O globo, n. 31197, 05/01/2019. Economia, p. 21

 

Desmentido

Eduardo Bresciani

Mateus Coutinho

Jussara Soares

05/01/2019

 

 

Uma série de declarações equivocadas do presidente Jair Bolsonaro provocou tensão no governo e obrigou a equipe econômica e o Palácio do Planalto a virem a público ontem para acalmar os ânimos. No fim da manhã, Bolsonaro disse que havia assinado um decreto elevando o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para aplicações no exterior e que a alíquota máxima do Imposto de Renda (IR) das pessoas físicas seria reduzida imediatamente de 27,5% para 25%. O presidente disse que o anúncio seria feito ainda ontem pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, que estava no Rio. Primeiramente, ele adiou um compromisso que teria na Comissão de Valores Mobiliários de manhã para a tarde e, horas depois, cancelou definitivamente o encontro. O ministro não apareceu em público durante todo o dia. Bolsonaro também provocou desconforto ao criticar o formato do negócio entre Boeing e Embraer. Na véspera, o presidente já tinha dado declarações sobre a reforma da Previdência, que surpreenderam sua equipe. Os técnicos estão trabalhando para fixar uma idade mínima de 65 anos, mas o presidente disse que a proposta de seu governo prevê uma idade de 62 anos para homens e de 57 anos para mulheres, sem especificar a quem se referia.

Sem mudança imediata no IR

O IOF, segundo Bolsonaro, seria usado para compensar uma pauta-bomba aprovada pelo Congresso no fim do ano passado: a prorrogação até 2023 de incentivos concedidos a empresas que operam nas áreas de atuação das superintendências de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e do Nordeste (Sudene). O benefício venceria neste ano. —Infelizmente foi assinado decreto nesse sentido (aumento do IOF), para quem tem aplicações aí fora, para poder cumprir uma exigência de um projeto aprovado como pauta-bomba, contra a nossa vontade. O Paulo Guedes anuncia hoje também a possibilidade de diminuir a alíquota do Imposto de Renda, porque o nosso governo tem de ter a marca de não aumentar impostos —disse o presidente. No entanto, poucas horas depois, Bolsonaro foi desmentido por seu próprio time. O secretário especial da Receita, Marcos Cintra, informou, à tarde, que não haveria aumento de IOF. Ele explicou que o que o presidente assinou foi um decreto limitando a execução dos projetos da Sudam e da Sudene à disponibilidade de recursos no Orçamento. Cintra esclareceu que o decreto tornou desnecessário outro tipo de compensação, como a elevação do IOF. — Deveria estar provavelmente se referindo a algum outro fato ou alguma outra época ou algum outro debate, não a este que está especificamente relacionado à questão deste benefício fiscal— disse o secretário ao tentar explicar as declarações de Bolsonaro. Sobre a redução do teto do IR, Cintra admitiu que o assunto está sendo estudado, mas que não haverá mudança imediata. Segundo ele, uma eventual alteração só será discutida “posteriormente” e “no tempo correto”. Depois de Cintra, foi a vez do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, tentar explicar, no início da noite, o ruído provocado pelo presidente:

— Ele se equivocou. Ele assinou a continuidade do projeto da Sudam e da Sudene.

Premissa é equilíbrio fiscal

Em relação à redução do IR, o ministro disse que é uma “tese que vem lá da campanha”, mas ressaltou que não é o momento de reduzir a arrecadação, devido ao rombo nas contas públicas.

— Temos uma premissa que é obter o equilíbrio fiscal. Nós temos para este ano um déficit primário previsto de R$ 139 bilhões. Claro que não podemos nesse momento fazer nenhuma ação que pode resultar em redução da arrecadação — disse ele, acrescentando: —Assim que obtivermos o equilíbrio fiscal, vamos trabalhar para baixar a carga tributária. De acordo com Onyx, o aumento de imposto era apenas uma das possibilidades estudadas para dar continuidade ao programa de desenvolvimento para o Norte e Nordeste. Ontem, no entanto, a sugestão teria sido rejeitada porque vai contra uma das principais promessas de campanha do presidente. — A questão do IOF é porque foi uma das alternativas para dar sustentação à prorrogação (dos programas de desenvolvimento). O presidente assinou a sanção, e nós concordamos por ser um princípio do governo não haver aumento de carga tributária. Então, vai aqui um reconhecimento para toda a equipe da Subchefia de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, que encontrou uma solução que cumpre a lei de responsabilidade fiscal sem onerar o já onerado e sacrificado contribuinte brasileiro. Não haverá nenhum aumento de IOF — afirmou o ministro. Sobre a reforma da Previdência, o ministro disse que a mensagem do presidente foi apenas “passar para as pessoas a tranquilidade de que a transição vai ser humana”.