Título: Um Natal longe da bonança
Autor: Dinardo , Ana Carolina
Fonte: Correio Braziliense, 20/08/2012, Economia, p. 7

Diante do pífio desempenho do Produto Interno Bruto (PIB), cujo crescimento o próprio governo já admite poder ficar abaixo dos 2% em 2012, os varejistas colocaram as barbas de molho. Em vez de começar a fazer as encomendas para o Natal em julho, como acontece normalmente, eles adiaram os pedidos para ver como a economia se comportará no segundo semestre. Analistas, no entanto, são pessimistas em relação à possibilidade de que o nível da atividade se recupere a ponto de assegurar um fim de ano melhor do que o de 2011. Esse é mais um indicador, entre muitos, de que a indústria brasileira terá (muita) dificuldade de reverter o péssimo resultado verificado na primeira metade do ano, quando a produção recuou 3,8%.

“Para não tomarmos nenhuma decisão precipitada, vamos esperar a reação da economia para então pensar nas vendas de dezembro”, destaca o vice-presidente de Relações Institucionais e Sustentabilidade da Whirlpool Latin America, Armando Ennes do Valle Júnior. O executivo da empresa dona das marcas Brastemp, Consul e KitchenAid ressalta que a indústria ficaria satisfeita se o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) dos eletrodomésticos permanecesse reduzido para salvar as vendas de fim de ano de ficarem negativas, como quase ocorreu em 2011, ano em que a companhia registrou zero de crescimento.

Assim como a Whirlpool, as demais empresas do setor apostam as fichas na prorrogação do IPI por pelo menos mais dois meses além de 31 de agosto, embora o ministro da Fazenda, Guido Mantega, tenha, de público, afastado essa possibilidade. O presidente da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), Lourival Kiçula, ressalta que a medida é essencial para que os dois segmentos fechem o ano com um crescimento nas vendas de até 20%. “A continuidade da redução do imposto, principalmente, nos produtos essenciais de uso dos consumidores, como máquinas de lavar e televisões, será vital para que o comércio tenha um desempenho melhor neste ano”, destaca.

Espera Nos shoppings, os comerciantes também estão em compasso de espera. “Até setembro ou outubro, as empresas terão mais clareza sobre as encomendas que serão realizadas. O problema diz mais respeito ao que acontece no mercado internacional do que no nacional”, acredita o diretor de Relações Institucionais da Associação de Lojistas de Shopping Centers, Luiz Augusto Ildefonso da Silva. Ele admite que as expectativas levantadas em janeiro pelo setor não deverão ser confirmadas no Natal deste ano. Na opinião do executivo, o crescimento será vegetativo, proporcional apenas ao aumento do número de lojas abertas em cidades do interior.

Para o diretor do Departamento Econômico da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), Denis Ribeiro, a demora em fazer as encomendas de fim de ano deve-se ao fato de as empresas estarem aguardando definições da área econômica. “As empresas esperam para ver como as coisas funcionam até outubro, novembro”, acredita. Ribeiro afirma que, para levantar a indústria, o governo precisa mostrar ao consumidor que a economia vai melhorar.

Até o momento, no entanto, os indicadores não são favoráveis ao setor industrial. Um dos principais termômetros do ritmo dos negócios é a produção de papelão ondulado, usado nas embalagens dos produtos. De acordo com o presidente da Associação Brasileira do Papelão Ondulado (ABPO), Ricardo Trombini, ainda não há indícios de recuperação: “O mercado continua andando de lado. Não há indicação de que as empresas estejam se preparando para um Natal melhor”. Em julho, as vendas do insumo se mantiveram estáveis em relação ao mesmo mês do ano passado.

Outro indicador que poderia dar algum alento à indústria, o de circulação nas estradas do país, tampouco mostra perspectivas positivas. O índice ABCR, da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias, apontou elevação considerável, em julho, mas somente na circulação de veículos leves (5,3%). O trânsito de veículos pesados aumentou apenas 0,7%. “O bom indicador relacionado aos veículos leves deve-se ao incremento na renda das famílias. Mas a circulação de pesados não subiu, um reflexo de que a indústria não conseguiu uma retomada”, explica o economista da consultoria Tendências Rafael Bacciotti.

Incertezas O professor de Finanças do IBMEC de São Paulo Nelson de Sousa diz que o cenário é de incertezas. “Não chegamos a um consenso sobre tendência. Os sinais são opostos e conflitantes, havendo setores que devem realizar encomendas e anunciam recuperação da economia e outros que informam estoques elevados e apresentam um futuro sombrio”, afirma o professor. Sousa acredita que o pagamento do décimo-terceiro salário e a disposição das pessoas para o consumo são aspectos favoráveis. Por outro lado, muitos produtos comprados no fim do ano têm preços atrelados à importação e o dólar subiu em torno de 22% ou 23% até agora. “Os importados ficarão mais caros”, prevê.

O economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas, avalia que há sinais tímidos de recuperação, como o registrado em junho deste ano, com alta de 1,5% nas vendas do varejo em comparação com maio, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Contudo, ele atribuiu o resultado a fatores pontuais, como os incentivos fiscais para veículos concedidos pelo governo federal, o aumento de renda e as quedas significativas do endividamento das famílias, que possibilitaram um maior poder de compra para os consumidores.

“O presente cenário não é satisfatório e os empresários já adiaram as encomendas para o Natal. No entanto, os varejistas ainda têm de dois a três meses para inverter os dados negativos”, pondera. Segundo o especialista, o crescimento das vendas de Natal deve ser moderado, mesmo se o governo prolongar, por mais alguns meses, as reduções do IPI. O presidente da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL), Roque Pellizzaro, ressalta que os lojistas ainda têm tempo hábil para recompor as mercadorias que, porventura, não forem suficientes para atender a demanda no Natal. “Nem todos os empresários começam a fechar seus pedidos em julho. Até agora não podemos constatar que houve atraso nas encomendas”, considera, mais esperançoso.