Valor econômico, v. 18, n. 4454, 03/03/2018. Política, p. A8

 

Reforma ministerial terá apoio a um candidato do governo como condição

Raymundo Costa

03/03/2018

 

 

Salvo fato novo da Operação Lava-Jato e seus satélites, a sucessão do presidente Michel Temer está voltando ao curso da política tradicional, quando faltam apenas seis meses para a eleição. Passado o Carnaval, os três maiores partidos - MDB, PT e PSDB - tentam retomar a iniciativa, isolar os radicais e lacrar de vez suas portas a cristãos novos ou outsiders da política. A novidade da Quaresma é a reforma ministerial condicionada ao apoio a um candidato que o governo promete lançar ao Planalto.

A recandidatura do presidente Temer, não reconhecida oficialmente, está camuflada na expressão "candidato do governo", usada pelo o ministro Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência). A outra novidade é que o PT não vai boicotar as eleições, se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não puder ser candidato. Palavra do próprio Lula em entrevista concedida ao jornal "Folha de S. Paulo" na quinta-feira.

"Quando chegar o momento certo, o PT pode discutir todas as alternativas. Eu sou contra boicotar as eleições", disse Lula, com a ressalva de que vai brigar até ganhar a candidatura.

Na entrevista que concedeu à jornalista Mônica Bergamo, o ex-presidente sepultou de vez a palavra de ordem "Eleição Sem Lula é Fraude", fez acenos de paz ao presidente Temer - segundo ele, vítima de duas tentativas de golpe do ex-procurador Rodrigo Janot - e ignorou solenemente o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ), candidato da extrema direita, provavelmente pelo PSC. Parecia combinado: Temer e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso também assestaram suas baterias na direção do ex-capitão do Exército.

Sem Lula na cédula, Bolsonaro é o primeiro das pesquisas de opinião, mas está no mesmo patamar que atingiu no auge da crise do governo Temer, em maio. FHC duvidou que Bolsonaro tenha alguma ideia. O golpe de Temer foi mais direto: a intervenção na segurança do Rio de Janeiro - decisão avaliada, no QG de Lula, como um "golpe de mestre" - se tudo correr bem e der certo (Temer subir nas pesquisas), pode fazer o presidente ganhar condições efetivas de reivindicar a reeleição. Sem falar que o presidente pode replicar a intervenção em outros Estados que sofrem com a violência, especialmente na região Nordeste.

O tema da segurança era bandeira de Bolsonaro, mas também de Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados e pré-candidato do DEM ao Palácio do Planalto. Maia, além da bandeira da segurança, ficou também sem a reforma da Previdência, cuja tramitação usava de maneira a manter sob rédea curta o Palácio do Planalto. Já Temer livrou-se de uma reforma moribunda e impopular. Nesse sentido também perdeu o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), que esperava pela proposta da Previdência para fazer sua própria negociação com o governo.

Temer não assume a candidatura à reeleição, o que o ministro Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência) faz questão de afirmar com todas as letras: "O governo terá um candidato". Quem? O nome do ministro Henrique Meirelles (Fazenda) está na lista - ele é uma espécie de guarda-chuva que garante credibilidade à política econômica. Outro citado é Rodrigo Maia. E pode até ser Geraldo Alckmin (PSDB), o que considera mais difícil. Segundo Moreira Franco, será alguém com liderança pessoal para "unir os partidos". Para bom entendedor meia palavra basta.

O ministro confirma que as mudanças ministeriais de abril serão condicionadas ao apoio partidário à candidatura palaciana. Em resumo, só fica no governo o partido que jurar lealdade ao candidato do Planalto. As tratativas estão sob a responsabilidade do ministro Eliseu Padilha (Casa Civil). Procurado, Padilha não respondeu ao Valor. Há pelo menos quatro partidos da base aliada de Temer já pré-comprometidos, nos bastidores, com outros candidatos - PSD, PP, DEM e Solidariedade.

O PSD já fechou um acordo com o prefeito João Doria para a disputa do governo estadual - nacionalmente, o partido ficará com Geraldo Alckmin. É o exemplo perfeito do que Moreira afirma que não será tolerado: "Não pode ter um pé em São Paulo e outro aqui", diz. Ocorre que o DEM deve lançar a pré-candidatura de Maia, embora também esteja em fase avançada de discussão com Alckmin, a exemplo do PP e do Solidariedade.

Depois de praticamente "fechar" São Paulo, Alckmin deve se dedicar à unificação nacional do PSDB. O prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto, desistiu de disputar prévias com o governador, não sem antes criticá-lo duramente. E o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso parece finalmente ter desistido de encontrar um nome de fora da política para disputar pelo PSDB e reconhecido, por fim, que Alckmin pode ser o candidato do PSDB.

FHC, no entanto, tratou de chamar o candidato e o partido às falas: não é o mercado que vai ganhar a eleição. "O país não é composto de mercado só. Quem for o candidato de mercado vai perder [as eleições]", disse Fernando Henrique durante o primeiro evento da série "A Reconstrução do Brasil" do Fórum Estadão, realizado na terça-feira. Dias antes, Alckmin havia anunciado o economista Persio Arida como coordenador de seu programa de governo.