Valor econômico, v. 18, n. 4454, 03/03/2018. Brasil, p. A6
Estimativa de R$ 700 bi com venda de estatais é muito alta
Sergio Lamucci
03/03/2018
A expectativa feita pelo economista Paulo Guedes, em entrevista ao Valor na semana passada, de obter R$ 700 bilhões com um amplo programa de privatizações e concessões parece muito elevada, tomando por base estimativas de consultorias que tentam calcular o quanto seria possível conseguir com a venda de estatais.
Estudo da consultoria Roland Berger realizado no fim de 2017 estimou um potencial de cerca de R$ 300 bilhões na desestatização de 48 companhias e 102 subsidiárias da União, num cálculo conservador, segundo António Bernardo, diretor-presidente da empresa no Brasil. Já a GO Associados calcula que a venda das participações do governo federal na Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Eletrobras, Infraero, Correios, Banco da Amazônia e Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) pode render R$ 234,5 bilhões. Coordenador do programa econômico do deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ), pré-candidato à presidência, Guedes mencionou o valor de R$ 700 bilhões em entrevista ao Valor, publicada na segunda-feira.
Além disso, o estudo da consultoria não considerou o valor de empresas em que o governo participa de forma indireta, como a BB Seguridade, controlada pelo Banco do Brasil, de capital de aberto. Se a BB Seguridade for vendida à parte, o montante poderia ser maior do que o "que está valorizado no balanço" do banco, afirma Bernardo. Outro ponto é que o estudo não incluiu nas estimativas empresas sobre as quais não há informações disponíveis.
Desse modo, o valor de R$ 300 bilhões seria conservador. "Pode chegar a R$ 400 bilhões ou mesmo R$ 500 bilhões", diz Bernardo. No estudo, a Roland Berger estima que a venda de estatais federais e estaduais poderia render R$ 421 bilhões, dos quais 71% (os cerca de R$ 300 bilhões) iriam para a União. Bernardo diz que prefere não comentar o valor mencionado por Guedes, por não saber como os cálculos foram feitos.
A GO Associados, por sua vez, concentrou-se oito empresas estatais de grande parte. No caso de Petrobras, Eletrobras, Banco do Brasil, Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), todas de capital aberto, o cálculo foi feito com base no valor de mercado do começo da semana passada. A fatia do governo na Petrobras, de 29%, equivalia a cerca de R$ 83,9 bilhões, e a do Banco do Brasil, de 55,5%, a R$ 68,2 bilhões. No caso da Caixa e dos Correios, a consultoria usou o patrimônio líquido do balanço patrimonial; no da Infraero, o capital social, porque o patrimônio líquido estava negativo.
Para Fernando Marcato, sócio da GO, o valor cogitado por Guedes "parece elevado demais", mesmo que inclua concessões, e não apenas a venda de estatais. "O número parece muito otimista", afirma Marcato, considerando ainda "muito difícil" fazer um programa dessa magnitude em quatro anos. Ele se diz favorável a "um amplo plano de privatizações", mas destaca as dificuldades que tendem a ser enfrentadas para vender as empresas, como as brigas com as corporações públicas.
Em agosto do ano passado, o governo anunciou um programa com 57 projetos de concessões e privatizações, com arrecadação estimada de R$ 40 bilhões, grande parte a entrar nos cofres da União até o fim deste ano. Entre os projetos, constava a a intenção de vender a Eletrobras, a Casa da Moeda e 14 aeroportos.