O globo, n. 31270, 19/03/2019. País, p. 4

 

Linha de corte nas nomeações

Manoel Ventura

19/03/2019

 

 

 Recorte capturado

 

 

Governo adota Lei da Ficha Limpa e muda critérios para postos de confiança

O governo decidiu ontem estabelecer critérios mais rígidos para a nomeação de servidores comissionados na máquina federal. Um decreto assinado pelo presidente Jair Bolsonaro, publicado no Diário Oficial da União, incorporou ao processo de seleção do Executivo as regras da Lei da Ficha Limpa.

Sancionada pelo ex-presidente Lula em 2010, a norma proibiu a candidatura de políticos condenados pela Justiça em segunda instância. Agora, o decreto de Bolsonaro estende essa proibição aos candidatos a postos de Direção e Assessoramento Superior (DAS), os cargos de confiança da elite do governo.

Além das regras da Ficha Limpa, os ocupantes de cargos de confiança deverão cumprir critérios básicos de “idoneidade moral e reputação ilibada” e ter perfil profissional ou formação acadêmica equivalente ao cargo que vai ocupar.

Os novos critérios surgem em meio à pressão de parlamentares, no Congresso, para que o Palácio do Planalto libere a nomeação de apadrinhados políticos em cargos do segundo e terceiro escalões do governo.

Ainda em processo de formação de sua base aliada, Bolsonaro tem tido dificuldades de costurar alianças que viabilizem a votação de projetos importantes do governo no Parlamento, como a reforma da Previdência e o pacote anticrime do ministro da Justiça, Sergio Moro.

Nas últimas semanas, os encarregados da articulação política do palácio com o Congresso acenaram com a liberação de verbas e a nomeação de indicados políticos na máquina. A imposição de critérios mais rígidos para essas indicações políticas, no entanto, devem atrapalhar as negociações com os líderes partidários.

O decreto do governo Bolsonaro começou a ser gestado a partir de discussões entre a Controladoria Geral da União (CGU) e o extinto Ministério do Planejamento, ainda na gestão do expresidente Michel Temer. A ideia foi retomada no governo Bolsonaro e encampada pelo Ministério da Economia de Paulo Guedes.

As regras entram em vigor em 15 de maio e só valem para novas nomeações. Quem já está no cargo, mesmo que descumpra algum critério estabelecido no decreto, permanece no posto.

"Toma lá, dá cá"

O ministro da CGU, Wagner Rosário, admitiu ontem, porém, que o governo ainda tem uma janela de dois meses para nomear indicados a cargos sem a observância dos novos critérios. Dos 24 mil cargos atingidos pela nova norma, cerca de 3,7 mil ainda estão vagos. O secretário de Desburocratização, Gestão e Governo Digital da Economia, Paulo Uebel, disse que o decreto evita o “toma lá dá cá” com as nomeações políticas:

— A pessoa vai ter que preencher requisitos mínimos técnicos e reputação.

Além dos critérios gerais, o decreto exige regras específicas para os cargos. A exigência de atuação na área vinculada ao cargo público deve variar de acordo com o posto do indicado. Assim, quanto mais alto o posto, maior deve ser o tempo que o profissional precisa ter atuado no setor ligado ao cargo público. No caso de DAS 5 e 6, os mais altos cargos de confiança, a exigência será de cinco anos.

A formação acadêmica também terá influência na aprovação do indicado para cargo de confiança. Caso a pessoa não tenha atuação no mercado de trabalho, mas tenha formação acadêmica na área isso poderá ser levado em conta. O decreto prevê a possibilidade de realização de um processo de seleção pública para preenchimento dos cargos de confiança, sem obrigação de contratar os selecionados.

Atualmente, os ministros têm liberdade para indicar ocupantes de cargos de confiança até o nível DAS 4. Os DAS 5 e 6, os mais altos, precisam do aval da Casa Civil. Em viagem oficial aos EUA, Bolsonaro usou as redes sociais ontem para falar do decreto. “Seguimos com o objetivo de enxugar e otimizar a máquina pública. O exemplo vem de casa!”, escreveu.

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Na ausência do pai, um ‘vereador federal’ em Brasília

Daniel Gullino

Karla Gamba

19/03/2019

 

 

Eleito para a Câmara municipal do Rio, Carlos Bolsonaro dedicou a segunda-feira a atender ‘solicitações’ do presidente na capital

Com o presidente Jair Bolsonaro em Washington para a visita oficial ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, um dos seus filhos, o vereador do Rio Carlos Bolsonaro (PSC) esteve no Palácio do Planalto na manhã de ontem realizando conversas, de acordo com ele, sob orientação do pai. Enquanto isso, o presidente em exercício, Hamilton Mourão, cumpria agenda em São Paulo.

Por volta das 11h25, Carlos deixou o Planalto pela entrada principal do prédio e caminhou rumo ao Congresso. Em seguida, publicou em seu perfil numa rede social que estava em Brasília para “desenvolver linhas de produção solicitadas pelo presidente”. À noite, esta mensagem já havia recebido respostas de mais de 1,5 mil usuários do Twitter, boa parte cobrando Carlos por estar afastado do trabalho como vereador.

Um dos deputados com quem se encontrou foi Hélio Lopes (PSL-RJ), próximo da família Bolsonaro, conforme o próprio Hélio publicou mais tarde em uma rede social.

A visita de Carlos não constava na agenda de nenhum dos ministros do Palácio do Planalto, nem do presidente em exercício, Hamilton Mourão. O GLOBO conversou com assessores que trabalham no andar do gabinete presidencial mas, segundo relatos, ninguém viu por onde o vereador circulou dentro do prédio. A Secretaria de Comunicação do Planalto também não informou qual foi a agenda de Carlos Bolsonaro no Palácio do Planalto.

Depois, em outra publicação, Carlos disse que discutiu em Brasília a reforma da Previdência e “outros assuntos”.

Segundo o calendário da Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, não havia sessão plenária prevista para ontem. O plenário da Câmara costuma ter votações de terça a quinta-feira. Os vereadores costumam dedicar a segunda e a sextafeira a outras atividades do mandato.

Na semana passada, Carlos Bolsonaro deu uma entrevista ao canal da jornalista Leda Nagle no Youtube, em que comentou possível participação no governo do pai. Ele disse que não quis nem pretender ter cargo no governo, que não tem vontade de ir para Brasília, mas que ajuda o presidente sempre que pode.

—Tenho contato com meu pai todo dia. Não tem como as pessoas quererem me separar do meu pai. Trabalhamos juntos há 18 anos. No dia em que ele falar "filho, já deu", eu vou embora. Só quero defender meu pai. Não tenho pretensão alguma —afirmou.