Correio braziliense, n. 20315, 03/01/2019. Política, p. 4  

 

Troca de afagos na transmissão de cargos

Leonardo Cavalcanti e Gabriela Vinhal

03/01/2019

 

 

NOVO GOVERNO » Presidente participa de posse dos colaboradores mais próximos do Planalto. Transição alia ministros que saem dos que chegam. Heleno critica Dilma

A transferência de cargos do Executivo da gestão do emedebista Michel Temer para os ministros palacianos que atuam próximo ao presidente Jair Bolsonaro pareceu uma continuidade de governo. Os próprios ministros não sabiam, ao certo, se estavam entrando ou saindo. O principal motivo para o ambiente ameno foi o período de transição, que teve início no fim do segundo turno até o começo de dezembro. Segundo interlocutores do atual governo, tudo transcorreu da “melhor forma possível”.

Um dia depois de tomar posse na Praça dos Três Poderes, a agenda de Bolsonaro foi marcada pelas solenidades de transmissão de cargos no Planalto. Os ministros da Secretaria de Segurança Institucional, General Heleno; da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gustavo Bebianno; da Casa Civil, Onyx Lorenzoni; e da Secretaria de Governo, Carlos Alberto dos Santos Cruz, foram oficializados nos postos, em uma cerimônia no Palácio do Planalto.

O ministro-chefe da Secretaria-Geral do governo Temer, Ronaldo Fonseca, antes de passar o cargo a Bebianno, não poupou elogios ao projeto elaborado por Bolsonaro. Disse que o Brasil não será decepcionado. “Eu até queria fazer continência para Vossa Excelência”, brincou. No fim do discurso, incentivou o sucessor a dar continuidade ao trabalho e enalteceu a atuação dele na campanha presidencial. “Acredito que (Bebbiano) fará melhor do que fiz. Até ouvi certa crítica de que o ministro não sabia fazer política, mas ele ganhou uma eleição. Se isso não é saber fazer política...”, cutucou.

Atribuindo a vitória de Bolsonaro nas urnas à vontade de mudança e ao apego de valores e ética dos brasileiros, o ex-ministro do GSI, Sérgio Etchegoyen, declarou torcer pelo sucesso de General Heleno à frente da pasta. “Meu estimado amigo Heleno, que a jornada que o espera lhe traga realizações e alegrias, como as que deixo a minha posição nesse momento”, disse. O General Heleno, por sua vez, elogiou a passagem “primorosa” de Etchegoyen e a organização “brilhante” da posse de Bolsonaro.

“Tenho um trabalho duro pela frente, todos nós sabemos isso. Mas temos a ventura de estarmos integrados a uma equipe excepcional, que manifestou união em torno de um trabalho muito sério, que será penoso, mas tenho certeza que nos conduzirá a um novo destino”, declarou. Ele agradeceu a oportunidade de estar à frente do cargo e criticou a ex-presidente Dilma Rousseff. “O sistema (de inteligência) foi recuperado pelo general Etchegoyen e foi derretido pela senhora Rousseff, que não acreditava em inteligência”, declarou Heleno.

Ao deixar o cargo de ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha elogiou a transição dos governos. “Em determinado momento, não se sabia quem estava saindo e estava entrando”, disse Padilha ao transmitir o cargo para Lorenzoni. “Desejo ao ministro Onyx toda a sorte, mais sorte do que tivemos, pois há uma expectativa enorme em relação ao novo governo”, afirmou. Onyx, por sua vez, também fez referência a Padilha. “Quero fazer justiça a todos a equipe do Planalto pela correção que tiveram ao longo de todo esse processo”.

Em tom messiânico, acrescentou que “muitos são chamados, poucos escolhidos”. “O presidente Jair Bolsonaro foi chamado por Deus e escolhido pelo povo.” Por fim, falou que o governo não pode errar. “Vamos fazer desse país uma grande nação”, disse.

 

Quem são os ministros “da casa"

Onyx Lorenzoni, Casa Civil

No discurso de transmissão de cargo, o novo ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, usou um tom messiânico, dizendo que “muitos são chamados, poucos escolhidos”. “O presidente Jair Bolsonaro foi chamado por Deus e escolhido pelo povo.” Em determinado momento, foi mais realista: “O governo não pode errar. Vamos fazer desse país uma grande nação. Isso começou de um sonho de alguém que disse que era um mito, Jair Messias Bolsonaro”.

Nascido em Porto Alegre há 64 anos, Onyx é formado em veterinária pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). É considerado do baixo clero, mas com bom trânsito político. Desde o primeiro mandato como deputado, em 2003, sempre esteve na lista dos 100 parlamentares mais influentes do Congresso Nacional. Amigo de primeira hora de Bolsonaro, ele lembrou, no discurso de ontem, o atentado sofrido pelo então candidato ao Planalto, em setembro, em Juiz de Fora (MG). “Não sabíamos que iríamos passar o que passamos em Juiz de Fora. Mas recebemos um papel em branco. A nossa missão é, a partir de agora, ter bons ouvidos.”

 

Augusto Heleno, Gabinete de Segurança Institucional (GSI)

Durante a cerimônia de transferência de cargo, que era ocupado pelo general Sérgio Etchegoyen, o também general Augusto Heleno fez questão de demonstrar gratidão e afeto ao presidente eleito, elogiar a gestão do ex-ministro de Michel Temer e cutucar o PT com críticas abertas à ex-presidente Dilma Rousseff. Ele afirmou que a petista “derreteu” o sistema de inteligência do país, porque “não acreditava” em inteligência. Foi bastante aplaudido.

No discurso, o novo ministro prometeu levar informações qualificadas ao chefe de Estado e fazer um trabalho primoroso na área de inteligência do Planalto. O general Augusto Heleno é amigo pessoal do presidente Jair Bolsonaro há 45 anos. Militar de grande prestígio, entre outras missões importantes, comandou a força de paz da Organização das Nações Unidas (ONU) no Haiti. Durante a campanha eleitoral, foi considerado o “vice dos sonhos” da chapa do PSL, mas, por questões internas, acabou ficando fora do pleito. No entanto, assim que foi eleito, Bolsonaro deu a ele carta branca para que escolhesse qual pasta do primeiro escalão gostaria de comandar.

 

Carlos Alberto dos Santos Cruz, Secretaria de Governo

Ao tomar posse, Carlos Alberto dos Santos Cruz, 66 anos, afirmou que a Secretaria de Governo estará aberta a todos os grupos e organizações sociais. “Seremos um ponto de entrada para todos, procurando a harmonia de governo, e, assim, agradeço a confiança do presidente Bolsonaro”. General de divisão, na reserva do Exército, ele foi comandante das forças das Nações Unidas (ONU) no Haiti e no Congo, além de ter ocupado, em 2017, a chefia da Secretaria Nacional de Segurança Pública. Ao passar o cargo para Santos Cruz, o agora conselheiro da Itaipu Binacional Carlos Marun (MDB) elogiou o ex-presidente Michel Temer. “Enfrentamos tempos de tempestades, perseguições, mas aprendemos a navegar na tempestade. E saímos com a sensação de vitória”, disse Marun. Um dos ministros mais próximos de Bolsonaro, Santos Cruz será homem-forte do novo governo. Em entrevista ao Correio, publicada no último domingo, ele criticou a corrupção no serviço público. “A sociedade cansou da corrupção. O crime organizado no Rio de Janeiro começava no Palácio da Guanabara.”

 

Gustavo Bebianno, Secretaria-Geral

Figura fundamental na vitória de Jair Bolsonaro nas urnas, o advogado Gustavo Bebianno é conselheiro e uma das pessoas mais próximas ao presidente. Foi ele o responsável por procurar um partido para lançar o amigo como candidato ao Planalto. Ao receber o cargo do ex-ministro Ronaldo Fonseca, Bebianno elogiou o projeto de Bolsonaro para o país, disse esperar que o novo governo entre para a história do Brasil e desejou que o amor à pátria seja resgatado, longe das “garras destrutivas da mentalidade bolivariana que insiste em ameaçar nações da América do Sul”. Natural do Rio de Janeiro, Bebianno ocupou a presidência do PSL — cargo que deixou um dia depois do resultado do segundo turno. Admirador de Bolsonaro, chamado por ele de “capitão”, o ministro ressaltou a qualidade da equipe formada pelo presidente e disse ver o crescimento do país atrelado às políticas liberais do ministro da Economia, Paulo Guedes. Chegou a se emocionar quando citou a facada desferida contra Bolsonaro durante a campanha, que classificou como um “atentado contra a vida” dele e “contra a democracia”