Correio braziliense, n. 20247, 27/10/2018. Política, p. 4

 

Frustração do PT no Ceará

Bernardo Bittar

27/10/2018

 

 

Uma das armas do PT para uma virada muito difícil nas urnas falhou. Integrantes do partido e correligionários apostavam que a chegada de Ciro Gomes (PDT) ao Brasil pudesse ser transformada em uma festa com o apoio aberto dele a Fernando Haddad na corrida à Presidência. A cúpula do partido esperava que o pedetista se encontrasse ontem mesmo com o petista em Fortaleza, o que não aconteceu. O ex-governador do Ceará alcançou 13 milhões de votos no primeiro turno.


Nos bastidores, conversas com Jaques Wagner, coordenador da campanha de Haddad, e Carlos Lupi, presidente nacional do PDT, foram realizadas para que Ciro formalize a aliança. Embora o ex-presidenciável tenha recuado inicialmente, dizendo que faria um vídeo contra Jair Bolsonaro (PSL) — sem declarar apoio a Haddad —, a ideia era que ele cedesse às indicações de Wagner e Lupi acenando de volta para o professor. Haddad afirmou à imprensa que faz tantas sinalizações a Ciro que a mulher dele “já está com ciúme”. Ontem, Lupi disse que Ciro Gomes faria mesmo o vídeo de apoio, mas evitou garantir que Haddad e Ciro se encontrarão ou que haverá tempo para que eles façam um ato público juntos. Petistas também esperam voto favorável do ex-presidente Fernando Herinque Cardoso (PSDB)

“Ele (Ciro) já declarou (voto no Haddad), vai reforçar isso. Eu estou indo para o Ceará a fim de conversar com o Ciro e saber como vamos fazer, mas que a gente vai fazer, vai. Não sei se dá tempo para isso (fazer ato público ou subir no palanque), mas para a rede social nós vamos gravar um vídeo sobre isso”, detalhou o presidente do PDT. Aliados de Ciro disseram ao Correio que ele havia concordado em atacar Bolsonaro. A esperança de que o ex-governador do Ceará falasse ontem no aeroporto de Fortaleza (CE), porém, não se concretizou.

Ciro estava na Europa desde a derrota no primeiro turno. Em Portugal, havia deixado claro não ter a intenção de se manifestar efusivamente — em vídeos e palanques, por exemplo — o apoio a Haddad. A história ganhou novos contornos com a interferência do partido, pressionado pelo PT a mudar de posição. O ex-prefeito de São Paulo disse ontem que pesquisas internas mostram uma desvantagem de cinco pontos — na quinta-feira, o Datafolha apontou Bolsonaro com 56% e Haddad com 44% — de sua candidatura para a do adversário. Ele afirmou esperar uma “fala dura” do pedetista a favor da campanha. “Eu, sim, espero que ele, ao desembarcar, faça uma fala dura contra o fascismo, contra o discurso do ódio. Tenho certeza que ele vai fazer uma fala dura e nós vamos vencer juntos”, afirmou Haddad.

Pressão

Petistas estão no encalço dos caciques pedetistas desde o começo da semana. Assessores disseram que a resistência de Ciro Gomes a Jair Bolsonaro seria um facilitador na hora de convencer o ex-candidato ao Planalto a se posicionar. Após 10 dias de conversas, na última quarta, dirigentes do PDT pediram a ele uma ação mais incisiva antes da votação do segundo turno, amanhã. “Mas ele não quer falar. Disse que, talvez, agiria no caminho contrário de Bolsonaro. Mas não quis pegar na mão do PT. O partido atrapalhou muito na hora de negociar o apoio do primeiro turno, empurrando o Centrão — bloco formado pelo PP, DEM, PR, PRB e Solidariedade — a Geraldo Alckmin (PSDB)”, explicou um dos conselheiros do ex-governador.

Enquanto Bolsonaro usou sua conta no Twitter para tentar frear especulações em torno de possíveis nomes para um eventual governo, Fernando Haddad insistiu em uma manifestação mais contundente de apoio de, ainda que em cima da hora, de Ciro Gomes — terceiro colocado na disputa presidencial.


FHC não apoia o PT
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso voltou a usar as redes sociais para negar que tenha declarado apoio a um dos presidenciáveis. “Há um lado horroroso do mundo novo, o da conexão: notícias fakes, com minha foto e tudo, afirmam que declarei apoio a um dos candidatos presidenciais. Mentira. O que penso declaro no Twitter e na mídia. Por ora, disse que no (Jair) Bolsonaro não voto e dei as razões. Nada além disso”, escreveu.


"Não sei se dá tempo para isso (fazer ato público ou subir no palanque), mas para a rede social nós vamos gravar um vídeo sobre isso”
Carlos Lupi, presidente do PDT