, p. 8

 

Eleição ainda não acabou nas enquetes feitas pelo Senado

Juliana Castro

11/11/2018

 

 

Número de votos sobre projetos de lei polêmicos e proposições populares explode após primeiro turno da eleição

As eleições deste ano terminaram com a vitória de Jair Bolsonaro (PSL), mas a polarização continua quente em outro tipo de disputa. Em grupos pró e contra o presidente eleito nas redes sociais, há uma espécie de guerra de enquetes, na qual simpatizantes e críticos de Bolsonaro se articulam para votações em massa no site do Senado, com o objetivo de fazer com que sua opinião sobre projetos de lei e proposições populares prevaleça. Os temas polêmicos estão entre os mais votados no site.

No caso das consultas públicas feitas pelo site do Senado, os acessos cresceram de forma exponencial em outubro e novembro. No mês passado, foram 2,6 milhões de votos, o maior número em um único mês desde que as enquetes foram criadas, em novembro de 2013. Apenas nos cinco primeiros dias de novembro, o número de votos chegou a 1,9 milhão, segundo maior volume já registrado pelo e Cidadania, sistema em que os projetos dos parlamentares e proposições populares ficam disponíveis para votação. Ou seja, foram quase 400 mil votos por dia.

Para se ter uma ideia, até a eleição, o mês em que mais votos foram computados — 1 milhão —foi julho de 2017. A assessoria de imprensa do Senado informou que o site tem apresentado, em alguns momentos, instabilidade devido ao grande número de acessos simultâneos. Em 2018, já foram mais de 99 milhões visitas.

No Senado, os assuntos que mais têm virado alvo da queda de braço são os temas mais polêmicos levantados por Bolsonaro ao longo da campanha. Entre eles, a revogação do Estatuto do Desarmamento, ideologia de gênero e o voto impresso.

Outro projeto que está em votação no site da Casa é do senador Magno Malta (PRES), aliado do presidente eleito, para sustar os efeitos de uma resolução de 2013 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que dispõe sobre a habilitação, celebração de casamento civil, ou de conversão de união estável em casamento, entre pessoas de mesmo sexo.

Algumas das propostas em votação, como a que criminaliza a apologia ao comunismo, vieram por meio de ideias apresentadas pela população. Ao receber 20 mil votos, tornam-se uma sugestão legislativa para ser debatida pelos senadores.

Todos os projetos de lei e demais proposições que tramitam no Senado ficam abertos para receber votos desde o início até o fim de sua tramitação. Cada usuário só pode votar apenas uma vez em cada enquete. O login é feito por meio de perfis de redes sociais ou com cadastro de e-mail em que o usuário precisa digitar um código, com a finalidade de evitar o uso de robôs.

Um termômetro

Embora as manifestações sobre a consulta pública sejam comunicadas periodicamente aos gabinetes parlamentares, os relatores e demais senadores não precisam seguir o resultado da votação. Ainda que não tenham um efeito prático, servem como instrumento de pressão popular. O coordenador do Programa e-Cidadania, Alisson Bruno, afirma que projetos já tiveram a tramitação agilizada em função do número de votos que estavam recebendo.

— Nas palavras de alguns senadores, a consulta serve como termômetro. Uma proposta de redução do número de parlamentares estava aguardando designação de um relator na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), quando teve um boom de votação em 2016. Um senador, então, pediu a relatoria para levar o projeto adiante —afirmou Queiroz.

Outro exemplo foi uma ideia legislativa, ou seja, uma proposição popular para acabar com auxílio-moradia de magistrados e parlamentares.

— Entre a ideia e apresentação de um relatório favorável na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), foram sete meses. Um cidadão apresentou ideia e em um dia conseguiu 20 mil apoios. Um senador decidiu apresentar o projeto, que já recebeu parecer favorável na CCJ —afirmou Queiroz.

No caso da Câmara, as enquetes estão em fase experimental porque a ferramenta ainda está passando por ajustes. O lançamento oficial está previsto para o próximo ano. Mesmo assim, no sistema atual a Casa recentemente verificou um aumento de acesso. O projeto de lei sobre a Escola sem Partido, por exemplo, tinha 170 votos no dia 1º de novembro. Hoje, já são mais de 900 mil. Tornou-se a proposição mais votada no site.

Na Câmara, também só é possível votar uma vez em cada projeto. Mas, diferentemente do que ocorre no Senado, na Casa, os projetos mais polêmicos não figuram entre as enquetes mais acessadas.