O Estado de São Paulo, n.45728 , 29/12/2018. Política, p.A4

Bolsonaro e Netanyahu selam aproximação no Rio

Vinicius Neder 

Marcio Dolzan 

Fábio Grellet

 

 

No primeiro movimento claro da mudança de política externa do futuro governo Jair Bolsonaro, o presidente eleito se encontrou ontem no Rio com o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu. Na campanha, o futuro presidente prometeu a mudança da embaixada brasileira de Tel-Aviv para Jerusalém, o que aproximou os dois líderes. Ontem, contudo, nenhum anúncio público foi feito neste sentido.

É a primeira visita de um premiê israelense em exercício ao País desde a fundação do Estado judeu, em 1948. Netanyahu chegou no fim da manhã e foi recebido pelo futuro chanceler, Ernesto Araújo, e o deputado federal reeleito e filho de Bolsonaro, Eduardo. Logo após a chegada, ele almoçou e se reuniu com Bolsonaro no Forte de Copacabana, na zona sul do Rio.

Em pronunciamento conjunto após o almoço, Bolsonaro disse que Brasil e Israel, mais do que parceiros, são “irmãos no futuro, na economia, em tecnologia, em tudo aquilo que possa trazer benefícios para os dois países”. Netanyahu agradeceu pela “gentilíssima recepção”. “Israel é a terra prometida. E o Brasil é terra da promessa (para o futuro)”, afirmou o premiê.

A última vez que Bolsonaro prometeu a mudança da embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, num ato de reconhecimento da cidade sagrada como capital israelense, foi em 1.º de novembro, pelo Twitter: “Como afirmado durante a campanha, pretendemos transferir a Embaixada do Brasil de Tel-Aviv para Jerusalém. Israel é um Estado soberano e nós o respeitamos”.

O premiê não quer somente a mudança da embaixada. De acordo com a imprensa israelense, Netanyahu está interessado numa “mudança no padrão” de votação do Brasil em organismos internacionais. O governo israelense avalia que o País, frequentemente, toma posições diplomáticas a favor da Palestina e, às vezes, a favor do Irã. Países árabes já sinalizaram que poderão retaliar comercialmente o Brasil se as mudanças se concretizarem.

Segundo o primeiro-ministro, a cooperação entre os dois países poderá trazer “benefícios tremendos aos dois povos, na economia, no emprego, na segurança, na agricultura, recursos hídricos, na indústria”. “Convidei o presidente Bolsonaro para visitar Israel, e ele aceitou. Ele será bem-vindo como um grande amigo, um grande aliado, um irmão.” Bolsonaro respondeu dizendo que pretendia visitar Israel até março, com “uma comitiva de vários setores da sociedade”.

Netanyahu chegou a cogitar a possibilidade de retornar a Israel amanhã, a fim de iniciar as negociações políticas para a formação de uma nova coalizão do governo, após perder apoio em meio a uma crise política (mais informações nesta página), mas confirmou presença na posse.

Sinagoga. Após o almoço, os dois seguiram para uma sinagoga em Copacabana. Na chegada, foram ovacionados – o brasileiro, aos gritos de “mito”; o israelense, aos gritos de “Bibi”, apelido pelo qual é conhecido. Na sinagoga, Bolsonaro, que vestia o quipá, elogiou Israel. “Sempre citava o exemplo de Israel e dizia: ‘Olha o que eles não têm e veja o que eles são; olhem para o Brasil, vejam o que nós temos e o que nós não somos.”

RELAÇÃO

 

Palestina

Em agosto, Bolsonaro anunciou que, se eleito, retiraria a embaixada da Palestina do Brasil.

Viagem

No dia seguinte à eleição, em outubro, afirmou que Israel seria um dos destinos escolhidos para sua primeira viagem internacional como presidente do Brasil.

Jerusalém

Confirmou, no início de novembro, que pretende transferir a embaixada brasileira em Israel, de Tel-Aviv para Jerusalém.

Parceria

Em 25 de novembro disse que o ministro de Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, visitará instalações de dessalinização, plantações e escritório em Israel.

PARA LEMBRAR

 

Premiê vive crise em Israel

O premiê de Israel Binyamin Netanyahu vive uma das mais graves crises do seu governo. No começo de dezembro, ele foi denunciado por corrupção pela terceira vez em sua gestão. As acusações citam recebimento de propina, fraude e quebra de decoro. Em uma delas, o primeiro-ministro é acusado de tentar subornar o editor do jornal Yedioth Ahronoth para que o governo recebesse uma cobertura favorável.

Netanyahu é investigado também por suspeitas de que ele e sua família receberam presentes no valor de US$ 300 mil de um produtor de Hollywood e de um multimilionário australiano em troca de benefícios. Sua mulher, Sara, é julgada por fraude e quebra de confiança por empregar com dinheiro público cozinheiros de luxo. E seu filho mais velho foi banido do Facebook por propagar discurso de ódio contra palestinos e muçulmanos.

O premiê ainda perdeu parte de sua base aliada por divergências sobre a estratégia usada na repressão em Gaza e para lidar com as ameaças iranianas.