O globo, n. 31268, 17/03/2019. Economia, p. 23

 

Vale a regra de militar

Daiane Costa

Geralda Doca

17/03/2019

 

 

Alíquota cairá em alguns estados, mas União diz que cobrança de pensionistas impedirá perdas

Os bombeiros e policiais militares estaduais ficarão submetidos às novas regras do sistema previdenciário das Forças Armadas, que o governo federal vai encaminhar ao Congresso na quarta-feira. Uma versão do texto, obtida com exclusividade pelo GLOBO, mostra que haverá mudanças profundas para essas duas categorias, que têm grande peso nas contas públicas estaduais e regras diferentes em cada unidade da federação.

Os gastos dos estados com policiais militares e bombeiros representam entre 20% e 30% do total das despesas da folha com pessoal, considerando servidores civis ativos, inativos e pensionistas, segundo a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho. Em Minas Gerais, o percentual supera 30%.

A mudança de regras no regime previdenciário das Forças Armadas foi uma exigência dos parlamentares para apreciara proposta de emenda constitucional( PEC) que altera as aposentadorias dos trabalhadores da iniciativa privada e dos servidores civis. Um projeto de lei específico para PMs e bombeiros também deve ser encaminhado ao Congresso, mas, enquanto isso não acontece,eles seguirão as regras das Forças Armadas —que, em linhas gerais, são mais brandas do que as exigências para se aposentar aplicadas aos demais trabalhadores.

Pelo projeto do governo para as Forças Armadas, a alíquota de contribuição na ativa será de 8,5% no primeiro ano após as mudanças, subindo um ponto percentual por anoa té chegara 10,5%. Ou seja, haveria uma redução no caso dos estados mais endividados, como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, que têm hoje alíquota de 14%. O governo federal, porém, alega que isso não significará prejuízo para as contas dos estados, pois essa redução da alíquota seria compensada pela implantação de cobrança de pensionistas e de quem está na reserva, além da exigência de um tempo maior na ativa.

O texto estabelece que novos PMs e bombeiros precisarão ter 35 anos de tempo na ativa e pelo menos 30 anos de atividade militar para ir para a reserva. Hoje, essa exigência não passa de 30 anos na maior parte dos estados. Já os pensionistas e pessoal da reserva nem sempre recolhem e, quando o fazem, geralmente é sobre o que excede o teto do benefício do INSS, hoje de R$ 5.839,45. Porém, se a União acredita que não haverá prejuízo às contas estaduais, não está claro se, ao seguir as regras das Forças Armadas, haverá alívio às finanças dos estados.

Essas categorias hoje representam um quarto do total gasto com pensões dos servidores, segundo levantamento feito combas e em dados do Tesouro. O subsecretário de Regimes Próprios de Previdência Social, Allex Albert Rodrigues, defende que todos os estados sairão ganhando com a equiparação das regras de inatividade e pensão dos PMs e bombeiros estaduais às normas das Forças Armadas. Mesmo aqueles que já exigem mais desses profissionais para conceder a aposentadoria, como alíquota previdenciária mais elevada em relação aos percentuais cobrados dos integrantes das Forças Armadas.

— Financeiramente, todos os estados terão ganho. Mas o maior deles é ter uma lei nacional que vai uniformizar o tratamento das organizações militares, padronizando as regras de inatividade e pensão. Isso traz segurança e uma visão nacional das polícias – destacou Rodrigues, acrescentando que a medida serve para blindar os governos regionais, maiss uje itosà pressão da categoria. Técnicos do governo afirmam que alei complementar que será enviada ao Congresso posteriormente evai definir normas definitivas para PMs e bombeiros pode acabar coma promoção a um posto acima na passagem para a inatividade, outro item que pesa nas contas dos regimes próprios de Previdência.

Em um conjunto de 20 estados, a previdência de PMs e bombeiros consumiu R$ 36,3 bilhões, cerca de 25% do total gasto com pensões dos servidores (R$ 136,3 bilhões). Rio, Minas e Rio Grande do Sul comprometeram entre 10% e 14% da sua receita disponível para pagar benefícios e pensões do grupo. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), de cada cem servidores públicos estaduais em todo o Brasil, 17 pertencem a esse grupo.

— Eles pressionam os regimes próprios porque, além de representativos, em alguns casos têm o mesmo tamanho do outro grupo que mais pesa sobre as contas estaduais, os professores, pois se aposentam relativamente cedo e com salários altos—explicou o diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Ipeae pesquisador na área de funcionalismo estadual, Cláudio Hamilton Matos dos Santos.

No ano passado, a despesa coma aposentadoria dos militares do Estado do Rio foi seis vezes maior (R$ 5,4 bilhões) que o valor da contribuição feita por eles (R$ 891 milhões), segundo dados do Tesouro. São 8.900 bombeiros e 24,8 mil PMs. O regime financeiro do Rio tem uma insuficiência de cobertura de R$ 653 bilhões para todo o compromisso com os 170 mil inativos.

— Com o aumento do tempo de contribuição, os militares vão trabalhar e contribuir por mais anos e receber o benefício por menos tempo — ressaltou Sergio Aureliano, presidente do Rio Previdência. Para o secretário de Fazenda de Minas Gerais, Gustavo Barbosa, a padronização é importante, pois vai organizar as alíquotas de contribuição e dar maior estabilidade aos profissionais.

Ele citou os casos do Rio, onde o percentual foi elevado para 14%, e de Minas, que está em 8%. Barbosa disse ainda que, no caso de Minas, qualquer ajuste terá efeito significativo, diante do déficit do regime próprio do estado, no qual PMs e bombeiros têm forte impacto. Em 2018, o rombo atingiu R$ 17,2 bilhões e deve chegar a R$ 18 bilhões este ano. Dos R$ 23,231 bilhões em despesas registradas no ano passado, 33,48% foram para pagamento de aposentadorias e pensões dessas categorias.

O diretor de Benefícios de Militares da Goiás Previdência, José Lemos da Silva Filho, destacou o aumento do tempo na ativa para 35 anos como item importante da reforma. Tanto no estado quanto em Minas, o tempo é de 30 anos. Em Goiás, o regime de previdência fechou 2018 com déficit de R$ 2,3 bilhões.

Os novos parâmetros de aposentadorias e pensões terão de ser adotados pelos estados assim que o Congresso aprovar o projeto das Forças Armadas. Já a remuneração de quem está na ativa continuará sendo prerrogativa dos entres federados.