Correio braziliense, n. 20231, 11/10/2018. Política, p. 2

 

Sem mandato, Perillo é preso

Murilo Fagundes 

11/10/2018

 

 

Derrotado na disputa pelo Senado Federal por Goiás, o ex-governador do estado Marconi Perillo, do PSDB, foi preso na tarde de ontem sob suspeita de recebimento  de propina nas campanhas eleitorais de 2010 e 2014. O tucano foi detido enquanto prestava depoimento na sede da Polícia Federal (PF) em Goiânia sobre as acusações apresentadas pelos delatores da Odebrecht Fernando Reis e Alexandre Barradas. Os dois acusaram Perillo, que agora não conta com prerrogativa de foro especial, de receber repasses milionários indevidos da Odebrecht nos pleitos em que foi eleito e reeleito governador do estado. Ele é investigado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O mandado é de prisão preventiva, que não tem prazo.

Desde o fim de setembro, Marconi Perillo enfrenta barreiras na vida política. A operação Cash Delivery (entrega em dinheiro, em português) executou 14 mandados de busca e apreensão em endereços ligados a ele e cinco mandados de prisão temporária, um deles contra Jayme Rincón, coordenador de campanha do governador José Eliton (PSDB). Perillo trabalhou para que o governador, eleito como seu vice, fosse confirmado no cargo pelas urnas, mas ele acabou ficando em terceiro lugar. Fernando Reis e Alexandre Barradas, delatores da Odebrecht, citaram repasses ilegais de cerca de R$ 10 milhões às campanhas de Perillo — R$ 2 milhões em 2010 e R$ 8 milhões em 2014.

Os mandados miraram o ex-governador que, depois de três décadas em cargos públicos, acabou derrotado no pleito deste ano, ficando em quinto lugar nos votos do eleitorado goiano para o Senado Federal. Perillo seguia na liderança das pesquisas, mas a deflagração da operação Cash Delivery, da Polícia Federal, que veio à tona no dia 28 de setembro, o deixou mais distante da vitória. Foram eleitos Vanderlan Cardoso, do PP, com 31,35%, e Jorge Kajuru, do PRP, com 28,23%. O tucano obteve apenas 7,55% dos votos válidos, atrás de estreantes como Kajuru. Nesse cenário, o ex-governador de Goiás, que atua na política desde 1991, ficou pela primeira vez sem mandato.

 

Primeira instância

A advogada criminalista Lissa Moreira explica que, com a perda do foro privilegiado, Marconi ficou submetido ao julgamento de um juiz de primeira instância. “Quando o político não tem mais prerrogativa de foro, todos os atos são apreciados por um juiz de primeira instância. Por não haver denúncia, e o Ministério Público não formar convicção sobre os fatos, o governador não teve direito ainda ao contraditório”, analisa. O caso estava antes no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Passou à primeira instância em abril, quando Perillo deixou de ser governador.

Até o fechamento desta edição, Perillo continuava preso, mas a defesa, representada pelo advogado Antônio Carlos Almeida, o Kakay, já havia impetrado pedido de habeas corpus no Tribunal Regional Federal 1 (TRF-1). Desde o momento da prisão, a equipe de Kakay se posicionou contra o decreto de prisão e a tratou com “completa indignação”. Ainda segundo a equipe do advogado, “uma prisão por fatos supostamente ocorridos em 2010 e 2014, na palavra isolada dos delatores, afronta pacífica jurisprudência do Supremo, que não admite prisão por fatos que não tenham contemporaneidade”.

A prisão preventiva, ou seja, por tempo indeterminado, é decretada, entre outras motivações, com a finalidade de assegurar a aplicação da pena. Mas, segundo Lissa Moreira, baseando-se no que acompanhou sobre o caso, os objetivos pareceram não se efetivar integralmente. “A prisão, também chamada cautelar, busca dar segurança para um processo investigativo e pode ser decretada para assegurar a aplicação da lei. Nesse caso do ex-governador, parece-me que nenhum dos pré-requisitos estavam presentes. Não havia fato novo”, sustentou a advogada, baseada no artigo 312 do Código de Processo Penal.

Com a prisão de Marconi Perillo, o PSDB enfrenta mais uma derrota. A legenda, que pela primeira vez desde 1994 ficou fora do segundo turno presidencial, passa por um racha interno entre novos e antigos nomes, caso de Geraldo Alckmin e João Doria, que concorre com Márcio França (PSB) ao governo de São Paulo. Na Câmara dos Deputados, o partido do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso também sofreu derrota expressiva. Passou de terceira maior bancada eleita, em 2014, para nona, a partir de 2019.

Para o cientista político Max Stabile, doutor pela Universidade de Brasília (UnB), a prisão de Marconi Perillo revela, além do mau momento pelo qual os “partidos que estiveram na cadeira por muito tempo passam”, uma marca negativa para a legenda tucana. “Sem sombra de dúvidas, os governadores do PSDB, além de Perillo, Beto Richa e Reinaldo Azambuja, foram indiciados bem próximo ao pleito. Isso com certeza influenciou na campanha”, argumenta.