Correio braziliense, n. 20252, 01/11/2018. Política, p. 4

 

Supremo libera Universidades

Lucas Valença

01/11/2018

 

 

JUSTIÇA » Alvos de ação contra supostas irregularidades eleitorais, instituições de ensino foram vítimas de censura ao serem impedidas de criticar candidatos. Para ministro Celso de Mello, a liberdade fundamental de expressão não pode ser desrespeitada

Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal manteve, ontem, a decisão liminar da ministra Cármen Lúcia — relatora do processo — de suspender as ações policiais e as decisões de juízes eleitorais contra as universidades federais no dia anterior ao segundo turno da eleição. Com o discurso de preservação da autonomia universitária, o tribunal acatou as reivindicações das entidades, que enxergaram a decisão da Justiça Eleitoral como censura. Em uma longa sentença proferida, o ministro Celso de Mello fez duras críticas às agressões e enfatizou repúdio a medidas autoritárias.

Para a advogada Monya Ribeiro Tavares, que represeo Sindicato Nacional dos Docentes, os atos promovidos pela Justiça Eleitoral e executados pelas polícias Federal e Militar contrariaram princípios basilares da eleição, como a liberdade de professores e alunos se manifestarem livremente sem a possibilidade de censura. “A universidade é um ambiente democrático que só pode florescer em um ambiente de liberdade de informar, aprender e divulgar ideias”, afirmou.

O advogado Antonio Gonçalves, do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior, contou que a percepção dos professores é de que as universidades estão sendo vistas, por parte da população, como um “grande perigo” e a decisão do Supremo servirá para evitar “mordaças”. “Não se pode cercear as liberdades inerentes ao conhecimento. Essa decisão é uma demarcação muito importante para inibir qualquer ímpeto autoritário contra as instituições de ensino”, disse.

Segundo a ministra Cármen Lúcia, as decisões tentaram “trancafiar a universidade, calar os professores e intimidar os alunos”. Ela esclarece que, quando há a pretensão de invadir uma instituição de ensino superior, ainda que seja pela utilização do direito, um “sinal de alerta” se acende. “Não há lei válida que autorize os garrotes das liberdades”, ressaltou a relatora do processo.

 

Contra ditaduras

Mesmo afirmando que não vê “rompimento” ou risco à democracia brasileira, o ministro Celso de Mello proferiu um duro discurso contra a ditadura militar iniciada em 1964, além de fazer fortes críticas a regimes autoritários atemporais e espalhados pelo mundo. “Fiz um resgate histórico sobre os regimes ditatoriais que não podem prevalecer jamais. Na democracia, a maioria se legitima pelo voto popular, mas não tem o direito de oprimir a minoria”, declarou o decano.

O magistrado entende que as instituições estatais não podem, a pretexto de implementar as leis eleitorais, desrespeitar a liberdade fundamental de expressão regida pela “Constituição Cidadã”. “O que debater, onde debater e quando debater não estão sujeitos a decisões estatais prévias. Esse tipo de conduta não pode ter beneplácito no Estado Democrático de Direito”, afirmou. As operações policiais aconteceram em 17 estados da Federação e visaram confiscar panfletos, cartazes e retiraram bandeiras das instituições. No entanto, algumas autuações policiais foram tomadas sem decisão judicial, como lembrou a ministra Cármen Lúcia, que também condenou os atos.