O globo, n. 31280, 29/03/2019. Rio, p. 15

 

Crivella tem semana tensa na relação com a Câmara

29/03/2019

 

 

Com críticas a prefeito, que não cumpre acordos políticos, vereadores chegaram a ensaiar alteração na Lei Orgânica visando a eventual processo de impeachment. Ontem advogado protocolou pedido de cassação

A relação do prefeito Marcelo Crivella com a Câmara do Rio chegou ao ápice da tensão esta semana. Parlamentares que integram a base aliada alegam que Crivella tem descumprido acordos, como promessas de fazer obras ou implantar projetos sociais em seus redutos eleitorais. Outro motivo de reclamação é que o prefeito, às vésperas de ano eleitoral, tem exonerado indicados de vereadores que votaram pelo aumento do IPTU para, no lugar, nomear indicados de parlamentares que não apoiaram a medida impopular.

Ontem, após dias de conversas nos bastidores da Casa e de uma tentativa, que não foi bem-sucedida, de mudar a Lei Orgânica sobre um eventual processo de impeachment, um pedido de cassação de Crivella foi protocolado pelo advogado criminalista Pablo Filipe Morais Soares de Andrade. Ele alega que Crivella cometeu irregularidade ao endossar uma transação do município com a Caixa Econômica Federal, em 2017. Crivella adquiriu por quase R$ 10 milhões um terreno da instituição em Rio das Pedras para um projeto do Minha Casa Minha Vida que não saiu do papel. Na operação, houve renúncia fiscal e a prefeitura abriu mão de receitas futuras de ISS em troca da área. No entendimento do advogado, que já atuou para Orlando Curicica, acusado de ser ligado a milícias, Crivella cometeu crime de responsabilidade porque a operação não poderia ter sido feita sem o aval da Câmara, o que configuraria uma pedalada fiscal.

O presidente da Casa, vereador Jorge Felippe, disse que está “propenso” a rejeitar o pedido, que pode ser apreciado pelo plenário na terça-feira:

—Estou propenso a rejeitar essa primeira denúncia. Numa análise superficial, não vejo como um caso de impeachment do prefeito —disse Felippe.

É mais um round na relação, já azeda, entre Crivella e alguns vereadores. Entre os descontentes, está o próprio líder do governo, Jairinho (MDB), e o presidente da Câmara, Jorge Felippe (MDB). Ambos votaram, na terça-feira, pela aprovação da emenda à Lei Orgânica, que permitiria ao Legislativo carioca indicar um sucessor em caso de impedimento do prefeito. A medida, embora apoiada por 15 partidos diferentes, não passou por um voto e, em caso de impeachment, uma nova eleição deve ser realizada. Tanto Felippe quanto Jairinho negam estar articulando contra o governo. Mas o fato é que a base de Crivella vem sendo corroída, com a perda de vereadores que costumavam apoiar o prefeito em votações importantes. Procurado ontem, Crivella não quis comentar o assunto.

Opinião do GLOBO

Poder paralelo

AS REPRESÁLIAS do tráfico à morte do bandido que chefiava a venda de drogas na Favela do Lixão, em Duque de Caxias, mostram a que ponto chega a capitulação do Estado.

A MANDO de traficantes, comerciantes tiveram de fechar as portas; ônibus alteraram itinerários; escolas suspenderam aulas e até o Fórum local teve de interromper suas atividades, em meio ao clima de terror que tomou conta da cidade de 900 mil habitantes, a terceira mais populosa do estado.

COMO SE vê, o tráfico tem ingerência não apenas nas favelas, mas também na chamada cidade formal. O Estado precisa agir, ao menos para mostrar quem está no comando.