O globo, n. 31274, 23/03/2019. País, p. 8
Vélez troca, de novo, ‘número 2’ da Educação
Renata Mariz
23/03/2019
Iolene Lima anuncia seu desligamento da Secretaria Executiva da pasta, que passa por terceira mudança em dez dias. Cargo virou alvo de disputa entre militares, evangélicos, ala técnica e seguidores de Olavo de Carvalho
Indicada na última semana pelo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, para assumir a Secretaria Executiva da pasta, Iolene Lima anunciou pelas redes sociais, ontem, que foi demitida. O posto, espécie de "número 2" do Ministério da Educação (MEC), passou assim pela terceira troca em apenas dez dias. Não há informação oficial sobre quem ocupará o cargo, que virou o centro de uma disputa entre diferentes grupos que procuram espaço no MEC na gestão de Vélez. Na semana passada, Vélez confirmou que Iolene, ligada a escolas evangélicas e que estava no ministério como diretora de capacitação desde o início do governo, seria a secretária-executiva. Sua nomeação não chegou a ser publicada no Diário Oficial da União, mas ela acompanhou Vélez em compromissos públicos, como na visita do ministro a Suzano para prestar solidariedade às vítimas do ataque à escola Raul Brasil. O nome de Iolene teve resistências na Casa Civil, que pleiteia, com aliados do governo, a indicação de cargos no MEC. "Diante de um quadro bastante confuso na pasta, mesmo sem convite prévio, aceitei a nova função dentro do ministério. (...) No entanto, hoje, após uma semana de espera, recebi a informação que não faço mais parte do grupo do MEC", afirmou Iolene em seu perfil no Twitter.
Iolene desejou "o melhor" para o presidente Jair Bolsonaro e para Vélez. No entanto, em tom de desabafo, fez questão de ressaltar na mensagem que deixou a direção de um colégio que ajudou a fundar há cinco anos para "servir ao país". Antes de sua atuação no MEC, Iolene era ligada à Associação de Escolas Cristãs de Educação por Princípios, uma organização não-governamental.
Ataques de ideólogo
A indicação de Iolene foi anunciada por Vélez após a queda consecutiva de outras duas pessoas do posto: Luiz Tozi, secretário-executivo desde o início do governo, e Rubens Barreto da Silva, que nem chegou a assumir e continua como secretário-adjunto da pasta. A medida que atingiu os dois entra no contexto de uma briga entre os seguidores do ideólogo de direita Olavo de Carvalho, que ocupam cargos no MEC —o próprio Vélez foi indicação sua —, e outros grupos da pasta, como a ala técnica, os militares e a bancada evangélica, que procura mais espaço no governo Bolsonaro. Após pedir e conseguir a
cabeça do coronel Ricardo Roquetti, que era assessor de Vélez e a quem seus ex-alunos acusaram de blindar o ministro e assessorá-lo mal, Olavo de Carvalho mirou suas postagens de ataque contra Tozi. O então secretárioexecutivo do MEC passou a ser chamado de “tucano” pelo grupo ligado ao ideólogo. Antes de assumir o cargo no ministério a convite de Vélez, Tozi era do Centro Paula Souza, uma autarquia do governo de São Paulo que gerencia escolas técnicas e faculdades de tecnologia. Diante das pressões, Tozi foi demitido por Vélez na última semana. Rubens Barreto da Silva, que atuava como secretário-adjunto, foi indicado para assumir no lugar de Tozi. Os dois trabalharam juntos e são amigos. Imediatamente, Rubens, que já resistia em ficar no cargo, tornou-se também alvo de críticas do grupo ligado a Olavo de Carvalho e logo foi substituído no cargo por Iolene Lima, que agora deixa o MEC.
Ao ser indicada para a Secretaria Executiva, departamento considerado vital para o funcionamento do ministério, Iolene era considerada um nome mais palatável a setores conservadores do governo. A educadora vinha atuando desde janeiro no MEC, voltada à qualificação de professores do ensino básico. Iolene estava designada como substituta eventual da secretária de Educação Básica, Tânia Leme de Almeira — outro nome que passou pelo Centro Paula Souza em São Paulo.
'Ótica de Deus'
Em uma entrevista de junho de 2014 que voltou a circular nas redes sociais após sua indicação à Secretaria Executiva do MEC, Iolene defendeu a educação" soba ótica de Deus ", e se disse apaixonada pelo tipo de abordagem que parte "de uma inspiração divina para apresentar um conteúdo formal". A educadora participou do programa, à época, para falar do Colégio Inspire, em São José dos Campos, instituição da qual foi diretora. Em conversa com o apresentador, o pastor Carlito Paes,Iol ene afirmou que a educação por princípios baseia o currículo sobre a ótica das escrituras bíblicas, e acrescentou que o primeiro contato dos alunos coma Matemática, por exemplo, sedava a partir do livro de Genêsis. Apesar do alinhamento religioso, Iolene não foi uma indicação da bancada evangélica segundo o deputado Lincoln Portela (PR-MG), um dos líderes da frente parlamentar. Os parlamentares evangélicos veem com maus olhos a influência de Olavo de Carvalho, tido por alguns deles como “preconceituoso” com religiões.