O globo, n. 31209, 17/01/2019. País, p. 4

 

Mudanças no gatilho

Natália Portinari

Bruno Góes

Carolina Brígido

17/01/2019

 

 

Bancada da bala quer reduzir idade mínima para 21 anos

Na sequência da flexibilização da posse de armas, abancada da bala planeja ofensiva para aprovar várias mudanças no Estatuto do Desarmamento. Há pelo menos cem projetos em tramitação na Câmara sobre o tema, entre eles a proposta der eduzir de 25 para 21 anosa idade mínima par aposse e porte de arma. Na esteirado decreto que flexibilizou apos sede armas de fogo no país, os deputados da bancada da bala, aliados do governo de Jair Bolsonaro, pretendem aprovar no Congresso uma série de mudanças no Estatuto do Desarmamento. Levantamento de técnicos da Câmara, obtido pelo GLOBO, revela que tramitam na Casa pelo menos 100 projetos que tentam facilitar o acesso de inúmeras categorias profissionais a armamentos de diferentes calibres.

Há uma série de propostas que libera marmas para categorias profissionais específicas. Toda selas estão apensadas a um projeto principal. Este texto permite apos seda arma em casa— e opor te dela pelas ruas — a todos os brasileiros acima de 21 anos que atendam a determinados requisitos técnicos. A idade mínima, hoje, é de 25 anos.

O projeto também esvazia as atribuições da Polícia Federal no processo de aprovação dos pedidos de registro de porte de armas. O texto fixa critérios para quem quer comprar uma arma e revoga o Estatuto do Desarmamento. Segundo o texto, não seria necessário comprovar “efetiva necessidade” para adquirir uma arma de fogo nem para carregá-la consigo.

De acordo com a proposta da bancada da bala, o registro para a posse de armas seria permanente, poupando a necessidade de renovar a cada 10 anos. Antes do decreto do governo Bolsonaro, o prazo era de 5 anos. Líder do grupo, o deputado Capitão Augusto (PR-SP) afirma que a ideia é manter algumas das condições, mas “deixar mais objetiva” a legislação.

— Baixar para 21 anos (a idade para ter uma arma) é o mais coerente. Se nós também defendemos a redução da maioridade penal, é preciso que também pensemos nisso para essa questão. Quando nós aprovamos o relatório do projeto em comissão, estávamos negociando com os deputados da última legislatura. Agora, como temos mais parlamentares de direita, temos Jair Bolsonaro presidente, a gente pode ser mais incisivo — diz o Capitão Augusto.

Anteontem, o próprio presidente, por meio de uma rede social, mencionou que o decreto que flexibiliza a posse era apenas “o primeiro passo”. E escreveu que, na lista de medidas que ainda deverão ser adotadas, está a “redução da idade mínima”. Já o ministro da Justiça e Segurança, Sergio Moro, acredita que a liberação do porte é um tema “muito delicado”.

Todos os pontos do projeto defendido pela bancada da bala serão debatidos no começo de fevereiro, quando os parlamentares da nova legislatura tomam posse. Atualmente, a bancada da bala é formada por 299 parlamentares. Porém, este número deve aumentar significativamente com a renovação no Congresso.

A ideia é usar o momento político para fortalecer o projeto por meio de emendas na hora da votação. Ainda não há consenso sobre o que pode ser alterado, mas o deputado reconhece que “ajustes” podem ser feitos.

O projeto retira ainda a exigência atual de que o interessado em obter a arma comprove que não responde a inquérito nem a processo criminal. A proposta coloca como obstáculo apenas o fato de ter sido condenado por crime doloso. Hoje, qualquer condenação penal é empecilho para ter a posse de arma de fogo.

Entre os projetos protocolados na Câmara — e que podem ser votados a partir de fevereiro — há ainda medidas que tentam liberar o porte de armas de fogo para vigilantes, guardas de trânsito e até pilotos de aeronaves. Uma das propostas permite andar com fuzil em carrosfortes e outra prevê a instalação de chips em todos os armamentos.

Na contramão da bala

Existe, no entanto, projetos em tramitação na Câmara que vão na contramão da onda armamentista. Há um projeto que proíbe condenados e réus criminais de frequentarem clubes de tiro, e outro que aumenta a pena para crime de porte ilegal de arma de fogo, de comercialização ilegal de arma de fogo e de tráfico internacional de arma de fogo.

Capitão Augusto lembra que a votação desses projetos quase ocorreu no ano passado. Segundo ele, havia um acordo com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para a apreciação da proposta em plenário, mas isso não ocorreu.

A relação do PSL, o partido de Bolsonaro — que terá 54 deputados na Câmara — com Maia é vista como estratégica para garantir o avanço dos projetos armamentistas. O partido já anunciou apoio integral à reeleição de Maia à presidência da Casa.

Se as matérias passarem pela Câmara dos Deputados, terão também de tramitar por comissões e serem votadas no plenário do Senado.

“Baixar para 21 anos (a idade para ter uma arma) é o mais coerente. Se nós defendemos a redução da maioridade penal, é preciso que também pensemos nisso para essa questão. Como temos Jair Bolsonaro presidente, a gente pode ser mais incisivo”

Capitão Augusto (PR-SP), Deputado federal e líder da bancada da bala na Câmara

A distância entre posse e porte de armas

> Qual a diferença da posse para o porte de arma?

Diferentemente da posse, o porte de arma de fogo é a autorização dada pela Polícia Federal para que uma pessoa possa andar armada nas ruas.

> Por que Bolsonaro mudou as regras da posse por decreto?

O decreto é um instrumento do chefe do Executivo para regulamentar uma lei já existente. No caso da posse, o decreto regulamenta pontos específicos de uma lei de 2003 sobre registro, posse e comercialização de armas. A mesma lei estabelece regras rígidas para o porte. Como Bolsonaro não mudou a lei, mas criou novas regras, ele pode usar o decreto.

> Por que Bolsonaro não pode decidir sobre o porte por decreto?

A lei atual estabelece a proibição do porte de arma, com exceção a trabalhadores da área de segurança pública e privada. Como a lei é bastante restrita, ficaria inviável juridicamente criar novos dispositivos na mesma lei autorizando o porte para outras pessoas. Para isso, Bolsonaro terá de mobilizar sua base parlamentar no Congresso para aprovar uma nova lei modificando as regras atuais.

> Se conseguir apoio do Congresso, Bolsonaro pode liberar o porte de armas?

Não há, na Constituição, empecilho para expandir o número de pessoas com direito ao porte de arma. Portanto, a proposta é juridicamente possível. Segundo especialistas, o instrumento ideal para mudar a regra atual é um projeto de lei, que depende de aprovação pelo Congresso Nacional. Ou seja, a tarefa de mudar o porte depende de negociação e formação de maioria no Parlamento a favor da medida.

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Validade de registro de arma restrita também aumentou

Renata Mariz

17/01/2019

 

 

Documento de posse de metralhadoras, fuzis e pistolas automáticas passa a ter vigência de 10 anos, contra três da regra anterior

O decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro na terça-feira ampliou a validade não apenas do registro de armas de fogo de uso permitido no país, mas também as de uso restrito. Até então, esse armamento de alto potencial destrutivo — como pistolas automáticas, metralhadoras e fuzis — tinha que ter a licença renovada a cada três anos. Agora, o prazo é de 10 anos, o mesmo estabelecido no decreto para as armas de uso permitido.

As armas de uso reservado só são permitidas para as Forças Armadas, instituições de segurança pública e pessoas físicas e jurídicas que conseguirem autorização do Exército. Entre pessoas físicas estão, por exemplo, os atiradores desportivos, que têm acesso a alguns dos modelos e calibres de uso restrito. Eles formam uma categoria específica ao lado de caçadores e colecionadores. Atualmente, há 192.272 armas com registro ativo nas mãos desse público. Não se sabe, porém, quantas são de uso restrito ou permitido. Nem o tamanho do acervo das demais categorias com acesso.

Servidores da ABIN

Outra mudança no decreto é a substituição dos nomes e demais dados pessoais de todos os integrantes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) nos cadastros de controle de arma de fogo de uso permitido e restrito no Brasil: o Sistema Nacional de Armas (Sinarm), gerenciado pela Polícia Federal, e o Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (SIGMA), do Exército.

Eles também estarão fora dos cadastros a identificação do fabricante e do vendedor da arma de fogo. Todos os dados serão substituídos pela matrícula funcional do proprietário. O decreto não faz distinção entre armas funcionais, do acervo do órgão, ou particulares, de uso pessoal do servidor.

A Casa Civil da Presidência afirmou que a medida se justifica porque “há características ímpares da Abin”, dizendo que “a inserção comum num cadastro cujo acesso é aberto a terceiros constituiria vulnerabilidade para a atividade de inteligência do Estado brasileiro”. A Abin informou que “estes dados apenas deixarão de estar amplamente disponíveis para qualquer pessoa com acesso aos sistemas”, mas que ficarão disponíveis a órgãos de controle mediante requisição à agência.