Título: Dilma numa sinuca de bico
Autor: Martins , Victor
Fonte: Correio Braziliense, 05/08/2012, Economia, p. 15

Enquanto tenta aquecer a economia, a presidente Dilma Rousseff amarga uma coleção de decepções: as medidas de estímulo ao consumo não conseguem impulsionar o crescimento, a arrecadação encolhe e os servidores públicos, em greve, têm impedido ou retardado o embarque de exportações e derrubado a já combalida balança comercial. Sem outra opção, a equipe econômica de Dilma começa a pensar na possibilidade de abrir mão da "meta cheia" de superavit primário (poupança para pagar os juros da dívida), estipulada em 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB, a soma das riquezas do país) — dinheiro que, em vez de ser usado como caixa, deverá ser destinado a aumentar o volume de investimentos, sobretudo os do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Essa estratégia, porém, pode colocar em xeque a credibilidade do governo perante o mercado e obrigar o país a pagar um custo alto para se financiar. Tanto é que Dilna já agendou para a próxima terça-feira uma reunião com os principais empresários do país para debater estratégias de estímulo à atividade. Pressionada por todos os lados, a presidente da República deve ter as tormentas intensificadas no fim do mês, quando o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgar o resultado do PIB do segundo trimestre. A expectativa dos analistas é de que o número venha abaixo de 0,6%, uma decepção para os técnicos do Executivo, que esperavam uma resposta imediata da economia após as reduções de Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) para diversos setores. Mesmo com todos os estímulos, a produção industrial de junho, por exemplo, ficou aquém do esperado, avançou apenas 0,2% no mês — a projeção era de 0,8%. Para especialistas, os incentivos apenas serviram para evitar o pior. "Em suma, a redução do IPI evitou uma contração da indústria e um quadro ainda mais fraco de atividade econômica", observou Aurélio Bicalho, economista do Itaú Unibanco.

Aposta errada

Jankiel Santos, economista-chefe do Espírito Santo Investment Bank, explica que o governo errou no seu primeiro diagnóstico ao apostar as fichas na demanda. "Não falta consumo. Ele continua crescendo, mas de forma mais moderada. Agora, o governo acertou ao mudar o foco dos estímulos para o investimento", disse. Com essa mudança de estratégia, a equipe do Planalto se mostrou ainda disposta a abrir mão do superavit primário em prol do aumento das taxas de investimento. Porém enfrenta uma forte queda das receitas. Segundo dados do Ministério da Fazenda, em junho deste ano, a arrecadação de tributos registrou redução nominal de 7,06% se comparada a igual período de 2011 — tanto o Imposto de Renda quanto a Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) deixaram mais vazios os cofres da Receita Federal.

Para Newton Rosa, economista-chefe da Sul América Investimentos, as greves também têm atrapalhado o trabalho do governo. "Principalmente na área de exportações. Dá para perceber nas estatísticas o efeito delas", ressalta Rosa. Pelos números do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), a balança comercial encolheu 8,3% na comparação entre julho e igual mês do ano passado. Com problemas por todos os lados para o governo, o mercado espera que na próxima semana seja anunciado um novo pacote, o nono na gestão de Dilma Rousseff. O Palácio do Planalto deve desonerar as contas de energia dos grandes consumidores e apresentar mais benefícios t "A comissão parlamentar não conseguiu reunir provas suficientes para uma punição mais ampla, apenas apontou indícios que não levaram muito longe em alguns casos", explica um técnico.ributários sobre investimentos.

Não falta consumo. Ele continua crescendo, mas de forma mais moderada. Agora, o governo acertou ao mudar o foco dos estímulos para o investimento"

Jankiel Santos, economista-chefe do Espírito Santo Investment Bank

Pressão pelos portos 24 horas

Enquanto o governo quebra a cabeça para fechar novo pacote de investimentos em infraestrutura de transportes — portos, aeroportos, rodovias e ferrovias —, uma medida simples faria dobrar imediatamente a capacidade portuária, que está à beira do colapso. Bastaria a presidente Dilma Rousseff baixar decreto para fazer com que os terminais e todas as instituições envolvidas, como alfândega, vigilância sanitária, Receita Federal e operadoras funcionassem 24 horas, conforme estudo da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan).

A canetada permitiria, segundo o levantamento, o tempo médio de permanência de um contêiner nos portos cairia de 5,5 dias para 2,7, abaixo da média mundial, de 2,9, mas ainda acima de vizinhos como o Chile (1,3). Vários terminais privados operam ininterruptamente, mas se a carga chega tarde da noite ou de madrugada e precisa de alguma documentação para ser liberada, fica parada no pátio esperando a inspeção dos órgãos que trabalham no horário comercial. Os maiores portos do mundo, como os de Xangai (China), Cingapura e Roterdã (Holanda), não param e liberam a carga em até um dia.

Enquanto isso, o Porto de Santos (SP), o maior do país, apesar de ter terminais privados operando 24 horas, a burocracia faz com que opere efetivamente das 9h às 17h, limitado aos horários da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), da Receita, das Docas e do Ministério da Agricultura. Isso quando não estão em greve ou operação padrão, deixando o ritmo ainda mais lento.

O mesmo ocorre com o porto do Rio, que abre às 8h e fecha às 17h. Paranaguá (PR) opera das 9h às 17h ou 17h30, se considerarmos o fim do expediente dos funcionários da Receita. Procurada, a Secretaria dos Portos não retornou para comentar o estudo. A Receita também não. A Companhia Docas de Santos alegou que o funcionamento das 9h às 17h é apenas da área administrativa.

Só no primeiro semestre, foram embarcados e desembarcados 1,5 milhão de TEUs (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés), quase a metade da capacidade para todo o ano. O alívio deverá vir no ano que vem, quando começam as operações de dois terminais privados que, até 2014, mais do que dobrarão a capacidade de Santos. "Se a operação dos portos fosse 24h, o Brasil saltaria 40 posições no ranking de eficiência portuária, da 106ª para a 68ª ", ilustra o presidente da Firjan, Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira.