O globo, n. 31263, 12/03/2019. País, p. 4

 

Disputa de poder na educação

Gustavo Maia

Natália Portinari

Renata Mariz

12/03/2019

 

 

Vélez tenta estancar crise no MEC demitindo militares e aliados de Olavo de Carvalho

Pressionado por uma crise provocada pela disputa de poder no Ministério da Educação (MEC) entre a ala militar e grupos ligados ao escritor Olavo de Carvalho, o ministro Ricardo Vélez demitiu ontem ocupantes de seis cargos estratégicos da pasta, numa lista que contempla integrantes dos dois lados da briga.

As exonerações foram publicadas em edição extra do Diário Oficial da União depois de uma audiência, não agendada previamente, entre Vélez e o presidente Jair Bolsonaro.

Metade dos demitidos é formada por militares que atuavam na Secretaria-Executiva da pasta, incluindo o coronel da Aeronáutica Ricardo Wagner Roquetti, que tinha o cargo de diretor de programa da secretaria e cuja saída foi determinada pelo presidente Jair Bolsonaro.

Roquetti foi protagonista da principal crise no MEC na atual gestão, quando o ministério enviou uma carta às escolas do país pedindo que o slogan de campanha de Bolsonaro fosse lido e que crianças fossem filmadas cantando o Hino Nacional.

A carta do MEC teve enorme repercussão negativa, prevalecendo a avaliação de que Vélez estaria sendo excessivamente influenciado pela ala “ideológica” do ministério, ligada a Olavo de Carvalho. Os seguidores do escritor no ministério, porém, afirmavam que a responsabilidade pela carta lhes foi atribuída de forma errada, e que Roquetti havia chancelado a decisão.

'Ponham-no para fora'

A partir daí, a ala militar entrou de vez no alvo do grupo de Olavo. Ao GLOBO, na última sexta-feira, o escritor afirmou também que haveria no MEC pessoas interessadas em deter a “Lava-Jato da Educação”, uma auditoria em contratos antigos da pasta anunciada por Bolsonaro e por Vélez Rodríguez.

Junto de Roquetti, deixaram a Secretaria-Executiva do MEC Eduardo Miranda Freire de Melo, que era secretário-adjunto, e Claudio Titericz, que ocupava uma diretoria. Os dois também são das Forças Armadas.

Além disso, também estão na lista de demitidos ontem dois nomes ligados a Olavo de Carvalho: Silvio Grimaldo, que era assessor especial do ministro, e Tiago Tondineli, chefe de gabinete. Completou a lista de demissões Levi Diniz Lima, diretor na Fundação Joaquim Nabuco.

Ao cortar dos dois lados da briga, Vélez não satisfez seu padrinho na pasta. Na noite de ontem, Olavo apontou sua mira para o ministro numa rede social: “Só a renovação total e sem complacências pode salvar a educação brasileira. Recomendei o ministro Velez, mas, se ele cair no erro monstruoso que mencionei no post anterior, ponham-no para fora”, escreveu, depois de ter se referido a possíveis acordos do ministro com “grupos empresariais ou políticos que tinham alguma influência na educação brasileira”.

Antes, Olavo havia festejado a demissão dos militares e cobrado a cabeça de Luiz Tozi, secretário-executivo, segundo cargo na hierarquia do MEC. “Diante de uma operação de infiltração como essa, ninguém pode ser poupado. É preciso mandar todos para a rua, a começar com o tal Tozi, que estava capitaneando a operação com o Roquetti”.

Neste ponto, Olavo também não foi atendido. O secretário-executivo não apenas continua no cargo como dois dos indicados para substituir os demitidos da Secretaria-Executiva têm passagem peloCentroPaulaSouza,rede de ensino técnico do governo de São Paulo e de onde veio o secretário Luiz Tozi.

Um dos mais atacados por Olavo nas últimas semanas, o vice-presidente Hamilton Mourão, general da reserva do Exército, comentou ontem a briga entre militares e o escritor. O vice desdenhou da ingerência de Olavo no governo federal.

— Não sei até que ponto existe essa influência. Acho que o ministro (Vélez) está tentando organizar as coisas. Tem ocorrido alguns problemas que vocês já olharam, a questão do hino nacional, outras coisas que suscitaram polêmica, então acho que ele está tentando organizar as coisas.

O vice-presidente tentou minimizar uma disputa entre os discípulos de Olavo e os militares do governo, ressaltando que não vê uma “ala militar” com atuação única.

— Em primeiro lugar, não tem área militar. Tem alguns militares que foram designados pelo presidente para funções. Cada um está zelando pela sua área.

Aliada do escritor, que vive nos Estados Unidos, a deputada federal e procuradora aposentada Bia Kicis (PSL-DF) contou ao GLOBO que conversou no Planalto com o ministro depois do encontro reservado entre ele e o presidente. A avaliação dela é que Vélez está “firme no cargo”.

O passo a passo da controvérsia

1

Em 25 de fevereiro, o MEC pede que escolas gravem crianças cantando o hino nacional e leiam uma carta que termina com o slogan de campanha de Bolsonaro, “Brasil acima de tudo. Deus acima de todos”. Vélez Rodríguez reconhece o erro no dia seguinte.

2

Durante o carnaval, Vélez pede que seguidores de Olavo de Carvalho, como o assessor Silvio Grimaldo, mudem de função. Olavo fica sabendo e aconselha, em rede social, que seus alunos saiam do governo. Grimaldo anuncia que vai sair.

3

Ao GLOBO, Olavo afirma que integrantes do governo atuavam para barrar a Lava-Jato da Educação, iniciativa dos “olavetes”. Logo depois, culpa o coronel Ricardo Roquetti, diretor da pasta, por isolar seus alunos e assessorar mal o ministro.

4

O presidente Jair Bolsonaro conversa com Vélez e determina a saída do coronel Roquetti. Segundo Grimaldo, a ala militar culpa os olavetes pela carta às escolas. Os alunos de Olavo, por sua vez, dizem que Roquetti é quem chancelou o documento.

5

Em meio à crise, Vélez comparece na tarde de ontem a reunião no Planalto. É publicada a exoneração de seis assessores. Na lista, Roquetti, outros dois outros militares, além dos ex-alunos de Olavo Silvio Grimaldo e Tiago Tondinelli, chefe de gabinete do ministro.

6

Ainda ontem, Olavo de Carvalho vai às redes sociais e diz que Bolsonaro ainda deveria tirar Luiz Tozi, secretário-executivo, para “concluir a limpeza”. Segundo o escritor, militares ligados a Roquetti impedem a investigação de corrupção no MEC.

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Militar vai gerir redes sociais institucionais do Planalto

Karla Gamba

Natália Portinari

12/03/2019

 

 

Carlos Bolsonaro, que tem influência e as senhas das contas do presidente, diz que não haverá mudanças nos perfis pessoais

O coronel Didio Pereira de Campos, que chefiou a assessoria de imprensa do Exército de 2011 até este ano, será responsável por cuidar das redes sociais institucionais do Palácio do Planalto.

A escolha ocorre em meio a crises recentes causadas por publicações do presidente Jair Bolsonaro na internet — o coronel, contudo, não cuidará das contas pessoais de Bolsonaro.

Pouco depois da divulgação da nomeação de Campos, o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), que mantém influência e possui as senhas dos perfis pessoais do presidente, declarou que “o novo coordenador cuidará das redes institucionais” e que a contratação não tem relação com as polêmicas recentes envolvendo publicações de seu pai.

Na semana passada, Bolsonaro publicou um vídeo obsceno gravado em um bloco de carnaval em São Paulo e a postagem repercutiu negativamente no Brasil e no mundo.

Na semana passada, membros do Planalto, especialmente militares, tentaram convencer Bolsonaro a estabelecer uma nova estratégia de comunicação, após a polêmica causadas por suas publicações no carnaval. A intenção é controlar mais as falas públicas do presidente e evitar que ele fale sobre temas polêmicos.

Além das postagens do carnaval, outro episódio que ligou o alerta da equipe de comunicação do Planalto foi quando o presidente, em um café da manhã com jornalistas, admitiu flexibilizar pontos cruciais do texto da reforma da Previdência, entre eles a idade mínima para a aposentadoria das mulheres. As declarações pegaram o ministro da Economia de surpresa e não foram bem recebidas pelo mercado.

Em conversas com o presidente, assessores defenderam que as falas “atravessadas” e postagens polêmicas fizeram com que o governo tivesse que se explicar, gastando um tempo que poderia ser utilizado para dialogar e convencer a população sobre projetos do governo, como a reforma da Previdência.

Campos será diretor do Departamento de Publicidade da Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom), vinculada à Secretaria de Governo. A nomeação foi assinada pelo ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e publicada ontem no Diário Oficial da União.

Ele será mais um militar ligado à comunicação a ter cargo no governo Bolsonaro: o porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, é general e comandou o Centro de Comunicação do Exército, um cargo hierarquicamente superior ao que era ocupado por Campos. Além disso, a Secretaria de Governo, a qual a Secom está vinculada, é comandada pelo general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz.