Título: Área de produção de fumo será reduzida
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Fonte: Correio Braziliense, 04/08/2012, Brasil, p. 11

A três meses da Conferência das Partes (Cop 5) da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, na Coreia do Sul, a indústria do tabaco começa a se mobilizar contra as medidas que o país deve adotar para diminuir a incidência de fumantes. Entre as ações previstas, está a normatização dos artigos 17 e 18, que tratam de atividades alternativas economicamente viáveis e da proteção ao meio ambiente e à saúde. O setor fumígeno afirma que o governo brasileiro já está se adiantando ao arrochar os requisitos de incentivo financeiro ao produtor. Entretanto, defensores do controle do tabaco alegam que nenhuma medida a ser tomada deixará o produtor desamparado. Números da Organização Mundial da Saúde indicam que o tabagismo, principal causa de morte evitável em todo o mundo, é responsável por 4,9 milhões de falecimentos por ano — mais de 10 mil mortes por dia.

O estopim para que o setor se movimentasse foi a resolução do Banco Central de 28 de junho, que limita a concessão de crédito ao trabalhador rural pelo Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf). Para que o agricultor consiga o incentivo de compra de equipamentos, como trator e outras máquinas, ele precisa comprovar que pelo menos 25% da renda da propriedade não seja proveniente do plantio de tabaco. No próximo ano, o montante será de 35% e, no seguinte, 45%.

O presidente da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Tabaco, Romeu Schneider, explica que, sem o incentivo, fica mais difícil chegar aos patamares de diversificação exigidos. "O pequeno produtor não tem condições de provar que parte da renda não vem do tabaco. Até porque boa parte da terra é arrendada. Essa medida faz com que eles tenham que abandonar suas atividades e procurar outro trabalho", critica. Segundo Schneider, dados do setor mostram que a medida afeta a vida de 100 mil famílias dos três estados da região Sul. "Se juntarmos as famílias da região Nordeste, esse número fica ainda maior. São pessoas que vão aumentar as estatísticas do êxodo rural", alerta.

Diretora da Aliança de Controle do Tabagismo (ACT) em prol da promoção e implementação da convenção-quadro, Paula Johns explica que a argumentação da indústria está equivocada. "A posição do país não é, e jamais foi, reduzir o plantio forçosamente. O objetivo da Cop 5 é diminuir a prevalência de tabagismo no mundo", frisa. Paula comenta que os artigos 17 e 18 discutem alternativas para os que desejam diminuir ou diversificar a área. "Até porque, enquanto houver demanda, alguém vai produzir", acrescenta. Paula ressalta que o documento que o Brasil levará à Cop 5 não está finalizado e que o país já se posicionou de forma clara na não redução de área de plantio."

Levantamento divulgado pelo setor mostra que um hectare de plantação de tabaco geraR$ 8,5 mil de renda, enquanto um de milho, por exemplo, resulta em R$ 1,8 mil de lucro. Para o representante da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, Mesaque Kecot Veres, o governo está tratando uma atividade legal como clandestina. "Nunca vi a Escócia falar da produção de uísque, ou a Rússia reclamar da de vodca. Mas tem um grupo que fala de nós por sermos os maiores exportadores do mundo". Na interpretação do setor, a decisão do Banco Central é uma sinalização de que a Cop 5 trará resultados ainda drásticos. Para Schneider, a retirada da tabela de preços e a redução da área plantada que serão discutidas trarão impacto imediato à arrecadação de impostos do setor — calculada em R$ 10 bilhões.

Projetos A variação do plantio é bandeira antiga do Governo Federal. De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, o programa de diversificação foi implantado em 2005 e atende aos artigos 17 e 18 da convenção-quadro. A iniciativa concede aos agricultores familiares do setor acesso à assistência técnica e extensão rural para produção de alimentos como alternativa economicamente viável à cultura do tabaco, com cursos de capacitação, fomento ao acesso à informação e apoio na comercialização.

Em nota, a pasta afirmou que há cerca de 70 projetos de pesquisa, que apoiam mais de 80 mil agricultores familiares, com cerca de R$ 26 milhões disponíveis. A pasta também ressaltou que os produtores de fumo são os únicos que tem duplo acesso a financiamentos rurais — o custeio no Pronaf para outras culturas e em outras linhas de crédito rural para o tabaco.

Decisões tomadas na Cop 4, ocorrida em 2010, no Uruguai, também causaram polêmica no setor. Dela, surgiu a resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de proibir o uso de aditivos e flavorizantes como canela, menta e cravo nos derivados de tabaco consumidos no Brasil. A ação também resultou em protesto do setor, que luta no Congresso Nacional para reverter a decisão.