O globo, n. 31162, 01/12/2018. País, p. 4

 

MP quer manter auxílio

Adriana Mendes

André de Souza

01/12/2018

 

 

Pela categoria, Dodge recorre de decisão que deu fim ao benefício

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, recorreu da decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux, que, na segunda-feira, revogou o pagamento do auxílio moradia a juízes, promotores, procuradores e integrantes de outras carreiras jurídicas. O objetivo é impedir a suspensão do benefício para os integrantes do Ministério Público (MP). Fux proibiu o pagamento do penduricalho em todo o país após acordo para que fosse sancionado o reajuste salarial de 16,38% para ministros da Corte a partir de 2019. Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), foram gastos R$ 4,65 milhões em outubro deste ano com o benefício apenas no Ministério Público Federal (MPF). Multiplicado por 12, o valor estimado chega a R$ 55,79 milhões por ano, sem incluir o Ministério Público estadual e outros ramos do Ministério Público da União.

A própria Dodge não recebe auxílio moradia. Ela tinha direito, mas, em agosto de 2017, pouco antes de assumir o cargo, pediu a suspensão. Mesmo assim, em fevereiro deste ano, em outro parecer enviado ao STF, Dodge já tinha defendido a legalidade do benefício. Agora, em novo parecer, ela foca apenas em questões técnicas. A procuradora-geral sustenta que a decisão de Fux, tomada num processo que diz respeito apenas a juízes, não poderia alcançar outras carreiras jurídicas. Diz ainda que o pagamento do benefício a integrantes do MP é baseado na Lei Orgânica do Ministério Público.

“Afronta à ampla defesa”

Na decisão, Fux diz que ela se aplica ao Poder Judiciário, ao Ministério Público, às Defensorias Públicas, aos Tribunais de Contas e a “qualquer outra carreira jurídica”. No seu entendimento, deve haver “simetria” entre as diferentes carreiras. Dodge discordou. Para ela, ao não ouvir o Ministério Público no processo em que foi tomada a decisão, houve “ostensiva afronta à ampla defesa e ao contraditório” e também ao devido processo legal. Dodge lembra que o benefício de procuradores e promotores está sendo tratado em outra ação ainda pendente de julgamento pela Corte. Ela pede que Fux reconsidere a decisão ou remeta o assunto ao plenário do STF: “São juízes demandando contra a União, sem que houvesse citação do Ministério Público. No fim, o Ministério Público e o Conselho Nacional do Ministério Público são instados a obrigações sem terem sido citados e sem qualquer possibilidade de defesa. O mesmo, diga-se, aplica-se à Defensoria Pública, ao Conselho Nacional de Justiça e a inúmeras instituições públicas”, argumentou.

Em 2014, Fux deu várias liminares garantindo o pagamento do auxílio moradia aos magistrados brasileiros. Este mês, com a sanção do reajuste dos salários de ministros do STF, aos quais os demais juízes estão vinculados, Fux cumpriu sua parte no acordo feito com o presidente Michel Temer e revogou o pagamento do auxílio. Com o reajuste sancionado, o salário de ministros do STF passará de R$ 33,7 mil para R$ 39 mil. Na última decisão, Fux mencionou a situação econômica do país, mas continuou dizendo que o benefício é justo. Isso foi ressaltado agora por Raquel Dodge: “Ora, passados quatro anos desde a concessão da medida, a decisão que agora revogou a antecipação de tutela não apontou qualquer fator que infirmasse os argumentos anteriormente invocados para a concessão da liminar, evidenciasse a ilegalidade ou inviabilizasse a percepção do benefício em causa”.

No parecer de fevereiro, Dodge defendeu o pagamento no MP: “A leitura da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público mostra que o legislador incluiu entre os direitos dos membros do parquet (Ministério Público) a desoneração, mesmo que parcial, em matéria de moradia. Ao dizer que, onde não houver residência oficial, é devido o auxílio, deixou claro que a verba compensa os que não receberam residência oficial condigna, assumida como obrigação do Estado”. O auxílio moradia na prática eleva rendimentos de procuradores, promotores e juízes, fazendo com que muitos deles ganhem mais do que o teto constitucional do funcionalismo. Em fevereiro, Dodge argumentou que não se trata de salário disfarçado, uma vez que nem todos recebem o benefício. Embora a grande maioria tenha direito, ele não é pago a quem tem residência oficial à disposição ou é casado com alguém que já receba auxílio moradia.

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PGR pede de volta dinheiro da campanha de Lula

Rayanderson Guerra

01/12/2018

 

 

Dodge solicita ao TSE que PT restitua cofres públicos com verba do Fundo Eleitoral gasta quando ex-presidente era candidato

A procuradora-geral Eleitoral, Raquel Dodge, pediu ontem ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que a coligação O Povo Feliz de Novo, que teve Fernando Haddad (PT) como candidato à Presidência, devolva ao Fundo Partidário os valores gastos para financiar a campanha presidencial enquanto o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva apresentou-se como candidato. O pedido foi feito na ação que analisa as contas de campanha apresentadas ao TSE pela coligação. De acordo com Dodge, parte do dinheiro público foi utilizado “indevidamente e representa gastos ilegais, uma vez que — como já havia sido condenado em segunda instância — Lula sabia que era inelegível e assumiu o risco ao requerer o registro de candidatura”. A coligação informou que no período em que o ex-presidente encabeçou a chapa presidencial foram gastos R$ 19,4 milhões do Fundo Especial de Financiamento de Campanha. A procuradora-geral pediu que o valor usado no período em que Lula era candidato seja restituído com juros e correção monetária. O objetivo da medida, segundo a PGE, é evitar que recursos públicos sejam utilizados por candidatos “manifestamente inelegíveis”.

“Perseguição”

No documento, a procuradora diz que são passíveis de devolução os valores dos fundos usados “para promoção político-eleitoral direta e indireta”. De acordo com a PGE, o dinheiro gasto com o deslocamento, com os eventos do então candidato a vice-presidente, Fernando Haddad, despesas com telefonia, pesquisas e testes eleitorais são considerados como “utilização indevida” de recursos do fundo. A procuradora-geral eleitoral lembra ainda que “a campanha ilegal foi prorrogada o máximo possível: somente no último dia de prazo recursal foi solicitada a substituição de Lula”. Dodge ainda sustenta que houve má-fé por parte de Lula ao concorrer ao cargo. Para a PGE, o pedido de registro de candidatura teve efeito apenas protelatório. O ex-presidente está preso desde 7 de abril, cumprindo pena pela condenação pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. O objetivo da coligação liderada pelo PT, segundo Raquel Dodge, era manipular os eleitores pela eventual continuidade do futuro candidato substituto e viabilizar o gasto desnecessário de verba pública. O entendimento é de que tudo foi feito “em prejuízo da isonomia entre os candidatos, da normalidade e legitimidade do pleito e da salvaguarda do erário, bem como do exercício consciente do sufrágio”. Em nota assinada pela presidente do partido, Gleisi Hoffmann, o PT diz que os atos de campanha de Lula foram legais, e que a acusação faz parte de uma perseguição. “A campanha Lula Presidente cumpriu rigorosamente a legislação. Ilegal foi a cassação do registro da chapa Lula-Haddad, que contrariou a Lei Eleitoral (...). Da mesma forma, arrecadação e as despesas da campanha foram absolutamente legais. Ilegal é ação da Procuradoria-Geral, pois contaria o artigo 16 A da Lei Eleitoral, que garante aos candidatos subjudice todos os atos de campanha. Este é mais um ato da série de perseguições ao PT que só vem aumentando desde o fim da campanha eleitoral”, diz Gleisi na nota.