Correio braziliense, n. 20234, 14/10/2019. Brasil, p. 9

 

Desemprego como fiel da balança

Alessandro Azevedo e Andressa Paulino

14/10/2019

 

 

ELEIÇÕES 2018 » Com 27,6 milhões de pessoas sem ocupação no país, candidatos precisam dar atenção especial aos que sofrem com a falta de oportunidade. Mulheres, negros e os jovens são os mais atingidos pelo problema

No Brasil, falta emprego para 27,6 milhões de pessoas. Muitas delas vão às urnas no dia 28 para decidir o futuro representante do país. E um dos assuntos mais discutido durante as campanhas de debates foi o desemprego. Mulheres, negros e jovens são os que mais sofrem com a falta de oportunidade. Um público delicado, que precisa escolher em poucos dias quem é o mais indicado para colocar o país de volta no mercado de trabalho.

“A piora no mercado de trabalho nos últimos anos pegou todo mundo, mas atingiu mais fortemente alguns setores específicos”, explica a técnica de planejamento e pesquisa da Diretoria de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Maria Andréia Lameiras. Um dos pontos mais graves dessa situação é que ela não é explicada por eventuais diferenças no nível de educação entre esses grupos. “Negros e mulheres enfrentam essa desigualdade há muitos anos. E não é por questão de escolaridade, já que mulheres, em geral, têm escolaridade maior que homens. Há um componente discriminatório claro, um tratamento diferencial”, observa Fernando de Holanda Barbosa Filho, pesquisador sênior da área de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV).

A taxa de desocupação no Brasil, no 2º trimestre de 2018, foi de 12,4%, mas com diferenças significativas entre homens (11%) e mulheres (14,2%), aponta o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). As mulheres também se mantiveram como a maior parte da população fora da força de trabalho no país (64,9%). Embora sejam maioria entre as pessoas em idade de trabalhar — 52,4% do total, segundo os dados mais recentes do IBGE —, as mulheres também são o grupo que menos consegue empregos. Em todas as regiões do país, os homens predominam entre as pessoas ocupadas, com 56,3% do mercado: 63,6% dos homens brasileiros estão ocupados, enquanto, entre as mulheres, a fatia é de 44,8%.

Katt Lorrayne, 25 anos, está há três anos desempregada. Fazendo bicos de cabeleireira e manicure, ela conta que teve de parar a graduação por não ter mais dinheiro para manter a faculdade. “Eu trabalhava de recepcionista em uma empresa, mas, com a crise, mandaram várias pessoas embora e uma delas foi eu. Agora minha vida é entregar currículos e economizar para não faltar nada em casa. Até a faculdade eu tive de deixar para depois”, lamenta.

Morando com os dois filhos e o marido, ela conta que o sustento da casa é por meio da renda do marido, que ficou desempregado na mesma época, mas já está trabalhando. “Nós ficamos desempregados no mesmo ano e entregávamos até currículos juntos. Ele já foi chamado para trabalhar, mas eu ainda não”, afirma Katt. Mesmo com nível de escolaridade menor do que o dela, apenas com ensino fundamental, foi mais fácil para o marido conseguir recolocação no mercado de trabalho. Para Katt, homens conseguem ser empregados de forma mais fácil. “Parece que as empresas preferem sempre eles”, acrescenta.

Há também estudos que mostram que mulheres preferem trabalhar em tempo parcial quando tem essa opção. E até mesmo quem consegue uma oportunidade sofre com o trabalho excessivo e remuneração inadequada. Foi o que aconteceu com Aniela Lira da Silva, 20 anos. Ela conta que trabalhou um mês em um supermercado no qual era atendente de caixa, mas saiu porque a carga horária era de 10 horas por dia. “Eu tenho dois filhos para criar sozinha, não tinha como eu passar 10 horas trabalhando”, explica. Ela conta que, apesar de receber o equivalente a um salário comercial, não tinha os direitos resguardados pelo Instituto Nacional de Seguro Social (INSS).

Com o marido preso, Aniela diz que nem o auxílio-reclusão recebe. Dessa forma, vive do dinheiro do Programa Bolsa Família e da ajuda de familiares, que somando, ainda não chega a ser um salário mínimo. “É bem pouquinho. Mas é o que a gente tem para viver”, conta.

 

Sem escolaridade

Entre os mais afetados pelo desemprego também estão os que têm menor escolaridade. “Principalmente os trabalhadores só com ensino fundamental incompleto são os que mais sofrem”, afirma Maria Andréia, do Ipea. Um dos motivos é que, à medida que a sociedade brasileira tem se qualificado mais, os menos preparados perdem espaço. “Cada vez tem mais pessoas escolarizadas no mercado de trabalho”, lembra.

Outra razão é conjuntural. Em momentos de crise, quem é pouco qualificado fica mais tempo desempregado. Tanto é que uma em cada seis pessoas desalentadas (que desistiram de procurar emprego) atualmente têm ensino fundamental incompleto, segundo a pesquisadora do Ipea. “Quando você está com uma economia com muita mão de obra disponível, você pode escolher quem contratar. Pelo mesmo valor, ninguém vai optar pela pessoa com escolaridade mais baixa”, explica.

* Estagiária sob supervisão de Roberto Fonseca

 

12,4%

Taxa de desocupação registrada pelo IBGE no Brasil no segundo trimestre de 2018