O globo, n. 31282, 31/03/2019. Economia, p. 33

 

Um alívio de R$ 330 bi para os estados

Geralda Doca

Marcello Corrêa

Cássia Almeida

31/03/2019

 

 

Só com servidores civis, economia em dez anos chega a R$ 277,4 bilhões

A reforma da Previdência encaminhada ao Congresso pelo governo federal pode gerar uma economia de R$ 329,4 bilhões para os estados em um período de dez anos, segundo estudo inédito da equipe econômica. Só as mudanças nas regras de aposentadoria dos servidores civis representam um alívio de R$ 277,4 bilhões. As alterações para policiais militares e bombeiros representam mais R$ 52 bilhões.

 

O estudo revela que o impacto da reforma para os estados supera a economia projetada para a União, considerando apenas os servidores públicos, que é de R$ 202 bilhões em dez anos. A cifra de R$ 1,1 trilhão — defendida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes —engloba ainda as mudanças na aposentadoria dos trabalhadores do setor privado e nos benefícios assistenciais, além de penduricalhos, como a restrição ao abono salarial (PIS). Atualmente, o número de aposentados e pensionistas civis dos estados chega a 2,2 milhões. O de militares é de 385 mil.

Em linhas gerais, a reforma fixa idade mínima de aposentadoria de 65 anos (homem) e 62 anos (mulheres) para todos os trabalhadores, com regra de transição. No caso dos servidores públicos, ela começa aos 56 anos (mulheres) e 61 anos (homens), subindo gradativamente.

A proposta endurece as regras das aposentadorias especiais de professores, que terão idade mínima de 60 anos para homens e mulheres. Altera também a fórmula de cálculo do benefício e proíbe incorporações. Quem ingressou na carreira antes de 2003 precisa atingir idade mínima para ter direito à integralidade (último salário) e paridade (mesmo reajuste dos ativos). Essas alterações valerão automaticamente para os estados.

'Bomba-relógio'

De acordo com as projeções da equipe econômica, São Paulo será o estado mais beneficiado com a reforma: em dez anos, pode obter uma economia de R$ 48,5 bilhões. Depois vem o Paraná, com R$ 27,4 bilhões. Rio e Minas Gerais empatam com um ganho fiscal de R$ 29,9 bilhões.

O impacto dos estados em pior situação fiscal (Rio, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Goiás) chega a R$ 77 bilhões, ou 27,7% da economia total com servidores civis. Mas o economista Paulo Tafner —estudioso do tema e que elaborou uma proposta alternativa de reforma da Previdência com o ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga —tem um cálculo mais modesto. Ele estima uma economia superando os R$ 100 bilhões, em dez, anos, para o conjunto dos estados.

—A mudança na idade dos professores tem impacto forte nas contas, vai dar uma boa aliviada —diz Tafner.

Só os militares, calcula, responderiam por R$ 50 bilhões — projeção em linha com os números da equipe econômica. As mudanças nas regras para professores representariam 30% da economia, e as dos demais servidores, 20%.

A conta tomou por base a participação das categorias entre os inativos. Fábio Klein, especialista em finanças públicas da Tendências Consultoria, lembra que os servidores públicos estão envelhecendo, o que, aliado à elevação da expectativa de vida, aumenta substancialmente as despesas dos estados:

— Dado o processo de envelhecimento combinado com regras mais generosas, é uma verdadeira bomba-relógio. Como é uma obrigação de pagamento, o estado terá de arrochar salário e não contratar, sem falar nos investimentos. Isso é muito ruim para a prestação de serviço público, educação, saúde, segurança e até desenvolvimento econômico. Sérgio Aureliano, presidente da Rioprevidência, afirma que ainda há muitas

dúvidas sobre o alcance da reforma para o Rio, principalmente em relação aos policiais militares e bombeiros. O Estado do Rio aplica alíquota de 14% sobre os rendimentos que excedem o teto dessas categorias —o projeto de lei das Forças Armadas, que será estendido aos militares dos estados, prevê alíquota máxima de 10,5%. Essa avaliação também vale para os servidores em geral.

Atualmente, o estado recolhe 14% sobre a folha. As alíquotas progressivas — que, pela proposta do governo, vão de 7,5% a 22% — significarão 11,65% de alíquota efetiva. O presidente da Rioprevidência prevê uma perda na arrecadação de cerca de 3%.

Dos servidores ativos do Rio, professores, policiais militares e bombeiros, somados, representam 66,8% do total. Professores são 36,5%; PMs, 23,5%; e bombeiros, 6,8%. Aureliano, fez simulações com alguns municípios, e o déficit pode cair até 40% em alguns deles se a reforma for aprovada como está:

—A alíquota sobe para 14% onde há déficit, mas esse percentual é excessivo e vai transformar o déficit em superávit em algumas cidades.

Governos se articulam

Enquanto a proposta não avança no Congresso, os governadores já se articulam para sugerir mudanças no texto. Embora a maior parte seja favorável à proposta, a ideia é que esta pode ser aperfeiçoada.

Foi formado um grupo de trabalho, que deve se reunir esta semana. Uma ideia é resgatar pontos da proposta elaborada por Arminio e Tafner. Esta previa, por exemplo, um sistema que tiraria do Orçamento dos estados as despesas com Previdência, que seriam bancadas por um fundo à parte, financiado por ativos estaduais.

A PEC enviada à Câmara não contempla essa possibilidade. Em vez disso, prevê que uma lei complementar definirá como serão criados fundos previdenciários, que ainda seriam ligados ao Orçamento. A vantagem da proposta de Arminio e Tafner é que, na prática, a Previdência deixaria de pressionar as contas dos estados.

— Tentaremos levar sugestões. Não adianta ter uma vertente apenas da União, sem que haja uma visão para estados e municípios — disse o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM).

Já os secretários de previdência vão se reunir na semana que vem em Belém, para avaliar a proposta. Uma das questões é a incidência de Pasep sobre as contribuições, que Aureliano considera bitributação:

— Incide 1% sobre a folha de pagamento e 1% sobre as contribuições para o fundo. Pretendemos preparar uma emenda para levar ao governador, que, se concordar, encaminhará para a bancada estadual apresentar.

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Rio será maior beneficiado com reforma de militares

31/03/2019

 

 

Em uma década, alívio será de R$ 9,3 bilhões nas contas do estado, que exige apenas 25 anos de serviço para passar à reserva

Considerando-se apenas a economia com militares, o Estado do Rio será o maior beneficiado pela reforma da Previdência. Em dez anos, o alívio para as finanças estaduais será de R$ 9,34 bilhões. Somados, Rio, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Goiás economizarão R$ 22 bilhões com militares.

A cifra representa 42,3% de toda a economia projetada para o período (R$ 52 bilhões). Encaminhado ao Congresso no último dia 20 como condição dos parlamentares para começar a discutir a reforma da Previdência dos civis, o projeto que altera as regras previdenciárias para os militares prevê também uma polêmica reestruturação de carreira, com aumento de remuneração. Porém, para os PMs e bombeiros dos estados só valerão as alterações previdenciárias.

Entre elas, aumento do tempo de serviço para 35 anos, exigência de 30 anos na atividade e cobrança de alíquota de 10,5% para todos (militares da reserva, reformados e pensionistas). Essas regras valerão a partir de 2020. Quem já ingressou na carreira terá uma regra de transição, com pedágio de 17% sobre o que falta para requerer a reserva.

Segundo técnicos da equipe econômica, o potencial de ganho para os estados pode ser ainda maior. As projeções da equipe econômica se basearam nas duas principais medidas da proposta: aumento do tempo de serviço de 30 para 35 anos, com 30 anos de atividade militar e contribuição previdenciária de 10,5%. Só para se ter uma ideia, considerando-se apenas o tempo de serviço, os estados terão redução de despesa de R$ 29 bilhões nos dez primeiros anos e de R$ 91 bilhões em duas décadas. Hoje, a média de idade ao requerer o benefício é de 51 anos. Com a reforma, deve subir para 55 anos.

Situação insustentável

O estudo da equipe econômica revela que metade dos militares passa para a reserva antes dos 49 anos e recebe proventos 50% superiores aos dos ativos, porque são promovidos a um posto acima. Atualmente, a definição das regras previdenciárias dos militares estaduais é feita pelas assembleias locais, e, por isso, elas variam muito entre as unidades das federação. No geral, o tempo de serviço fica entre 25 e 30 anos.

Em vários estados, não há exigência de tempo na atividade militar. Onde há o requisito, o tempo varia de 10 a 25 anos. No Rio,exigem-se apenas 25 anos de efetivo serviço militar. A categoria pode contar, para fins de reserva, com licença especial e férias, que contam o dobro. Os policiais do estado também são promovidos a um posto superior ao serem transferidos para a inatividade.

A situação é insustentável porque o número de militares estaduais ativos é praticamente o mesmo dos inativos, considerando os pensionistas. Existem 460 mil militares em atividade, 250 mil inativos e 135 mil pensionistas. Pelo regime vigente, de repartição, quem está na ativa ajuda a pagar os inativos.