O Estado de São Paulo, n. 45752, 22/01/2019. Política, p. A6

 

Comprador diz ter pago parte de imóvel em dinheiro vivo

Fabio Leite

22/01/2019

 

 

Segundo Fábio Guerra, Flávio Bolsonaro recebeu R$ 100 mil para completar pagamento; ‘JN’ diz que datas de depósitos não coincidem

O ex-jogador de vôlei de praia Fábio Guerra afirmou ontem ter pago cerca de R$ 100 mil em dinheiro ao senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) para quitar parte da compra de um apartamento na zona sul do Rio de Janeiro, em 2017. A declaração coincide com a versão dada anteontem pelo filho do presidente Jair Bolsonaro sobre os depósitos fracionados em sua conta bancária que levantaram suspeita do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

Um relatório do Coaf identificou como movimentação atípica na conta de Flávio 48 depósitos de R$ 2 mil feitos entre junho e julho de 2017 em um caixa eletrônico dentro da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), onde Flávio exercia seu quarto mandato consecutivo como deputado estadual. Os depósitos somaram R$ 96 mil.

No domingo, um dia depois de visitar seu pai na Granja do Torto, residência oficial do presidente, o senador eleito afirmou em entrevista às emissoras TV Record e RedeTV! que ele mesmo fez os depósitos em sua conta e que o valor era referente à parte do pagamento que recebeu em dinheiro vivo pela venda de um imóvel.

Ontem, o Jornal Nacional, da TV Globo, divulgou que, segundo a escritura do imóvel, a venda do apartamento de Flávio no bairro de Laranjeiras envolveu uma permuta por outros dois imóveis, uma sala comercial na Barra da Tijuca e um apartamento na Urca, avaliado em R$ 1,5 milhão, além do pagamento de R$ 600 mil.

Segundo a reportagem, R$ 50 mil foram pagos com cheques no mês de agosto de 2017, e os outros R$ 550 mil foram pagos em março daquele ano, ou seja, três meses antes dos depósitos relatados por Flávio Bolsonaro em sua conta – e considerados atípicos pelo Coaf. O apartamento havia sido comprado na planta por ele pelo valor de R$ 1,7 milhão e foi vendido a Fábio Guerra por R$ 2,4 milhões. Em maio de 2018, Flávio vendeu o apartamento da Urca para a advogada Cláudia Soares Moura por R$ 1,1 milhão.

Ao Estado, Guerra afirmou ter pago cerca de R$ 100 mil em dinheiro ao senador eleito, mas não deu mais detalhes da transação do imóvel. Em nota, o advogado Antonio Carlos Marques Fernandes, contratado pelo exatleta à época do negócio, afirmou que “tudo foi feito de forma transparente e dentro do que determina a lei”.

Ainda segundo o advogado, “as especulações que são feitas (sobre a transação imobiliária) são abusivas, uma vez que a operação imobiliária foi registra em todos os órgãos de controle, respeitando todos os preceitos legais e fiscais e que os valores pagos e depositados pelo Fábio Guerra foram registrados em cartório e com seus impostos devidamente recolhidos”.

Investigação. O relatório do Coaf foi anexado pelo Ministério Público do Rio ao inquérito que investiga suspeita de devolução de parte de salário de assessores dentro do gabinete de Flávio Bolsonaro, prática conhecida como “rachid”. Entre os investigados está o ex-assessor Fabrício Queiroz, que movimentou R$ 1,2 milhão em transações suspeitas entre janeiro de 2016 e janeiro de 2017, como revelou o Estado em dezembro. No domingo, o jornal O Globo mostrou que a movimentação financeira considerada atípica pela Coaf nas contas de Queiroz alcançou R$ 7 milhões entre os anos de 2014 e 2017.

‘Plausível’. O senador eleito disse que seu ex-assessor apresentou uma explicação “plausível” para a movimentação bancária e afirmou que está sendo perseguido politicamente por promotores com o intuito de atingirem o governo Bolsonaro. Na semana passada, ele conseguiu suspender liminarmente a investigação no Supremo Tribunal Federal (STF) alegando que o MP do Rio não tem competência para investigar um senador eleito. O caso será analisado pelo ministro Marco Aurélio Mello, relator do processo.

Nas eleições de 2018, Flávio declarou possuir R$ 1,7 milhão em bens, entre os quais um apartamento de R$ 917 mil, uma sala comercial de R$ 150 mil, e 50% de uma loja de chocolate, todos na Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio. Ele afirma que todos os bens foram adquiridos de forma lícita.

Ex-jogador de vôlei virou investidor

Hoje investidor imobiliário, Fábio Guerra foi jogador de vôlei de praia de pouca expressão. Um dos parceiros com quem formou dupla é Rhooney de Oliveira Ferramenta. Juntos, disputaram em 2009 o Circuito Banco do Brasil, como era chamado o principal torneio nacional. A dupla ficou em 5º lugar e, no ano seguinte, se desfez. Guerra disputou vários torneios intermediários, entre eles o que corresponde à segunda divisão do vôlei de praia brasileiro. Segundo a Confederação Brasileira de Vôlei (CBV), ele se aposentou em 2016