O globo, n. 31207, 15/01/2019. Economia, p. 17

 

Governo escolhe almirante para presidir conselho da Petrobras

Rennan Setti

Manoel Ventura

15/01/2019

 

 

Lista de indicados tem geólogo que já foi multado pela CVM por uso de informação privilegiada, mas contesta punição na Justiça

O governo indicou três nomes para o Conselho de Administração da estatal, entre eles o almirante Leal Ferreira, que é próximo de Bolsonaro e deve presidir o colegiado. Ogoverno indicou ontem três novos membros para o Conselho de Administração da Petrobras, entre eles Eduardo Bacellar Leal Ferreira, que comandou a Marinha até semana passada. O almirante de esquadra, que tem uma relação próxima com o presidente Jair Bolsonaro, deve presidir o colegiado. Segundo a Petrobras, desde 1979 um militar não chefiava o conselho da estatal. O colegiado passará a ser composto também pelo economista João Cox, presidente do conselho da TIM, e pelo geólogo John Forman, ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo (ANP).

As nomeações ocorrem após os conselheiros Luiz Nelson Carvalho e Francisco Petros terem renunciado aos cargos em 1° de janeiro. Ontem, Durval José Soledade Santos pediu para deixar o conselho em 4 de fevereiro. Desde dezembro, ainda na transição, integrantes da equipe de Bolsonaro vinham pressionando conselheiros a renunciar, com o objetivo de conseguir renovar parte do colegiado antes do fim dos mandatos, em 2020. A intenção é deixar o conselho mais alinhado à visão do atual comando da empresa. Um dos alvos é o conselheiro Segen Estefen, que se mantém no cargo.

O Conselho de Administração é o órgão responsável pelas decisões estratégicas da Petrobras. Já nos próximos meses, caberá aos conselheiros decidir sobre o desfecho de uma negociação crucial para as contas públicas e para a saúde financeira da Petrobras: a revisão do contrato da cessão onerosa, pelo qual a estatal obteve o direito de explorar até cinco bilhões de barris numa região do présal. A revisão pode render cerca de US$ 14 bilhões à estatal, segundo previsões deixadas pelo governo anterior, mas a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, estaria pressionando para que o valor seja menor, já que sairá do Tesouro.

Militar amigo de Bolsonaro

“Foi um ciclo que se encerrou. Uma nova era se inicia com uma visão estratégica de longo prazo e objetivo de geração de valor para os acionistas e para o Brasil. As modificações na administração da Petrobras refletem a nova orientação”, afirmou o presidente Roberto Castello Branco em comunicado divulgado ontem pela estatal. O texto ressaltou que a nova composição do conselho, que tem 11 membros, manterá o percentual mínimo de 40% de membros independentes.

— A empresa está na direção correta e talvez agora, com apoio político em Brasília, possamos acelerar na direção em que já estávamos — comemorou um conselheiro antigo da estatal. — O objetivo do novo conselho será melhorar os resultados do negócio e aumentar o foco no pré-sal, que é muito rentável.

A indicação do almirante Leal Ferreira para o Conselho foi atribuída por quem o conhece à sua experiência mais estreita com a Petrobras quando atuou como diretor de Portos e Costas, responsável por tarefas como a segurança em áreas de plataformas. Leal Ferreira conheceu o presidente da estatal, Castello Branco, apenas recentemente, mas teve contato direto com administradores anteriores da Petrobras durante sua carreira na Marinha.

— Ele chega também trazendo a visão estratégica de quem comandou uma estrutura complexa como a Marinha e para seguir a visão que o governo tem sobre a empresa, de preservação do papel estratégico da Petrobras — disse uma fonte próxima a Ferreira.

O almirante é considerado um amigo pessoal de Bolsonaro e, no Rio, mora próximo à casa do presidente na Barra da Tijuca, Zona Oeste. Ainda no ano passado, ele chegou a ser convidado para assumir a pasta da Defesa, mas recusou o convite por razões familiares. Mesmo após a recusa, Bolsonaro disse, em novembro, que “ele não se afastará do meu radar, sempre o procurarei para que boas decisões sejam tomadas, em especial na área da nossa Marinha.”

No entanto, o perfil do almirante, que deverá ser indicado para a presidência do conselho no lugar de Jerônimo Antunes —que assumiu interinamente com a saída do professor da USP Luiz Nelson Carvalho — não agradou a todos.

— Não vejo como sua experiência na Marinha possa dialogar com a indústria de petróleo — criticou uma fonte que atua na gestão da Petrobras.

Os nomes indicados ainda serão submetidos à aprovação dos procedimentos de governança da Petrobras, ao próprio conselho e a uma assembleia de acionistas. A próxima reunião está marcada para o fim de janeiro.

John Forman, mestre em geologia pela Universidade Stanford, nos EUA, já presidiu a Nuclebrás e foi diretor da ANP. Em 2016, foi multado em R$ 338,5 mil pela Comissão de Valores Mobiliários(CVM)porusoindevidode informação privilegiada (insider trading) com ações da petroleira HRT (atual PetroRio) em 2013. Na época, ele era conselheiro da companhia.

— Não fiz nada de errado e, inclusive, não paguei a multa e entrei com um processo na Justiça contra a CVM questionando o julgamento. Fui acusado de ter evitado prejuízo com informação privilegiada, mas só vendi 23% dos papéis que tinha. Ou seja, tomei prejuízo com o restante. Não faz sentido — defendeu-se Forman, que fora sondado para o conselho da Petrobras pelo atual ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, ainda no fim do ano passado.

João Cox é economista, especializado em economia petroquímica pela Universidade de Oxford. É hoje conselheiro da Braskem, na qual a Petrobras tem 49% do capital, e também esteve no colegiado da Embraer. No setor de telecomunicações, presidiu a Claro até 2010.