Correio braziliense, n. 20346, 03/02/2019. Política, p. 2
Davi derrota Renan e promete reformas
Rosana Hessel
03/02/2019
NOVO GOVERNO » Depois de dois dias de muita confusão e suspeita de fraude, Alcolumbre é eleito presidente do Senado com 42 votos. Apoiado pelo chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, o parlamentar se mostra alinhado com o Planalto
O MDB está completamente fora do comando das duas Casas do Congresso pela primeira vez desde a redemocratização. Isso não foi fácil. Depois de dois dias de votação e muita confusão, com votos triturados e quatro desistências no meio do caminho, o Senado elegeu, ontem, o novo presidente da Casa até 2020. O senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) venceu a disputa em primeiro turno, com 42 votos, um a mais do que o necessário para assumir o comando da 56ª Legislatura.
A corrida, pela manhã, parecia de cartas marcadas para a vitória de Renan Calheiros (MDB), após a decisão, em plena madrugada, do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, de impedir o voto aberto na eleição, como havia sido aprovado na véspera. Contudo, houve confusão e suspeita de fraude na primeira votação, após vários parlamentares decidirem mostrar os votos nas cédulas, e na contagem da urna, aparecerem 82 votos, quando existem 81 senadores.
O debate ficou acalorado. O senador José Maranhão (MDB-PB), que presidia a sessão, atendeu aos protestos, decidiu triturar os votos e reiniciou todo o processo. Três dos nove senadores que concorriam à Presidência renunciaram durante a fase dos discursos: Álvaro Dias (Podemos-PR), Major Olímpio (PSL-SP) e Simone Tebet (MDB-MS), que lançou candidatura avulsa para fazer frente ao companheiro de partido e acabou desistindo rapidamente após pedido feito por Alcolumbre na tribuna. A senadora foi importante na construção da vitória do democrata por ser protagonista do racha no MDB.
A segunda votação foi mortal para Renan. Isso porque os parlamentares do PSDB resolveram abrir os votos de toda a bancada em Davi Alcolumbre, em uma articulação do tucano Tasso Jereissati (CE), que deixou de concorrer para favorecer o democrata. E, para completar, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro, também abriu o voto em Alcolumbre, apoiado desde o início pelo ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.
Foi a gota d’água. Renan subiu na tribuna e anunciou que estava fora da disputa. “Para demonstrar que esse processo não é democrático, eu queria dizer que Davi (Alcolumbre) não é o Davi. É o Golias. Ele é o novo presidente do Senado. Eu retiro a minha candidatura, porque eu não vou me submeter a isso”, disse Renan, acrescentando que não é Jean Wyllys (do PSol-RJ) para desistir do mandato.
O emedebista afirmou que fará forte oposição ao governo Bolsonaro. Ao deixar o plenário, queixou-se da falta de lisura do processo. “Na primeira votação, houve um equívoco, um voto a mais, e, por conta disso, abriram o voto do PSDB para inibir quatro possibilidades que a gente tinha. Qual é a lisura e o respeito à transparência desse processo eleitoral?”, questionou. Para Renan, a votação foi “deslegitimada” e a “democracia não aguenta” o que ele chamou de “atropelo do Congresso”. “O próximo passo é o Supremo, e não vai precisar do carro e nem do sargento”, afirmou.
À medida que a tensão de Renan crescia, a de Alcolumbre diminuía durante a sessão. Um comportamento totalmente diferente da noite anterior, quando o democrata deixou o plenário acusado de “tratorar” os colegas. O emedebista, que chegou sorridente, cumprimentando todos os presentes, ficou sabendo do resultado em casa. Ele teve apenas cinco votos. Já Alcolumbre procurou fazer um discurso após a vitória bem ameno, elogiando os pares e defendendo o fim do revanchismo. “Os meus adversários terão, todos eles, de minha parte, disposição para o diálogo e a mais ampla cooperação. E também terão a minha deferência para a construção de um novo Senado, com os ânimos serenados e voltados ao bem comum”, disse. Ele defendeu a reunificação da Casa. “Não tenho inimigos na política, a condição de adversário é passageira, e permanentes são as instituições. E devemos, portanto, todos nós, unidos, trabalharmos pelo nosso país”, afirmou. Ele também agradeceu o principal rival. “Quero dizer ao senador Renan Calheiros que ele terá desta presidência o mesmo tratamento que todos os partidos devem ter”, disse.
Alcolumbre ainda garantiu que situação e oposição terão o “mais amplo respeito”. “As prerrogativas republicanas dos parlamentares e seu exercício com a retidão moral é assunto do qual não me desviarei e defenderei com intransigência”, disse. Pode ser a chance de o MDB salvar algum cargo nessa nova Legislatura. Ainda falta a definição dos demais cargos da Mesa Diretora, que serão negociados ao longo dos próximos dias.