O globo, n. 31193, 01/01/2019. País, p. 4

 

União e austeridade

Jussara Soares

André de Souza

Jailton de Carvalho

01/01/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Na posse, Bolsonaro deve explorar combate à corrupção e enxugamento da máquina pública

Após encerrar uma sequência de quatro vitórias do PT nas urnas, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, fará na tarde de hoje, no primeiro discurso como chefe de Estado, um chamamento à união dos brasileiros e dirá que há esperança de dias melhores. Ele também fará defesa da austeridade na administração pública.

Quando realizar o juramento perante o Congresso Nacional, por volta de 15h, Bolsonaro se tornará o 38º presidente do Brasil. Terá sob seu comando um país com mais de 200 milhões de habitantes, brasileiros de diferentes crenças, posições políticas e visões de comportamento. Para falar a todos pela primeira vez, o presidente preparou dois textos.

O primeiro será lido na presença de deputados, senadores e presidentes dos Poderes constituídos, que farão parte da Mesa na sessão solene de posse no plenário da Câmara de Deputados. O segundo discurso será dirigido ao público, na Praça dos Três Poderes, logo após receber a faixa presidencial de seu antecessor, Michel Temer (MDB).

Os pronunciamentos foram preparados nos últimos dias pelo próprio Bolsonaro, com a ajuda do futuro ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, e dos três filhos políticos, Flávio, eleito senador pelo Rio, Eduardo, reeleito deputado por São Paulo, e Carlos, vereador no Rio de Janeiro.

Considerado o auxiliar mais próximo do novo presidente, Heleno também foi o responsável por dar forma final aos pronunciamentos de Bolsonaro logo após a vitória no segundo turno da disputa presidencial. O general ainda ajudou a escrever o discurso da cerimônia de diplomação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no dia 10 de dezembro.

Enquanto recebia familiares e apoiadores na Granja do Torto, ontem à tarde, o presidente aproveitou para fazer ajustes finais nos textos. Até o chanceler Ernesto Araújo, que comandará a política internacional, foi consultado. Uma das principais preocupações de Bolsonaro é passar uma mensagem clara à comunidade internacional, de normalidade institucional.

Promessa de campanha

De acordo com interlocutores, não há previsão de que Bolsonaro faça um pronunciamento de improviso, mesmo quando se dirigir à nação no parlatório do Palácio do Planalto. No Congresso, os presidentes eleitos costumam fazer uma exposição mais formal e política. Já ao público em geral, o tom tende a ser mais emotivo. Por outro lado, alertam auxiliares de Bolsonaro, a se julgar pelo estilo do novo presidente, não será surpresa se fugir ao roteiro que ele mesmo determinou.

O discurso, segundo integrantes da equipe de Bolsonaro, vai reforçar promessas de campanha, como a de implementar uma administração pública mais enxuta e de tolerância zero com a corrupção. O novo presidente reforçará que o Brasil está prestes a entrar em um novo tempo, deixando para trás os anos de governo de esquerda. Apesar das referências negativas ao PT, a fala terá apelos por união.

Ontem, ao visitar a Granja do Torto, o futuro ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, afirmou que o presidente eleito fará um discurso ao estilo “papo reto”, com linguagem popular que marcou sua campanha, sempre falando diretamente aos brasileiros.

— Vai ser um discurso de muita fé num Brasil que vai mudar, com muita humildade, como é o jeito dele. E aquela coisa: curto, papo reto, direto —afirmou Onyx.

De acordo com o futuro ministro, Bolsonaro “está bem, está animado, está se preparando”. Na saída, ele desceu do carro e falou com os apoiadores que estavam no local. Onyx disse que Bolsonaro desejava a eles um “2019 abençoado”.

Além de Onyx, um dos irmãos do presidente eleito, Renato Bolsonaro, falou, ontem, com simpatizantes na entrada da granja. Ele disse que toda a família —incluindo a mãe de 91 anos e os cinco irmãos de Bolsonaro — estava no local, onde passaria a virada de ano.

Queiroz "nunca foi laranja"

Ontem, em entrevista à TV Record, Bolsonaro falou sobre o caso do ex-assessor de Flávio Bolsonaro Fabrício Queiroz, que teve movimentações suspeitas de R$ 1,2 milhão identificadas pelo Coaf. O presidente eleito admitiu que era seu homem de confiança. E ressaltou que, por ora, desconhece qualquer informação comprometedora sobre sua atuação.

— Conheço o Queiroz desde 1984. Sempre gozou de toda liberdade e confiança nossa. Ele já falou claramente sobre aquela desconfiança ,‘ ah,écaixa2,é laranja ’... De mim nunca foi.

Bolsonaro falou ainda sobre depósitos feitos por Queiroz na conta da futura primeiradama Michele. E disse que, se surgirem novos fatos comprometedores, quem deve explicação é Queiroz.

—A questão da minha esposa foi uma dívida que foi se acumulando, eu cobrei dele. Foi um dinheiro que foi acumulando. Há seis, sete anos, tinha outra dívida, de R$ 20 mil. Quem nunca fez um negócio comum amigo? Não cobrei juros, não cobrei nada. Se tiver algo mais, que eu desconheça, cabe a explicação aseu Fabrício Queiroz, não cabe amim.

Na entrevista, Bolsonaro disse ainda que todos os ministros terão carta branca para nomear“desde o secretário executivo até o mais humilde funcionário". Ainda criticou indicações do governo Temer para agências reguladoras e indicou que pretende fazer mudanças nas nomeações.

Aposse de Bolsonaro foi preparada em meio a um ambiente de tensão por causa de ameaças. Ontem, enquanto a família presidencial estava na Granja do Torto, a Polícia Federal cumpriu mandados de busca e apreensão em sete endereços de integrantes de um grupo batizado de “Maldição Ancestral”, que seria composto por suspeitos de difundir, pela internet, ameaças contra Bolsonaro. A PF fez buscas em São Paulo, Goiás e no Distrito Federal.