Valor econômico, v. 18, n. 4488, 21/04/2018. Política, p. A8
Sem sair do lugar, 'Agenda 15' põe à prova força de Temer no Legislativo
Raphael Di Cunto
Fábio Pupo
21/04/2018
A agenda de 15 medidas econômicas lançada pelo presidente Michel Temer em substituição à reforma da Previdência Social completou dois meses na sexta-feira sem que nenhuma proposta tenha sido votada em plenário. A situação mostra a dificuldade do governo em mobilizar sua base no Congresso, cujas atenções já estão todas voltadas para a eleição. O Planalto também não tem cumprido sua parte: os três itens que ainda dependiam do Executivo sequer foram encaminhadas ao Legislativo.
A equipe econômica prometeu enviar três textos aos parlamentares: a reforma do PIS/Cofins, a extinção do Fundo Soberano e o uso de seus recursos e uma proposta para garantir a autonomia do Banco Central (BC).
Esta última iniciativa entrou na pauta da Câmara, mas por iniciativa do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que negociou diretamente com a instituição financeira. O governo, contudo, não se mobilizou para convencer sua base - e há até focos de resistência no Executivo, como uma contrariedade da Casa Civil a dar tanta liberdade para o órgão.
De qualquer forma, o projeto formatado pelo Executivo para a autonomia do BC passou pela equipe econômica e será recebido pela Casa Civil nos próximos dias. Pelo texto atual, a instituição financeira terá como único objetivo a inflação, o presidente terá mandato de cinco anos e a autoridade monetária não estará ligada a nenhum ministério.
Já a medida do Fundo Soberano, vista por integrantes da própria equipe econômica como algo simples de ser elaborado, ainda tem seus detalhes sendo discutidos dentro do Ministério da Fazenda. A iniciativa foi anunciada como um dos meios necessários para cobrir o buraco da chamada "regra de ouro" das contas públicas neste ano (a estimativa do Tesouro é levantar R$ 26 bilhões do Fundo). Ainda não há previsão de quando o texto será enviado ao Congresso.
Dentre as outras medidas prioritárias, o projeto mais avançado - também mais por inciativa de Maia do que de Temer - é a adesão automática dos consumidores ao Cadastro Positivo. O projeto, que a equipe econômica considera importante para reduzir juros para consumidores, teve votação postergada na última semana por risco de derrota.
Maia se reuniu pessoalmente com os maiores partidos da Câmara, junto com um economista de sua confiança e o relator do projeto, deputado Walter Ihoshi (PSD-SP), para explicar e defender a proposta. Nenhum ministro participou dessas articulações - e a resistência do PRB, da base do governo, foi determinante para que a votação fosse adiada para esta semana.
Outro alvo de resistência na base é a reoneração da folha de pagamento das empresas, desidratada por alterações. Como o projeto exige 90 dias (a noventena) para começar a produzir efeitos, e ainda precisa passar pelo Senado, os efeitos nas contas públicas de 2018 são cada vez menos expressivos.
Os demais projetos avançam vagarosamente, o que põe em dúvida a aprovação com um calendário tão apertado, a poucos meses das eleições. O principal exemplo é a privatização da Eletrobras. O governo queria aprovar em abril o texto, que ainda está na fase de audiências públicas na comissão especial da Câmara - que demorou quase um mês para conseguir se reunir.
Na equipe econômica, já se fala na privatização apenas em 2019 e que será um "avanço" se a desestatização ao menos se tornar irreversível para um próximo governo.
Já a regulamentação do teto remuneratório, que era vista como um auxílio para as contas públicas em 2018, também está travada. A comissão não se reuniu este ano e depende de reuniões com o Supremo Tribunal Federal (STF) para finalizar um parecer, o que é esperado para até maio.
O reforço na autonomia e controle das agências reguladoras finalmente começou a ser discutido, quase dois anos após chegar à Câmara, com a instalação da comissão especial que debaterá o assunto. O mesmo ocorreu com a nova lei de licitações que, um ano após a aprovação no Senado, começou a realizar audiências. Ambos, porém, têm calendário apertado.
A nova lei de finanças públicas, que atualiza as regras para elaboração do Orçamento, e as mudanças nas regras sobre depósitos voluntários no BC aguardam há meses que os líderes de partidos, inclusive da base, indiquem os integrantes das comissões especiais.
Dois projetos da "agenda 15" ficarão nas mãos da oposição: a lei de recuperação das estatais, que será relatada pelo deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA), e a mudança na relação do Tesouro Nacional com o Banco Central, relatada pelo deputado Sergio Vidigal (PDT-ES). Ambos estão na Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara, comandada por Almeida, e terão que passar ainda por mais duas comissões. Na mesma situação está a duplicata eletrônica, que aguarda indicação de relator na mesma comissão.
As duas iniciativas da "agenda 15" no Senado também não andaram. O projeto que mudaria as regras do distrato de compra e venda de imóveis não tem consenso nem dentro do governo e está com o relator desde outubro de 2016 para receber um parecer. A atualização da Lei Geral das Telecomunicações, após idas e vindas que envolveram o Supremo, agora terá que passar por votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e está desde a semana passada com um novo relator, o senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA).
A equipe econômica defende que a demora é normal e que faz parte do processo de discussão. Já a Casa Civil disse, em nota, que a velocidade não depende do Executivo: "as lideranças do governo levaram o rol [de prioridades] às presidências da Câmara e do Senado. Cabe aos presidentes das duas Casas a elaboração da pauta dos trabalhos e votações."