O globo, n. 31213, 21/01/2019. País, p. 5

 

Revelações desgastam clã Bolsonaro nas redes

Igor Mello

21/01/2019

 

 

Comentários negativos sobre o caso Queiroz superaram os positivos, uma raridade para o grupo político que melhor usou a internet nos últimos anos. Ação de robôs e perfis fakes diminuiu em relação à campanha eleitoral

A repercussão do caso envolvendo o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e seu ex-assessor Fabrício Queiroz vem provocando desgaste para o governo e para o clã dos Bolsonaro nas redes sociais, segundo estudo feito pela empresa de análise AP/Exata. O levantamento também conseguiu identificar que a ação de robôs, perfis fakes e militantes profissionais tem diminuído.

Entre os usuários reais, o caso tem gerado sucessivas ondas de comentários negativos, superando as publicações positivas, uma raridade para o clã Bolsonaro, que fez do apoio em massa nas redes sociais um dos principais meios para ganhar a eleição. De acordo com o levantamento, entre quinta e sexta-feira da semana passada, foram registradas 59.441 publicações no Twitter com os termos “Queiroz” e “Flávio Bolsonaro”. Deste total, 38% das menções foram negativas, enquanto apenas 22% foram positivas. As demais postagens foram consideradas neutras — quando não há um juízo de valor claro sobre o tema. Em geral, estas postagens são as mais numerosas. Contudo, no caso Queiroz somam apenas 40%, quase o mesmo patamar dos comentários negativos.

— O sentimento negativo é muito maior do que o positivo. Isso é um baque na imagem do Bolsonaro, porque até então era tudo muito positivo. Nesse caso do Queiroz, a confusão está colocada. A maioria dos tweets é negativa e o sentimento de medo e de raiva estão muito presentes. Há ainda alguma confiança, são pessoas que defendem Bolsonaro e a honestidade dele — analisa Sergio Denicoli, diretor da AP/Exata e pós-doutor em comunicação digital.

Apoiadores cobram

O medo e a tristeza foram os sentimentos mais presentes nos comentários. Nos perfis da família Bolsonaro nas redes sociais, um número expressivo de apoiadores fez comentários críticos —que iam da cobrança por uma explicação para as denúncias até acusações de corrupção.

—Se o caso Queiroz continuar crescendo dessa forma, poderia afetar a imagem do governo e reduzir a confiança —diz Denicoli.

A ação de robôs nas discussões envolvendo o presidente Jair Bolsonaro também foi reduzida significativamente,

segundo dados extraídos do Twitter pela AP/ Exata. No auge da repercussão sobre o caso Queiroz, na última quinta-feira, o número de posts feitos por esse tipo de usuário na rede social caiu 40% em relação ao segundo turno presidencial. O escândalo também fez com que os sentimentos negativos associados ao tema atingissem um patamar proporcional mais elevado que o normal.

A AP/Exata trabalhou com uma amostra de tweets geolocalizados em 145 cidades monitoradas pelos pesquisadores. Fakes, robôs e perfis militantes fizeram 3.157 publicações sobre a decisão do ministro Luiz Fux, do STF, de suspender as investigações sobre o caso Queiroz. Os dados foram captados entre as 16h de quinta e as 16h desta sextafeira, período em que os termos “Queiroz” e “Flávio Bolsonaro” tiveram expressiva repercussão na rede social. O número é 40% menor do que o captado com a mesma amostra nas 24 horas anteriores ao fim da votação do segundo turno, quando foram registrados 5.204 tweets.

Os dados mostram que parte do artifício montado para influenciar artificialmente as discussões nas redes sociais durante a campanha foi desmobilizado, embora parte dele tenha sido reativado com a repercussão do caso Queiroz — na primeira semana de dezembro, a queda chegou a 73%.

— Quando há uma crise, como é o caso Queiroz, esses robôs aparecem novamente. Claro que não no volume da eleição, mas eles voltam a operar. Há aí gente pró-Bolsonaro, mas também há do PT e de outros partidos — pondera o diretor.