O globo, n. 31213, 21/01/2019. Economia, p. 17

 

Uma nova economia

Jussara Soares

21/01/2019

 

 

Presidente quer mostrar em Davos um Brasil liberal e aberto a investidores

O presidente Jair Bolsonaro embarcou ontem à noite para sua primeira viagem ao exterior levando na bagagem a expectativa de conquistar o respeito da comunidade econômica internacional e de ser reconhecido como um novo líder político da América Latina. No Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, ele defenderá a “refundação da economia brasileira por bases liberais”, baseado no apoio popular conquistado graças à sua agenda conservadora, além de participar de discussões sobre a Venezuela.

Bolsonaro discursará, amanhã, na abertura da sessão plenária do evento, na condição de primeiro chefe de Estado do Hemisfério Sul a inaugurar o Fórum. Será às 15h30m, horário de Brasília. Na quartafeira, o presidente brasileiro também será o primeiro a se apresentar no jantar com chefes de Estado de países latino-americanos.

Os discursos que estão sendo preparados para Bolsonaro têm como objetivo sinalizar aos investidores globais que a agenda econômica — que inclui as reformas da Previdência e tributária, a abertura comercial e a atração de investimentos — é um compromisso do governo brasileiro. De acordo com um auxiliar do presidente, a mensagem é defender a refundação da economia brasileira em bases liberais. Bolsonaro argumentará que isso só será possível graças a uma mobilização popular construída a partir do apoio a sua agenda conservadora.

Venezuela na pauta

Há a expectativa de que, durante a viagem, Bolsonaro apresente pelo menos parte do projeto de reforma da Previdência. O desafio é reafirmar ao mundo que o Brasil é uma ótima oportunidade de investimento.

Já no encontro com líderes latino-americanos, Bolsonaro voltará a defender empenho na luta pelo fim do regime de Nicolás Maduro, na Venezuela. Tema recorrente em sua campanha, o país vizinho também esteve na pauta dos primeiros dias do governo. A Venezuela foi um dos assuntos da reunião de Bolsonaro com o presidente argentino, Mauricio Macri, na quarta-feira passada. No dia seguinte, o presidente brasileiro recebeu opositores de Maduro e gravou um vídeo dirigido aos venezuelanos, prometendo que a solução para a crise “virá brevemente”.

Também está prevista a participação de Bolsonaro em discussões sobre globalização, tecnologia e inovação. Um dos debates será sobre a chamada Globalização 4.0, sobre como os países podem construir uma arquitetura global sustentável e inclusiva.

A comitiva presidencial para a Suíça é composta por cinco ministros: Augusto Heleno (Segurança Institucional), Sérgio Moro (Justiça), Gustavo Bebianno (Secretaria-Geral), Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Paulo Guedes (Economia). Também viajam no avião presidencial o deputado e filho Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o assessor especial Filipe Martins (responsável pelos discursos), Marcos Troyjo (secretário de Comércio Exterior) e Mario Vilalva (presidente da Apex).

Moro reforçará, no Fórum, a luta contra a corrupção. Segundo sua assessoria, a mensagem será que “o Estado de Direito e negócios limpos são bons para os negócios, e a corrupção mina não apenas a confiança nos governos, mas também no mercado. A corrupção mina a globalização e a torna injusta.”

O Fórum de Davos começa na terça-feira e vai até o dia 25. Mas hoje já há eventos importantes: o Fundo Monetário Internacional (FMI) apresentará o Panorama Econômico Mundial, com projeções para o crescimento global, e a cerimônia dos Crystal Awards, que premia artistas e líderes culturais.

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Dez anos após crise financeira, fortuna de participantes cresceu

21/01/2019

 

 

Empresários chegam ao Fórum com US$ 175 bilhões a mais no bolso

Uma década após a crise financeira ter afetado o Fórum Econômico Mundial, os altos executivos que costumam comparecer ao evento recuperaram e ainda elevaram seus ganhos. As fortunas de uma dezena de participantes do Fórum de Davos aumentaram em US$ 175 bilhões entre 2009 e este ano.

David Rubenstein, da empresa global de investimentos Carlyle Group, dobrou sua fortuna desde 2009. Jamie Dimon, presidente do JPMorgan Chase, mais que triplicou seu patrimônio líquido. E Stephen Schwarzman, do Blackstone Group (companhia global de private equity) aumentou sua riqueza em seis vezes. É um feito notável, dado o tumulto econômico e político dos últimos dez anos, que vai da quebra do banco Lehman Brothers ao Brexit e a vitória de Donald Trump.

Os dados ilustram a lacuna cada vez maior na economia global entre os verdadeiros ricos —o 0,1% que tem tudo —e os que nada têm. Dados dos relatórios do banco UBS e da consultoria PwC mostram que a riqueza global dos bilionários cresceu de US$ 3,4 trilhões em 2009 para US$ 8,9 trilhões em 2017. As ações dos bancos centrais dos países para combater a crise financeira, como baixar taxas de juros e recorrer a programas de compra de títulos no mercado, sustentaram essa riqueza crescente, elevando os preços dos ativos.

—Há dez anos, ironicamente, no nível mais baixo do mercado, o que você queria ter era capital e, se tivesse capital, você se sairia incrivelmente bem —disse Michael Hartnett, estrategistachefe do Bank of America.

Isso significa que o chamado Homem de Davos — a conferência continua sendo predominantemente masculina —exerce mais autoridade e tem mais visibilidade do que nunca.

Dimon está retornando ao Fórum com o JPMorgan mais lucrativo do que nunca. Já Schwarzman transformou o Blackstone Group no maior gestor de ativos do mundo, com US$ 457 bilhões em 30 de setembro de 2018, bem acima dos US$ 95 bilhões do fim de 2008.

E Davos continua tão popular como sempre. Esperase que o Fórum, que vai focar na Globalização 4.0, receba 3 mil pessoas. Este ano, George Soros será o anfitrião de um jantar no qual discursará, e o JPMorgan oferecerá um coquetel. Bill Gates estará presente, assim como o bilionário Rubenstein, do Carlyle Group.

Mas, para aqueles com pouco ou nenhum patrimônio, os últimos dez anos foram bem mais desafiadores. Os salários estagnaram e, apresar de os mercados de ações terem crescido, há menos investidores que em 2009. A remuneração dos diretores executivos das maiores empresas americanas é agora 312 vezes a remuneração média anual do trabalhador típico. Há dez anos, essa proporção era de 200 vezes, de acordo com um relatório de 2018 do Instituto de Política Econômica dos EUA.