Título: Alerta contra Chávez
Autor: Luna, Thais de
Fonte: Correio Braziliense, 18/07/2012, Mundo, p. 16

A três meses da eleição presidencial, relatório da Human Rights Watch aponta risco para os pilares da democracia na Venezuela. Constrangimentos à Justiça, ameaças à imprensa e perseguição a opositores mostrariam que o regime %u201Cestá se tornando ditatorial%u201D

Menos de três meses antes da eleição presidencial na Venezuela, a organização não governamental Human Rights Watch (HRW) divulgou ontem um relatório advertindo sobre concentração e abusos de poder do presidente Hugo Chávez, candidato a mais um mandato. O texto, de 133 páginas, detalha como a máquina pública tem sido usada pelo chefe de Estado para ampliar seus poderes, censurar a imprensa e punir quem interferir com sua agenda política. Até o fechamento desta edição, o governo venezuelano não havia se pronunciado diretamente sobre as denúncias, mas Chávez fez uma possível menção ao informe no microblog Twitter. Depois de anunciar a assinatura de um "compromisso pela democracia", o governante conclamou "todos os venezuelanos" a respeitarem "o árbitro eleitoral, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) e as nossas instituições democráticas".

Na avaliação da HRW, porém, as ações de Chávez minam alguns pilares da democracia, como a independência da Justiça e a liberdade de imprensa. "A perspectiva de enfrentar represálias minou a capacidade dos juízes de julgarem casos politicamente sensíveis. Além disso, os jornalistas e defensores de direitos são forçados a pesar a consequência de divulgar informações e opiniões críticas ao governo", disse ao Correio José Miguel Vivanco, diretor da divisão da HRW para as Américas. O relatório Apertando o cerco: concentração e abuso de poder na Venezuela de Chávez tem três pontos-chaves: os tribunais, a mídia e os defensores dos direitos humanos.

Quanto aos meios de comunicação, a HRW alerta que a mudança da Lei da Radiodifusão, em 2010, restringiu a imprensa, proibida de veicular mensagens "que alimentem a ansiedade entre o público". A Comissão Nacional de Telecomunicações (Conatel) obteve mais poder para sancionar as emissoras de televisão e rádio e os sites que violem a lei. Além disso, grande parte dos meios passou a ser controlada pelo governo, como 200 emissoras de rádio que se tornaram afiliadas do Movimento Nacional de Mídia Alternativa e Comunitária, leal à "revolução bolivariana" de Chávez. Exemplos de manipulação e censura, porém, datam de 2007, quando a mais antiga emissora de tevê do país, a RCTV, teve negada a renovação de sua licença, meses após ter mostrado um vídeo no qual o ministro de Energia dizia aos funcionários da companhia estatal de petróleo que deveriam pedir demissão, se não apoiassem Chávez.

Em relação à Justiça, o relatório destaca que, em 2004, a maioria chavista na Assembleia Nacional aprovou uma lei que permitiu o ingresso de 12 aliados do governo na Suprema Corte, aumentando o número de membros de 20 para 32. "Juízes da Suprema Corte se comprometem publicamente a avançar a agenda política de Chávez", comentou Vivanco. Os que resistem podem ser detidos, como foi o caso de Maria Lourdes Afiuni, em prisão domiciliar desde fevereiro de 2011. Para a pesquisadora de Direitos Humanos Rhoda Howard-Hassmann, da Universidade Wilfrid Laurier (Canadá), ações como essa mostram que o governo de Chávez está se tornando ditatorial. "Ele está desgastando todos os direitos civis e políticos", adverte.

Eleição

Miguel Tinker Salas, professor de Estudos Latino-Americanos no Pomona College, em Claremont (EUA), afirmou não estar surpreso com a divulgação do relatório em plena campanha para o primeiro turno da eleição, marcado para 7 de outubro. "É óbvio que eles esperam influenciar o debate. Embora eu espere que a oposição tente usar o texto, duvido que o material tenha impacto na votação", salientou. Uma pesquisa divulgada na segunda-feira pelo instituto Datanalisis mostra o atual presidente com 46,1% das intenções de voto, 15 pontos acima do candidato único da oposição, Henrique Carpiles Radonski. A diferença se mantém estável em comparação com a sondagem anterior.

Trechos

Juízes sob pressão

Em 10 de dezembro de 2009, a juíza María Lourdes Afiuni foi presa após ter autorizado a libertação condicional de Eligio Cedeño — um proeminente crítico do presidente Chávez —, que estava na prisão havia quase três anos, aguardando julgamento por acusações de corrupção. (...) Afiuni foi presa sob a acusação de ter cometido um crime ao garantir liberdade condicional a Cedeno. No dia seguinte, o presidente Chávez denunciou a juíza como uma "bandida", na televisão nacional, e pediu para ela ser condenada a 30 anos de prisão, a pena máxima na Venezuela.

Autocensura

De acordo com Nelson Belfort, presidente da Câmara de Estações de Rádio entre 2007 e 2011, a maioria das emissoras de rádio privadas do país tem substituído programas de opinião por música ou entretenimento, desde o fechamento de 32 estações, em 2009. A organização não governamental Provea documentou, no relatório anual de 2011, que "mais e mais meios impõem a autocensura e poucos mantêm posições críticas às ações do governo, comportamento motivado pelo desejo de evitar o fechamento temporário ou permanente e milhões de dólares em multas".

Acesso a dados oficiais

Em dezembro de 2010, a administração de Chávez promulgou regras que exigem que todos os escritórios do governo tratem de forma confidencial (...) "qualquer informação sensível que, se conhecida e tornada pública para pessoas não autorizadas, pode causar danos à instituição". (...) Com base na análise de 61 pedidos de informação para diversos escritórios do governo, entre agosto e outubro de 2011, organizações não governamentais registraram que não foi possível obter informação em 85,2% dos casos.

Direitos humanos

As autoridades venezuelanas devem reconhecer a jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e adotar todas as medidas necessárias para cumprir e implementar suas decisões; permitir que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos faça pesquisas na Venezuela; e acabar com sua campanha internacional para minar a independência, a autonomia e os poderes da CIDH.