O globo, n. 31196, 04/01/2019. País, p. 6

 

Bolsonaro aprofunda 'despetização' do governo

Manoel Ventura

Jussara Soares

Eduardo Bresciani

04/01/2019

 

 

Presidente autoriza três mil exonerações para diferenciar gestão dos anos PT, e determina ‘pente fino’ em últimos atos de Temer; ministérios fundidos na pasta da Economia concentram maioria das demissões já feitas

Em uma tentativa de diferenciar sua gestão dos governos do PT, marcados pelo loteamento de cargos, o presidente Jair Bolsonaro atingiu ontem, no seu terceiro dia de trabalho, a marca de 3,4 mil servidores exonerados. A “despetização” da máquina federal, anunciada pelo ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, será implementada, por ordem do presidente, em todas as outras 21 pastas da Esplanada, o que pode elevar ainda mais esse número.

—Sobre o episódio da exoneração, a gente brincou em “despetização”, o presidente gostou do exemplo e todos os ministros estão autorizados a, dentro das suas pastas, proceder de maneira semelhante e ajustada. Até para desaparelhar e permitir que governo possa executar suas políticas —afirmou.

Reunião ministerial

A maior par tedas exonerações já encaminhadas pelo novo governo deve ocorrer nas quatro pastas que serão fundidas no novo ministério da Economia, comandado por Paulo Guedes. Ontem, um decreto assinado por Bolsonaro autorizou a exoneração de 3,1 mil servidores comissionados ou lotados em funções gratificadas nas antigas pastas da Fazenda, do Planejamento, do Trabalho e da Indústria e Comércio Exterior.

As demissões serão implementadas apenas em 30 de janeiro, depois de uma triagem. Além das exonerações na área do novo ministério da Economia, a Casa Civil de Onyx já havia exonerado cerca de 300 servidores comissionados na quarta-feira. A extinção dos cargos não significa que o número de pessoas trabalhando no ministério será reduzido no mesmo montante. Isso porque a maior parte dos cargos é uma gratificação paga a servidores de carreira que ocupam cargos de chefia.

Quando o PT assumiu a máquina em 2003, uma frase do então presidente do partido, José Genoino, deflagrou a ocupação do partido na máquina estatal: “Nós fomos eleitos para mudar”, disse Genoino, ao justificar o fato de o partido ter reservado 15 mil dos 21 mil cargos comissionados disponíveis à época para petistas. Mudar os servidores do governo tucano que deixava o poder por petistas era a forma de o partido de reformular o Estado. O método marcaria o início de uma longa política de aparelhamento de entidades, sindicatos e movimentos sociais, que teriam seus quadros incorporados à administração pública em troca de fidelidade.

Ontem, na primeira reunião ministerial, Bolsonaro definiu as primeiras medidas do novo governo. Além de orientar os ministros sobre a necessidade de critério técnico na escolha de assessores do segundo e terceiro escalões, o presidente determinou um pente-fino nos atos dos últimos 30 dias da gestão de Michel Temer.

Bolsonaro também autorizou uma revisão nos conselhos da máquina federal, para reduzir ou até mesmo acabar com alguns desses colegiados, e ordenou um levantamento dos imóveis da União .

As ações foram anunciadas por Onyx , que, sem detalhar, justificou a varredura dizendo que o governo teria detectado movimentações “incomuns” na máquina federal, tanto de servidores quanto de recursos financeiros entre ministérios:

— Verificamos que houve uma movimentação incomum de nomeações e exonerações nos últimos 30 dias. Houve movimentação incomum de recursos destinados a ministérios nos últimos 30 dias. Foi solicitada a todos os ministros uma revisão de nomeações, exonerações e transferências.

O ministro afirmou que o presidente Bolsonaro receberá relatórios de cada um dos ministros sobre os atos adotados pela gestão Temer, sobretudo nos últimos 15 dias de governo. Na próxima terça-feira será realizada uma nova reunião com toda a equipe ministerial. Será nessa ocasião que serão apresentadas as propostas para as primeiras medidas do governo.

Opinião do GLOBO - Longo trabalho

O MINISTRO Onyx Lorenzoni usou o termo “despetizar”, ao anunciar o afastamento de 320 servidores de cargos comissionados na Casa Civil. De fato, em 13 anos de poder, o PT ocupou muito espaço na máquina pública.

POR EXISTIR esta possibilidade de encher palácios e repartições de militantes, os partidos gastam dinheiro do contribuinte com esses apaniguados. Mas não há dúvida de que, pelas características ideológicas do PT, o aparelhamento, em seu tempo, foi amplo.

NÃO SERÁ revertido de uma hora para outra.