Título: Mentores da farsa das adoções presos em Londres
Autor: Mader, Helena
Fonte: Correio Braziliense, 17/07/2012, Brasil, p. 9

Além da decretação da prisão de três envolvidos com a fraude das adoções no Brasil, duas pessoas também foram detidas e condenadas no Reino Unido por oferecerem esses serviços ilegais de imigração. Os brasileiros Cláudio Domiciano e José Emanuel Branco, que segundo depoimentos de várias vítimas do esquema eram responsáveis por intermediar as adoções fraudulentas, começaram a ser investigados pelas autoridades britânicas em março de 2011 e, neste ano, foram condenados pela Justiça britânica. Eles são sócios da empresa Fênix Corporation, que prestava serviço de consultoria a imigrantes ilegais. No Brasil, o advogado Igor Santos Ferreira da Silva e o ex-servidor do Tribunal de Justiça de Goiás Felipe de Freitas Monteiro continuam foragidos. A greve da Polícia Civil no estado, que já dura uma semana, dificulta a localização dos dois acusados.

As investigações sobre as irregularidades da Fênix Corporation começaram no Reino Unido antes mesmo da aparição das primeiras denúncias sobre a fraude das adoções de adultos no Brasil. As atividades da empresa chamaram a atenção das autoridades porque ela não era registrada no Departamento de Supervisão dos Serviços de Imigração. A Fênix funcionava em um luxuoso prédio de escritórios no bairro de Scrubs Lane, a apenas 10 quilômetros do Palácio de Buckingham. Pelo menos 100 brasileiros, a maioria sem visto de permanência no Reino Unido, teriam sido enganados pela empresa.

Segundo o Departamento de Supervisão dos Serviços de Imigração do Reino Unido, Cláudio Domiciano foi condenado a um ano de cadeia em 27 de abril deste ano, pela oferta ilegal de consultoria relacionada a assuntos de imigração. "Ele usava aqui o velho jeitinho brasileiro e sempre arrumava uma forma de regularizar quem estava sem documentação em Londres. E cobrava caro por isso", conta uma brasileira que vive ilegalmente no Reino Unido e aceitou conversar com a reportagem sob a condição de manter o anonimato. "Há cerca de um ano, Cláudio e seus sócios apareceram na igreja que eu frequento para mostrar como conseguir a cidadania europeia por meio da adoção. Como lá é cheio de pessoas humildes e ilegais, ele conseguiu muitos clientes", revela a brasileira.

Segundo relatos de vítimas do esquema, a Fênix cobrava 3,7 mil libras (cerca de R$ 11 mil) para tocar os processos de "compra" de pais europeus. Os sócios da empresa tinham contato com advogados de Goiás, que ficavam responsáveis por agilizar o processo na Justiça brasileira, especialmente em comarcas de pequenas cidades goianas. Representantes da Fênix também se ofereciam para intermediar o pagamento a europeus, para que aceitassem adotar cidadãos brasileiros interessados em regularizar a situação no exterior. O Correio teve acesso a um e-mail em que Mateus Cocco, funcionário da empresa, se coloca à disposição para buscar europeus para participar da farsa, em troca de dinheiro.

Sentença

O Departamento de Supervisão dos Serviços de Imigração do Reino Unido informou que Cláudio Domiciano foi condenado a um ano de cadeia pela Corte de Magistrados de Westminster, em Londres. A assessoria de imprensa do departamento não explicou, entretanto, se há em curso um processo para extradição do brasileiro ou se ele cumprirá a pena integralmente em território britânico. As autoridades inglesas nem sequer informaram se ele continua atrás das grades ou se já foi beneficiado pela soltura. Além de Cláudio Domiciani, José Branco também foi condenado em sete acusações de oferecer serviços ilegais de imigração.

Em nota divulgada pelo site do Departamento de Supervisão dos Serviços de Imigração, a comissária Suzanne McCarthy, explicou que os dois sócios da Fênix foram julgados por ludibriar pessoas interessadas em regularizar a situação no país. "A lei existe para proteger pessoas de inescrupulosos consultores de imigração. Eu vou processar aqueles que descumprem a legislação e que tiram proveito de seus clientes", explicou a comissária. A reportagem não conseguiu localizar advogados ou representantes legais dos acusados no Reino Unido. A Interpol entrou no caso há duas semanas, depois que o Correio denunciou o esquema. A Polícia Federal vai apurar a atuação de cidadãos brasileiros e as conexões internacionais do crime. Uma das hipóteses levantadas, até agora, é de que a fraude seja uma forma de tráfico de pessoas para o exterior.

Investigados Acusados pela polícia de participação no esquema até agora:

Paulo Alves Ferreira da Silva: advogado com atuação em Ceres (GO). Foi preso no último dia 9 sob a acusação de intermediar contatos entre estrangeiros e brasileiros interessados na fraude.

Igor Santos Ferreira da Silva: teve a prisão preventiva decretada, mas está foragido. Ele é filho de Paulo Alves e, segundo brasileiros que vivem em Londres, atuava nos casos de adoções entre adultos.

Felipe de Freitas Monteiro: o ex-servidor da comarca de Itapaci (GO) também teve a prisão preventiva decretada, mas está foragido. Segundo as investigações, ele teria forjado a assinatura de um juiz para liberação judicial das adoções.

Cláudio Domiciano: proprietário da Fênix Corporation foi condenado pela Justiça britânica pela atuação como consultor de imigrantes ilegais. Segundo brasileiros que vivem em Londres, ele oferecia os serviços de adoção fraudulenta em igrejas evangélicas.

José Emanuel Branco: sócio da Fênix Corporation, também foi condenado em Londres pela oferta de consultorias irregulares a estrangeiros.

Mateus Cocco: antigo funcionário da Fênix Corporation, ele intermediava o contato entre brasileiros e estrangeiros. Cobrava 2,9 mil euros pelos serviços de elaboração dos processos.

Inscrição obrigatória

Desde 30 de abril de 2001, a legislação britânica obriga as empresas que oferecem serviços de consultoria de imigração a serem cadastradas pelo Departamento de Supervisão dos Serviços de Imigração do Reino Unido. O departamento é um órgão público independente, criado pela Lei de Imigração e Asilo, de 1999.