Correio braziliense, n. 20273, 22/11/2018. Mundo, p. 15

 

Embaixada para o Brexit

22/11/2018

 

 

UNIÃO EUROPEIA » Primeira-ministra britânica vai à sede do bloco negociar os últimos detalhes para a aprovação do acordo sobre a saída do país. Fórmula é contestada por outros governos e por correligionários da governante

Empenhada na batalha para assegurar a aprovação do acordo preliminar sobre o Brexit  — o processo pelo qual o Reino Unido se tornará o primeiro país a deixar a União Europeia (UE) —, a primeira-ministra  Theresa May desembarcou ontem em Bruxelas para uma série de reuniões com altos funcionários do bloco. Antes de embarcar, ela alertou o parlamento, em Londres, de que um voto contrário ao acerto alcançado com os negociadores europeus poderia ter dois desfechos: ou a separação seria concluída “com mais incerteza e mais divisão”, ou o país acabaria constrangido a permanecer na UE, a despeito do voto majoritário pelo rompimento no referendo de 2016.

A mensagem da premiê pareceu endereçada à ala mais antieuropeia do Partido Conservador (governista), que não escondeu a rejeição aos termos do acordo preliminar para o Brexit. Em particular, os eurocéticos questionam a fórmula encontrada para manter aberta a fronteira entre a província britânica da Irlanda do Norte e a República da Irlanda, que permanece vinculada à UE. Outra questão de fronteira, que se insinua como obstáculo à ratificação do texto, é a pretensão da Espanha sobre Gibraltar, possessão britânica na Península Ibérica. O premiê espanhol, o socialista Pedro Sánchez, ameaça negar o voto favorável na reunião de cúpula deste domingo — o que bastaria para bloquear o acordo.

“O projeto será aprovado, apesar de tudo que se diz”, garantiu a ministra britânica do Trabalho, Amber Rudd. Assim como a chefe de governo, ela minimizou as resistências oferecidas ao acordo na própria bancada conservadora, embora um grupo dissidente tenha ensaiado articulações para apear May da chefia do governo — por um desafio à sua liderança no Partido Conservador ou pela via de uma moção de desconfiança apresentada ao parlamento. De acordo com os analistas, para derrubar o gabinete seriam necessários os votos de 48 deputados governistas.

May chegou a Bruxelas na tarde de ontem e posou para fotos diante do complexo de Berlaymont — a sede da UE — ao lado do presidente da Comissão Europeia (CE, braço executivo do bloco), Jean-Claude Juncker. Os dois líderes tinham pela frente uma agenda concentrada no teor da declaração política que deve determinar o futuro relacionamento entre ambos os lados do Canal da Mancha — um documento de cerca de 20 páginas, ainda em discussão, destinado a dar as últimas palavras a respeito de 17 meses de negociações sobre o Brexit.

 

Transição

Este documento, não vinculativo, acompanhará o acordo de separação entre a UE e o Reino Unido, após mais de quatro décadas de adesão, e estabelecerá as principais linhas de um eventual acordo de livre-comércio que ambas as partes começarão a negociar após a efetivação do Brexit. Pelo cronograma definido, a separação será efetiva a partir de 29 de março. Terá início, então, uma fase de transição com vigência até 31 de dezembro de 2020. Durante esse período, Londres continuará na união aduaneira e no mercado único europeu e respeitará as regras da UE, mas sem direito de voz ou de voto nas instâncias comunitárias.

Embora a UE queira uma “ausência de tarifas aduaneiras e de cotas para bens” com o Reino Unido, vários países do bloco sustentam que isso não equivale ao cenário atual de livre-circulação de produtos. Essa seria a fórmula preferida para o governo britânico. Uma das incógnitas sobre o futuro é até que data esse período transitório poderá ser estendido. O chefe da equipe de negociadores de Bruxelas, Michel Barnier, estava aberto à possibilidade de ampliá-lo por mais dois anos, segundo fontes europeias.

Outra questão em aberto, que deve aparecer refletida na declaração política sobre a futura relação, é como tentar garantir o acesso da frota pesqueira europeia às águas territoriais do Reino Unido, ao fim do período de transição.

 

Frase

"O projeto de acordo para o Brexit será aprovado, apesar de tudo que se diz”

Amber Rudd, ministra britânica do Trabalho