O globo, n. 31192, 31/12/2018. País, p. 4

 

Desafio imediato

Bruno Góes

Geralda Doca

Jailton de Carvalho

Natália Portinari

31/12/2018

 

 

 Recorte capturado

 

 

Áreas estratégicas devem ter mudanças profundas

Foi o próprio presidente eleito Jair Bolsonaro quem marcou a data: a gestão que toma posse amanhã precisa entregar nos primeiros 100 dias ações efetivas nas mais variadas áreas. Em 11 de abril, já foi até agendada uma solenidade no Palácio do Planalto para celebrar a fase inicial do novo governo. Deflagrar a reforma da Previdência é a prioridade máxima.

Pela frente, Bolsonaro tem ainda outros desafios, como uma solução definitiva para a variação do preço do diesel, assunto prioritário para os caminhoneiros; a adoção de medidas de impacto para combater a criminalidade; e a guinada prometida na política externa. Bolsonaro ainda enfrentará o teste da política partidária: serão eleitos os presidentes da Câmara e do Senado. Oficialmente, o futuro ocupante do Palácio do Planalto prometeu não interferir na disputa, mas sabe que os nomes escolhidos poderão ajudar ou atrapalhar a tramitação dos projetos de seu interesse.

A reforma da Previdência é considerada a medida mais importante dos primeiros 100 dias. Por se tratar de um tema polêmico e que mexe com a vida de muita gente, sua aprovação é difícil no Congresso. Integrantes da equipe econômica se articulam em várias frentes para derrubar resistências às mudanças. Estão nos planos aprovar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para retirar da Carta dispositivos que o governo pretende alterar. Assim, todas as mudanças poderão ser implementadas via projetos de lei, que não exigem quórum qualificado (308 votos em dois turnos na Câmara dos Deputados e no Senado).

Em outra frente, o novo governo pretende ganhar o respaldo de especialistas em Previdência antes de enviar propostas ao Congresso. Criou um conselho consultivo de notáveis que tomarão conhecimento de antemão de todos os pontos em debate. Integrantes do grupo, como o ex-presidente do Banco Central (BC) Armínio Fraga e o economista Paulo Tafner, encaminharam sugestões à equipe do presidente eleito.

Também faz parte da estratégia do governo negociar previamente com líderes da categoria de servidores com influência no Parlamento, como procuradores, auditores fiscais, policiais federais. Assim, todos se sentirão co-autores da reforma, explicou uma fonte ligada à equipe de transição.

Prioridades de Moro

De uma das principais estrelas de seu governo, o futuro ministro da Justiça Sergio Moro, Bolsonaro receberá o texto do decreto para ampliar o prazo de posse de arma. Mas o juiz da Lava-Jato tem outras prioridades. Uma de suas metas no início de governo será reestruturar as equipes da Polícia Federal que estão à frente das investigações da Lava-Jato em São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba e Brasília. O ministro entende que a Lava-Jato avançou muito, mas pode ser ainda mais efetiva com aumento de policiais e da estrutura de investigações que, nos últimos meses, pareciam em declínio. Ele promete não dar trégua a políticos, empresários, lobistas e servidores públicos já fisgados em etapas anteriores da Lava-Jato.

Moro espera aprovar no Congresso, ainda em fevereiro, alguns projetos de lei que considera importantes para o combate à criminalidade. Entre as propostas estão uma nova lei que define com clareza o cumprimento de pena a partir de condenação em segunda instância; a prisão imediata para quem for condenado em tribunal de júri; a ampliação de prazos de prescrição de crimes e a regulamentação do lobby. O pacote também prevê restrições na progressão da pena de quem comete homicídios.

Na saúde, em meio à recorrente falta de recursos e os problemas de gestão, o futuro ministro Luiz Henrique Mandetta prometeu começar pelos hospitais federais. Propôs mudanças na administração dos seis hospitais federais mantidos na cidade do Rio de Janeiro, que, segundo ele, precisam de um choque de gestão.

Revisão do Mais Médicos

Mandetta também prometeu intensificar o combate ao surto de doenças como sarampo após a migração em massa de venezuelanos ao Brasil e melhorias na atenção básica e nas equipes de saúde da família. O ministro também afirmou que vai rever o Mais Médicos para acabar com distorções e as “improvisações” do programa federal.

O teste do Congresso virá em fevereiro, quando serão eleitos os presidentes das duas Casas. Na Câmara, onde seu partido, o PSL, já deu mostras públicas de desentendimento e falta de coesão, por enquanto, dois grupos medem forças para conquistar o comando. De um lado, cinco parlamentares com candidaturas avulsas firmaramumpactodeapoiomútuo em caso de segundo turno. De outro, Rodrigo Maia (DEMRJ) costura uma ampla aliança, inclusive com participação de partidos de oposição. Para que a eleição não resulte em uma derrota política, o PSL não terá candidato próprio. Por tratar-se de uma questão delicada, um jogo de poder importante para a governabilidade, a legenda ainda não conseguiu traçar uma estratégia para a disputa.

A política externa é outra área em que Bolsonaro promete mudar os rumos. A transferência da embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém foi anunciada e provocou polêmica. A relação com o Mercosul não está clara. O futuro presidente deu sinais de que tem outras prioridades nas relações internacionais, comojádefinidoalinhamento com os Estados Unidos.