Valor econômico, v. 18, n. 4472, 29/03/2018. Brasil, p. A4

 

TCU exclui dois principais ativos do leilão de petróleo

André Ramalho

Cláudia Schüffner

Rodrigo Polito

29/03/2018

 

 

Márcio Félix: expectativa de interesse por outras áreas de exploração

A Agência Nacional de Petróleo (ANP) realiza hoje a 15ª rodada de blocos exploratórios sem duas das áreas mais promissoras. Os blocos S-M-534 e S-M-645, na Bacia de Santos, retirados do leilão por decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), tinham potencial para levantar, juntas, pelo menos R$ 3,55 bilhões em arrecadação - o equivalente a 73% da soma dos bônus mínimos de todos os 70 ativos inicialmente incluídos na concorrência. A estimativa do Ministério de Minas e Energia é que a rodada arrecade entre R$ 400 milhões e R$ 450 milhões.

A decisão do TCU desagradou à equipe econômica e pegou o setor de surpresa, na véspera do leilão. O tribunal defende que a opção do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) de licitar os dois blocos sob o regime de concessão, e não partilha, traz riscos de prejuízos à União da ordem de R$ 2,37 bilhões - quando comparado o valor presente das participações governamentais nos dois modelos de contrato. Segundo o TCU, faltam justificativas para a opção.

Como os blocos S-M-645 e S-M-534 têm potencial de se conectarem à área de Saturno, que está dentro do polígono do pré-sal e será oferecido sob o regime de partilha, em junho, o TCU entende que eles deveriam ter sido classificados como estratégicos e leiloados também sob o regime de partilha. Para declarar uma área como estratégica é necessário que o CNPE proponha um decreto presidencial.

Segundo a secretária de fiscalização de óleo e gás do TCU, Gabriela da Costa e Silva, essa opção evitaria, no futuro, uma potencial unitização (individualização da produção de dois campos diferentes num único projeto, quando os reservatórios de duas áreas se conectam numa só jazida).

"Existe um regime fiscal diferenciado entre as áreas de concessão e partilha. No longo prazo, considerando-se que o prazo da exploração é de 30 anos, o fato de se dividir a área em dois regimes não parece vantajoso para a União. A unitização é o remédio para uma doença, e aqui foi criada uma unitização desnecessária. Com o agravante de serem dois regimes diferentes, sendo que há uma parte ainda não licitada, que é a parcela interna da área", afirmou a secretária ao Valor.

O tribunal também identificou a "possibilidade de interferência externa no trabalho técnico da ANP" e "excesso de contradições nas respostas" em relação às notas técnicas" da agência.

O diretor-geral da ANP, Décio Oddone, disse que a decisão sobre o modelo contratual da licitação cabia ao CNPE. "O que colocamos [para o CNPE] foi que existe a possibilidade de leiloar as áreas no regime de partilha e no de concessão. O CNPE discutiu e deliberou que não ia declarar a área estratégica", afirmou o diretor.

Já o secretário de Petróleo e Gás do MME, Márcio Félix, disse que, apesar da decisão do TCU, a 15ª rodada deve se manter atrativa. "Temos áreas interessantes nas bacias do Ceará, Potiguar, em Sergipe-Alagoas. Há outras áreas sendo ofertadas em Santos e Campos também. Esperamos que haja grandes atores nessas áreas", disse.

Segundo Félix, representantes do MME e do tribunal se reúnem segunda-feira para discutir uma solução para licitação dos dois blocos retirados da licitação de hoje. A intenção é voltar a leiloar as áreas em até seis meses, preferencialmente na 4ª rodada de partilha, marcada para junho. "Os blocos não vão sumir. Eles estão lá em baixo do mar e voltarão a ser leiloados. Vamos buscar o diálogo com o TCU", afirmou.

Questionado se as áreas seriam licitadas sob regime de concessão ou partilha, o secretário disse que o assunto ainda será debatido. Ele argumentou, no entanto, que o governo não tem "elementos suficientes" para afirmar que a licitação sob regime de partilha seria mais rentável para a União, como defende o TCU.

"O regime de partilha vale para as áreas estratégicas. As áreas estratégias são aquelas de baixo risco exploratório e elevado potencial de produção. Não temos elementos suficientes para afirmar isso [que os blocos excluídos são de baixo risco]", argumentou.

Os blocos S-M-534 e S-M-645 são adjacentes à área de Saturno, uma das duas únicas áreas da 4ª rodada do pré-sal, de junho, para as quais a Petrobras não tinha exercido direito de preferência. Por isso, a expectativa era que esses dois ativos despertassem o interesse das petroleiras privadas.

Félix argumenta, ainda, que o ministério prestou todas as informações solicitadas pelo TCU. Gabriela, no entanto, alega que alguns documentos só foram entregues ontem pelo ministério.

"O edital foi publicado sem que o TCU tivesse a oportunidade de analisar, em um amplo descumprimento dos normativos e assunção de riscos pela ANP", disse a secretária, que não vê pressa para licitar as áreas, já que os contratos só estão previstos para serem assinados em novembro.