O globo, n. 31228, 05/02/2019. País, p. 6

 

STF remete investigações contra Temer à 1ª instância

Carolina Brígido

05/02/2019

 

 

Suspeita sobre decreto dos Portos estará sob responsabilidade da Justiça Federal em Brasília; caso JBS tem destino indefinido

O Supremo Tribunal Federal (STF) enviou à primeira instância do Judiciário os quatro inquéritos abertos na Corte para investigar o ex-presidente Michel Temer. Uma investigação, relativa ao decreto dos portos, foi remetida ontem. As outras três foram despachadas na última sexta-feira. Sem mandado desde 1º de janeiro, Temer não tem mais direito ao foro privilegiado.

O emedebista já foi denunciado em três dessas investigações. Amais recente contra Temer foi apresentada pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, no dia 19 de dezembro, quando começou o recesso do STF. Temer é investigado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, suspeito de ter recebido propina em troca de beneficiar indevidamente empresas do setor portuário. O caso foi enviado para a 10ª Vara Federal de Brasília.

Nesta denúncia, há pedido de prisão do ex-presidente e do coronel aposentado da PM João Baptista Lima Filho, amigo de Temer. Essa decisão caberá ao juiz da primeira instância. “Apesar da gravidade dos fatos narrados, não cabe mais a este Relator decidir sobre os pedidos de prisão preventiva”, escreveu o ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso no STF.

Dodge solicitou que esta investigação seja subdivida. Uma parte, que diz respeito a suspeitas levantadas pelo delator José Antunes Sobrinho, exsócio da Engevix, deve ser remetida ao Rio. Antunes diz ter pago R$ 1,1 milhão, em 2014, solicitados por Lima e pelo exministro Moreira Franco, com anuência de Temer.

JBS sob análise de Dodge

Os outros três inquéritos estavam sob a relatoria do ministro Edson Fachin e também foram enviados à primeira instância. Uma das investigações tem origem nas delações de executivos do grupo J&F, dono da JBS. Em junho de 2017, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, acusou Temer de corrupção passiva, juntamente com o ex-assessor Rodrigo Rochas Loures. Fachin pediu à Dodge que se manifeste sobre o destino para este inquérito.

O presidente é suspeito de ter recebido R$ 500 mil em propina, além de ter aceitado promessa de vantagem indevida no montante de R$ 38 milhões, usando seu ex-assessor, Rodrigo Rocha Loures, como intermediário. Na época Janot solicitou ainda que Temer fosse condenado a pagar uma indenização por danos morais no valor de R$ 10 milhões. Foi a primeira vez que um presidente foi denunciado por crime cometido durante o governo.

Na segunda denúncia, de setembro de 2017, Janot acusou Temer de ser o líder de uma organização criminosa que recebeu subornos de R$ 587 milhões por atuações na Petrobras, Furnas, Caixa Econômica Federal, Ministério da Integração Nacional e Câmara dos Deputados.

No mesmo documento, o ex-procurador-geral denunciou o presidente por obstrução de justiça, uma vez ele teria dado aval para o empresário Joesley Batista, dono da JBS, comprar o silêncio do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha e do doleiro Lúcio Funaro, apontado como operador de esquemas do MDB da Câmara. Essas duas denúncias ficaram paralisadas no STF porque o plenário da Câmara não permitiu o prosseguimento das investigações.

Um outro inquérito não foi alvo de denúncia. Executivos da Odebrecht afirmaram, em delação, que houve um acerto de R$ 10 milhões entre Temer e a empreiteira. O dinheiro seria destinado à cúpula do MDB. A Polícia Federal encontrou indícios de que o presidente cometeu os crimes corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Temer teria recebido, por meio do coronel Lima, R$ 1,4 milhão da Odebrecht. Este caso foi remetido à Justiça Eleitoral de São Paulo.

Em documento, Dodge afirmou que os pagamentos da empreiteira configuraram crime de corrupção, e não caixa dois, por isso o caso deveria ir para a Justiça Federal e não para a Eleitoral.

Reiteradamente, as defesas do ex-presidente e do coronel Lima têm negado qualquer recebimento de vantagem ilícita. Procurada para falar a respeito da remessa das investigações para a primeira instância, a defesa de Temer não quis se pronunciar.