O globo, n. 31181, 20/12/2018. Artigos, p. 2
Equívoco na segurança
José Vicente da Silva Filho
20/12/2018
O principal fator de contenção da violência é a eficácia da resposta que se dá aos violentos. O primeiro instrumento dessa resposta é o aparato policial, universalmente estruturado com um segmento que vigia as ruas de forma ostensiva e outro que faz o complemento investigativo.
Fazer a gestão eficiente desse conjunto de estruturas policiais é o desafio a ser vencido por uma política de segurança que pretenda reduzir crimes, desordens e o medo da população. No mundo todo, uma só organização faz esses serviços policiais intimamente associados, mas, no Brasil, por meros incidentes históricos, foram constituídas duas polícias estaduais ao longo do século XX —as Polícias Militares e as Civis —, que têm normas diferentes, treinamentos díspares, estrutura organizacional e hierárquica próprias e até salários diferenciados.
Essa bipartição indutora de rivalidades só é razoavelmente administrada através de secretarias da Segurança com instrumentos de governança para coordenar as duas meias laranjas da polícia em direção às metas de desempenho.
Mas, ruim com um secretário no comando das polícias, muito pior sem isso. O arranjo pretendido pelo futuro governador do Rio, Wilson Witzel, de extinguir a Secretaria da Segurança Pública vai distanciar ainda mais as polícias e comprometer a coordenação das ações de patrulhamento e investigação, exacerbando a já problemática rivalidade. O fracasso da experiência de polícias distanciadas sem Secretaria de Segurança, entre 1983 e 1995, foi decisivo para restabelecer a função de coordenação e comando unificado do cargo de secretário.
Secretarias de Segurança têm promovido avanços impossíveis sem essa instância de autoridade reguladora, como a imposição de áreas comuns de responsabilidade (as AISPs) ou a adoção imposta pelo secretário em São Paulo de um sistema compartilhado de dados. Mas a coordenação central das estruturas policiais tem outras funcionalidades de alta prioridade que vão empobrecer significativamente porque só funcionam de forma cooperativa: o sistema integrado de inteligência, o planejamento e gestão de finanças e recursos humanos, as estratégias de respostas combinadas para arrefecer os crimes nas ruas e as manifestações do crime organizado.
Resultados não virão com tecnologias israelenses, inúteis para compensar a falta de milhares de policiais afastados das ruas e a má distribuição dos agentes civis e militares nas essenciais unidades distritais, onde o controle do crime efetivamente acontece. As mais avançadas tecnologias de interesse policial estão em São Paulo —onde os homicídios caem há 16 anos — e milhares de câmeras a custo zero, utilizandose os dispositivos de bancos, comércio e residências, são aproveitadas pela segurança da prefeitura paulistana.
É ilusória a ideia de que o governador consiga cuidar bem da segurança em meio às demandas de múltiplas áreas que requerem sua atenção. Ora, a função do secretário da Segurança é justamente identificar os problemas e efetuar correções de acordo com a orientação política do governador.
Ou seja, precarizando a coordenação das ações policiais, a já difícil situação da segurança pública no estado tenderá a se agravar. A nomeação de Roberto Motta para assumir a pasta temporária da Segurança e cuidar da transição, mas sem autoridade sobre as polícias, vai gerar mais confusão. O estado não pode se dar ao luxo de desperdiçar seis meses de tumultuada transição.
Mas o principal problema está mais que evidente: os enunciados no plano de governo “Mais ordem, Mais progresso” mostram que Witzel ainda não tem um plano viável para a promover a segurança do Rio de Janeiro.