Correio braziliense, n. 20229, 09/10/2018. Política, p. 2

 

De volta às armas para o segundo turno

Leonardo Cavalcanti, Rodolfo Costa e Paulo Silva Pinto 

09/10/2018

 

 

Depois da noite maldormida, os presidenciáveis Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) começaram a colocar em prática os planos para o segundo turno. Enquanto o capitão reformado, de casa, no Rio de Janeiro, concedeu entrevista a uma rádio, o ex-prefeito de São Paulo pousou em Curitiba para visitar o petista Luiz Inácio Lula da Silva, preso na carceragem da Polícia Federal — depois deu coletiva em hotel na capital paranaense. Dos dois lados, há ainda arranjos a serem feitos até a sexta-feira, início oficial da campanha no rádio e na televisão. À noite, em entrevista ao Jornal Nacional, ambos prometeram respeitar a Constituição, contrariando declarações feitas por aliados.

Antes, na quinta-feira, está programado o primeiro debate. Com ele, a primeira dúvida da campanha de Bolsonaro. Ausente dos últimos encontros do primeiro turno por recomendação médica, o confronto de ideias com Haddad não é, pelo menos segundo a campanha, algo que o presidenciável pretende se abster. “Debater com o PT não tem dificuldade. O que o PT fez ao longo de 13 anos, acredito que está vivo na memória de todo mundo. Não queremos isso de volta. Eu represento, com quem está do meu lado, uma oposição”, afirmou ontem, em entrevista à Rádio Jovem Pan.

As participações de Bolsonaro dependem de avaliação médica. Entre hoje e amanhã, o presidenciável será submetido a análises da equipe que o acompanha desde a realização da segunda cirurgia. No domingo, quando foi votar, ele se queixou de um desconforto com a bolsa de colostomia na saída da seção eleitoral. O primeiro debate está marcado para a próxima quinta-feira, na TV Bandeirantes.

No caso de Haddad, a maior dificuldade é encontrar um discurso para buscar a diferença de votos substancial verificada no primeiro turno. A ideia da campanha é evitar novas visitas ao ex-presidente Lula, na tentativa de se deslocar da imagem do petista. “Toda a transferência de votos possível já foi conquistada. Haddad precisa assumir a própria campanha agora”, disse um senador petista. Uma das medidas tomadas foi transferir a entrevista da porta da carceragem para um hotel, alterando o cenário da Superintendência da Polícia Federal ao fundo.

Em 18 minutos de coletiva de imprensa, citou o nome de Lula só uma vez. O petista ditou a tônica do que deve ser uma das estratégias: o embate com Bolsonaro. Declarou que as medidas reformistas propostas pelo adversário vão agravar a crise. “Já não deu certo na Argentina e não vai fortalecer o poder de compra do trabalhador”, declarou. Criticou também a flexibilização do porte de armas, uma das bandeiras do rival.

 

Antipetista

A campanha de Bolsonaro pretende reforçar o capitão como antipetista no programa eleitoral, agora com o mesmo tempo do rival. Em parte, a estratégia será focada em desconstruir a imagem que os adversários atribuem a ele, de fascista, racista e misógino. O objetivo, segundo Bolsonaro, é tornar o clima mais calmo na campanha. “O discurso é de união. Queremos unir o Brasil e pacificar”, destacou.

As munições do candidato, no entanto, não devem ser somente flores e diálogo. Bolsonaro declarou que não vai se transformar em “Jairzinho paz e amor” para tentar abocanhar mais votos. Para o cientista político Antônio Flávio Testa, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que colaborou no programa de Bolsonaro, é uma clara sinalização de que parte da tática de campanha será voltada para atacar o PT. “Assessores deverão sugerir concentrar os ataques nos escândalos de corrupção em que o partido está envolvido e reforçar a crise econômica e aumento do desemprego no governo (da ex-presidente) Dilma”, ponderou.

O tempo na televisão será importante, mas não fundamental. Para Testa, as redes sociais seguirão como a mais importante ferramenta de Bolsonaro. Será na internet que a campanha buscará os votos de eleitores que escolheram adversários no primeiro turno, como Geraldo Alckmin (PSDB), João Amoêdo (Novo), Cabo Daciolo (Patriota), Henrique Meirelles (MDB) e Alvaro Dias (Podemos). “Ele deve emplacar nas mídias sociais vídeos reforçando a visão de conservador nos costumes e liberal na economia”, avaliou.

Para o cientista político Carlos Melo, professor do Insper, o petista pode crescer se fizer uma mudança radical, a começar por se apropriar dos rumos e das decisões. “O potencial de transferência Lula já acabou. Agora, é com o próprio Haddad”, disse Melo. A visita ao ex-presidente em Curitiba ontem era necessária, na visão do professor, “do contrário diriam que ele é igual ao Doria”, em referência ao candidato ao governador de São Paulo, que se afastou do mentor político, Geraldo Alckmin. Agora, porém, ele deverá evitar visitas.