O globo, n. 31195, 03/01/2019. País, p. 8

 

Agricultura assume demarcações e serviço florestal

Catarina Alencastro

Bruno Góes

Jailton de Carvalho

03/01/2019

 

 

Ao tomar posse, Tereza Cristina nega diminuição das reservas indígenas, mas afirma que foco deve ser o interesse comercial do agronegócio; novo ministro do Meio Ambiente não vê esvaziamento da pasta

Ex-coordenadora da bancada ruralista na Câmara, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, terá sob seu comando a política indigenista, o Serviço Florestal Brasileiro (SFB) e o Cadastro Ambiental Rural (CAR), os últimos dois retirados do Ministério do Meio Ambiente.

Principal instrumento do Código Florestal Brasileiro, o CAR é uma espécie de “raio-x” que todo proprietário rural é obrigado a fazer de sua terra, apresentando, em imagens de satélite, os setores destinados à produção agropecuária e as Áreas de Preservação Permanente (APPs) e de reserva legal, locais cujo desmatamento é proibido.

No discurso de posse, ontem, Tereza Cristina enfatizou a necessidade de o país focar “nos interesses comerciais” do setor produtivo do agronegócio. Ela também afirmou que o país é um “modelo” na área ambiental.

— São relevantes as questões relacionadas ao clima, à sustentabilidade e à biodiversidade. A discussão honesta deveria partir de uma premissa básica. O Brasil é um país com legislação ambiental extremamente avançada, que mais soube preservar suas florestas nativas e matas ciliares. Nosso país é um modelo a ser seguido, jamais transgressor a ser recriminado —disse a ministra.

Sobre a política indigenista, a nova ministra afirmou que não haverá diminuição na demarcação de terras, pois o governo não vai “arrumar um problema que não existe”.

— É simplesmente uma questão de organização — declarou.

Ontem, no Twitter, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que o governo deseja “integrar” indígenas e quilombolas. Bolsonaro disse que 15% do território nacional são demarcados para esta população, que não chega a um milhão de pessoas. Também declarou que essas populações são “exploradas e manipuladas” por Organizações NãoGovernamentais (ONGs).

No mesmo tom, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno, defendeu a transferência da demarcação de terras indígenas do Ministério da Justiça para o Ministério da Agricultura, conforme prevê a medida provisória editada pelo presidente Jair Bolsonaro. Segundo o ministro, algumas mudanças na área já estavam previstas desde a campanha eleitoral.

— Foi uma promessa de campanha do presidente tratar do assunto. Como a demarcação de terras até hoje não deu certo, vale a pena tentar uma coisa diferente —disse Heleno, depois de participar da transmissão de cargo para o novo ministro da Defesa, general Fernando Azevedo.

Licença autodeclarada

Ao ser empossado como ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles minimizou a mudança, afirmando que a área ambiental não está perdendo protagonismo.

— Não há esvaziamento (do Ministério do Meio Ambiente). É uma questão de coerência. Não há nenhuma perda de protagonismo, até porque não há uma corrida por protagonismo. Não é assim que se cuida do interesse público —declarou.

Outro órgão que deixou de fazer parte do Ministério do Meio Ambiente foi a Agência Nacional de Águas (ANA), que passa a ser vinculado ao Ministério do Desenvolvimento Nacional.

Ao tomar posse, Salles também explicou a decisão do novo presidente do Ibama, Eduardo Bim, de tornar auto-declaratório o licenciamento ambiental de propriedades rurais —permitindo o desmatamento de vegetação nativa para a produção agropecuária. Para o novo ministro, o Brasil tem que criar uma “nova mentalidade” de confiança na veracidade das autodeclarações. Ele garantiu que os fazendeiros não receberão um “cheque embranco ”, eque quem agir de má-fé sofrerá as consequências previstas na legislação.

O ministro esclareceu ainda que os critérios para que o proprietário rural possa obter licença mediante uma autodeclaração não foram definidos. Salles afirmou que entre as prioridades de sua gestão estão a ampliação do turismo ecológico e a concessão de parques nacionais à iniciativa privada.