O globo, n. 31222, 30/01/2019. País, p. 8

 

Ibama multa, mas Vale e Samarco driblam sanções desde 2015

Manoel Ventura

Mateus Coutinho

30/01/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Juntas, empresas devem mais de R$ 730 milhões. Órgão ambiental recebe apenas 14% dos valores de todas as multas aplicadas nos últimos três anos

Responsável pela barragem de rejeitos de mineração que rompeu em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte, a mineradora Vale recebeu R$ 389 milhões em multas aplicadas pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) desde 2015. Nada pagou até agora. A conta já inclui os R$ 250 milhões de sanção pelo desastre na cidade mineira.

A Samarco é outra mineradora que não quitou um centavo sequer de multas aplicadas pelo Ibama, passados três anos do rompimento da barragem do Fundão, na cidade mineira de Mariana, considerado o maior desastre ambiental da História do país. A empresa, que tem a Vale como uma de suas acionistas, junto com a anglo-australiana BHP Billiton foi alvo de 25 autos de infração que resultaram em sanções totalizando R$ 350,7 milhões, todas ainda não quitadas.

Madeira ilegal

O valor de mais de R$ 730 milhões devidos pela Vale e Samarco sintetiza o baixo percentual de recolhimento do Ibama em relação às multas que aplica. De 2015 até hoje, o órgão expediu 63.021 sanções econômicas a infratores. Mas só 9.257, ou 14,6%, foram pagas.

— O setor extrativista, principalmente, sempre aposta na anistia dessas multas em algum momento. Só são pagas as pequenas multas. Existe uma aposta na impunidade e na anistia — diz Nilo D’Avila, diretor de campanhas do Greenpeace.

O histórico de receber um baixo percentual de multas aplicadas tem relação com a possibilidade de recursos no âmbito do próprio Ibama e também longos processos que se arrastam na Justiça.

No caso das 22 multas da Vale, que somam R$ 389 milhões, há processos administrativos para apuração não apenas de casos de desastres ambientais. Uma das autuações, por exemplo, é pela apreensão de madeiras nativas da Amazônia que seriam utilizadas de forma ilegal na construção de trilhos para ferrovia da companhia.

Como a empresa apresentou recursos, nada foi pago. O Ibama alerta, porém, que medidas legais e necessárias para a cobrança “serão tomadas oportunamente”, inclusive a remessa dos débitos para a Dívida Ativa da União.

O número total de débitos ambientais na conta da Vale, porém, tende a ser maior, já que, nos dados do Ibama, não estão incluídas as multas estaduais. Procurada, a empresa não se manifestou.

As últimas sanções direcionadas à Vale foram por causa do desastre de Brumadinho. Nesse caso, a empresa terá 20 dias para recorrer, a partir da notificação. Os danos ao meio ambiente decorrentes do rompimento de barragem da mina Córrego do Feijão resultaram, até o momento, em cinco autos de infração no valor de R$ 50 milhões cada.

A Vale está envolvida em processos ambientais que podem resultar em condenações de R$ 7,93 bilhões, sem contar a tragédia de Mariana, há três anos, e a atual, segundo dados disponíveis no último balanço da empresa. Apesar desse número, a companhia prevê em seu caixa somente R$ 13 milhões para para custear perdas nessas ações no curto prazo —0,16% do total.

No caso da Samarco, além das multas ainda não pagas, o Ibama expediu 73 notificações para exigir a adoção de medidas de regularização e correção de conduta relacionadas à barragem do Fundão. A mineradora também firmou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com órgãos federais e estaduais. O TAC prevê que uma ação civil cobrando R$ 20 bilhões da mineradora seja extinta e que outro processo, movido pelo Ministério Público Federal cobrando R$ 155 bilhões, fique suspenso por dois anos. Em troca, a mineradora deu garantia à Justiça do cumprimento de obrigações, como apoio aos atingidos e ações ambientais, no valor de R$ 2,2 bilhões.