O globo, n. 31355, 12/06/2019. País, p. 8

 

Barroso rejeita ‘euforia’; Gilmar vê possível prova

André de Souza

Renata Mariz

Carolina Brígido

12/06/2019

 

 

Ministros do Supremo voltam a repercutir divulgação de conversas atribuídas a Moro e Dallagnol; para Marco Aurélio Mello, ministro da Justiça está mais longe de ser indicado e aprovado pra uma vaga na Corte

O vazamento de conversas atribuídas ao procurador Deltan Dallagnol e ao então juiz da Lava-Jato Sergio Moro continuou a repercutir no Supremo Tribunal Federal (STF). Enquanto o ministro Luiz Roberto Barroso rejeitou o que chamou de “euforia” em torno da divulgação, pelo site Intercept, dos diálogos, Gilmar Mendes disse que eventuais provas ilegais não são diretamente invalidadas. Já Marco Aurélio vê Moro mais longe de uma vaga no Supremo.

Embora ressalte que, como juiz, não deve formar convicção sobre o assunto neste momento, Barroso diz que é “preciso ter cuidado para que o crime não compense”, em referência à obtenção ilegal dos textos.

— A corrupção existiu, eu até tenho dificuldade de entender um pouco essa euforia que há em torno disso, se houve algo pontualmente errado aqui ou ali. Porque todo mundo sabe, no caso da Lava Jato, que as diretorias da Petrobras foram loteadas entre partidos com metas percentuais de desvios. Isso é um fato demonstrado, tem confissão, devolução de dinheiro —afirmou o ministro.

Para Gilmar Mendes, “juiz não pode ser chefe de força-tarefa”. O ministro do Supremo não citou o nome de Moro, mas a afirmação foi uma referência à reportagem do Intercept.

Desgaste para nomeação

Antes de uma sessão no STF, o ministro foi questionado se a eventual obtenção dos diálogos de forma ilegal — como por meio de um hacker— anularia qualquer prova oriunda disso, ele não descartou a possibilidade de contatos do tipo serem usados como provas:

— Não necessariamente (anularia), porque, se amanhã alguém tiver sido alvo de uma acusação, por exemplo, por assassinato, e aí se descobrir por um aprovai legal que ele não é o autor do crime, se diz em geral que essa prova é válida.

Já o ministro Marco Aurélio Mello avaliou que o vazamento traz desgaste a Moro:

—Coitado do juiz Moro. O presidente já o colocou numa sabatina permanente. Fica desgastado em termos de nome para o Supremo.

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A volta da Lava-Jato à arena política

Paulo Celso Pereira

12/06/2019

 

 

O vazamento de diálogos do juiz Sergio Moro com o procurador Deltan Dallagnol e de procuradores da República no Paraná é evidentemente negativo para os envolvidos. A proximidade entre os dois primeiros favorece a narrativa de que acusação e juízo tinham parceria, enquanto as falas isoladas de procuradores contra o PT dão combustível aos que veem partidarismo na atuação do MP.

A maior operação de combate à corrupção já feita no país, portanto, voltou à arena política. Para além da disputa imediata, no entanto, há mais perguntas que respostas. O que é pior: a invasão ilegal das comunicações de autoridades ou as possíveis violações por parte delas da isonomia no processo legal?

Dallagnol já é alvo neste momento de uma reclamação disciplinar no Conselho Nacional do MP. A princípio, provas obtidas ilegalmente, como os diálogos hackeados, não podem ser usadas para embasar processos. Ontem, no entanto, o ministro Gilmar Mendes lembrou que eventualmente são aceitas caso comprovem que um condenado não cometeu um crime.

No Congresso, há grande expectativa em relação ao embate que deve se dar nas próximas semanas entre parlamentares que surfaram na onda da Lava-Jato, e agora terão de defender a força-tarefa, e a ala crítica à operação. Esse último grupo ganhou agora um argumento para tentar aprovar a proposta sobre abuso de autoridade e fazer alterações, ou mesmo derrotar, o pacote anticrime de Moro. Qual lado prevalecerá?

Algumas dessas questões seguirão sem resposta. Mas uma última tem data para ser esclarecida: esse novo desgaste permitirá que Moro chegue ao Supremo ao fim do ano que vem, conforme prometido por Jair Bolsonaro?