Título: Dilma quer empregos
Autor: Hessel , Rosana
Fonte: Correio Braziliense, 28/07/2012, Economia, p. 14
Isso não diz respeito apenas às montadoras. Todos os setores que receberem incentivos do governo têm que saber que queremos resultados. É isso que garante o emprego e a geração de renda ao povo brasileiro" Dilma Rousseff, presidente do Brasil, que se encontrou ontem com a rainha Elizabeth II, em Londres
Londres e Brasília — A presidente Dilma Rousseff mandou ontem um recado claro às montadoras de automóveis, que estão demitindo trabalhadores apesar de terem recebido ajuda bilionária do governo em forma de corte de impostos. Na sua avaliação, é inadmissível que as empresas, qualquer que seja o setor em que atuem, descumpram o acordo fechado com o Ministério da Fazenda de manterem postos de trabalho para terem acesso a incentivos. O recado de Dilma teve um alvo certo: a General Motors (GM), que decidiu colocar 1,5 mil funcionários na rua. Eles trabalham na fábrica de São José dos Campos, São Paulo.
"Isso não diz respeito apenas às montadoras. Todos os setores que receberem incentivos do governo têm que saber que queremos resultados. É isso que garante o emprego e a geração de renda ao povo brasileiro", afirmou Dilma. Para mostrar que não tolerará abusos — somente neste ano, pelas contas da Fazenda, os incentivos fiscais vão custar R$ 48 bilhões aos cofres públicos — o governo ameaça suspender a redução do IPI (Imposto sobre Produto Industrializado) de carros, caso as montadoras insistam em fechar postos de trabalho. "A manutenção do emprego é o único motivo pelo qual existe o incentivo", declarou.
Contraponto O recado de Dilma soou pesado entre a indústria automobilística. Tanto que a Associação Nacional dos Fabricantes dos Veículos Automotores (Anfavea) tratou de divulgar números para comprovar que está seguindo à risca o que determinou o governo. A entidade assegurou que, com a redução do IPI, os preços médios dos veículos caíram 10%. Ressaltou ainda que as suas 26 associadas vêm mantendo o quadro de funcionários estável, acima de 145 mil. Em junho de 2011, empregavam 142,8 mil trabalhadores. No mês passado, eram 146,9 mil.
O corte do IPI tem ajudado as empresas a reduzir os estoques de carros que encalharam diante do arrocho dado pelo Banco Central no fim de 2010, para evitar uma bolha no financiamento do setor. O BC identificou um aumento acelerado na inadimplência do crédito para a compra de automóveis, boa parte deles vendidos em até 99 meses. Muitas pessoas se entusiasmaram com o baixo valor das prestações, mas, ao longo do tempo, perceberam que os gastos com um veículo vão muito além dos carnês.
Desde o início da semana, o governo já havia identificado problemas na GM. Tanto que mandou Manoel Messias Melo, secretário do Ministério do Trabalho, ir a São José dos Campos para intermediar as negociações sobre o futuro dos 1,5 mil operários do complexo de oito fábricas do Vale do Paraíba que emprega 7,2 mil pessoas. A General Motors pretende desativar as linhas de produção de três modelos ultrapassados (Meriva, Zafira e Corsa) e manter apenas a montagem do sedã Classic. "A reunião foi tensa, com troca de acusações", contou Messias. "O interesse do governo é que os empregos sejam preservados e a empresa mantenha os investimentos", destacou.
Para Luiz Carlos Prates Mancha, secretário-geral do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, as demissões são inaceitáveis. "A GM já demitiu, de outubro de 2011 até agora, 1,4 mil pessoas só na unidade de São José dos Campos. Agora, quer fechar toda a planta. E isso, num ambiente de vendas em alta", assinalou.
Crescimento Apesar do descontentamento com as montadoras, a presidente Dilma garantiu que o governo continuará dando incentivos ao setor produtivo, para que os investimentos minimizem os impactos da crise mundial no país, a começar pelo corte de impostos sobre a energia elétrica, que ficará ao menos 10% mais barata. Ela disse que o país está "segurando um nível de crescimento bastante significativo, considerando a situação internacional" e usará medidas "contracíclicas" em agosto e setembro para garantir um ambiente muito diferente do verificado na Inglaterra, que está em recessão.
"A diferença do Brasil para o Reino Unido é que temos uma situação fiscal e bancária diferenciada. O Brasil fez seu dever de casa, até porque aprendeu com as crises que tivemos", afirmou Dilma. Segundo ela, "o Brasil não é uma ilha. Todos os países vêm sendo afetados pela crise. A redução do crescimento da China criou um impacto no Brasil, na Índia, na África do Sul".