O globo, n. 31309, 27/04/2019. País, p. 8

 

Mercado publicitário critica tentativa de controle

Tiago Aguiar

27/04/2019

 

 

Para associações do setor, interferência direta do Planalto nas ações comerciais de estatais prejudicaria concorrência com empresas privadas e afetaria liberdade dos profissionais da área

Empresas e associações do mercado publicitário reagiram com preocupação à possibilidade de o Palácio do Planalto, por meio da Secretaria de Comunicação Social (Secom), passar a controlar toda a publicidade das empresas estatais, inclusive as chamadas ações “mercadológicas”, em que há apenas disputa de mercado, e não posicionamentos institucionais do governo. A decisão de passar toda a publicidade estatal pelo crivo do Planalto foi anunciada pelo secretário de publicidade da Secom, Glen Valente, na última quarta-feira. Na noite de ontem, porém, o próprio Planalto admitiu que a ordem viola a Lei das Estatais, que protege a autonomia de empresas como o próprio Banco do Brasil. A interferência direta do governo na publicidade das estatais poderia ainda reduzir o poder de concorrência com o setor privado e limitara criatividade dos publicitários, argumentam críticos da ideia. Ênio Vergeiro, presidente da Associação dos Profissionais de Propaganda (APP), considerou “péssima” a decisão de submeter cada material de publicidade à Secom.

— Esses profissionais que estão na Secom não são habilitados e qualificados para poder dar qualquer tipo de crivo em campanhas mercadológicas. Empresas como Petrobras e Banco do Brasil são estatais, mas concorrem com a iniciativa privada — afirmou Vergeiro. Lucas Mello, CEO da agência Live, avalia que o trabalho das agências que atendem as estatais podem sofrer impacto em seu direcionamento criativo. Ele acredita que as agências receberão os briefings de uma maneira que evite a propagação da diversidade e da representatividade cultural.

— Se houver uma interferência maior do Planalto, a tendência é que (a publicidade) assuma um viés mais conservador nos costumes, alinhado com a pauta do governo. 

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Diversidade amplia público-alvo dos comerciais

27/04/2019

 

 

Embora o governo tenha vetado a propaganda do Banco do Brasil com destaque à diversidade, o mercado publicitário deve manter o tema em evidência nas propagandas do setor privado. Profissionais da área avaliam que a decisão do presidente Jair Bolsonaro contraria práticas do mercado que têm se consolidado nos últimos anos. Além da importância de se tratar o tema, a avaliação é que, ao dar espaço para todos os estilos de pessoas, marcas ganham mais a simpatia dos consumidores. Marcelo Paganini de Toledo, professor de Marketing e Comunicação na ESPM, conta que a campanha de uma empresa de cosméticos em 2015, com casais homossexuais, foi um marco que a coloca, até hoje, com forte entrada nesse segmento:

— A comunicação das empresas deve refletir o contexto da nossa sociedade. O Brasil é um país diverso e cada dia mais a convivência entre os diferentes é tema de atenção. Thaís Mendes, diretora da Squad, uma das principais agências de casting especializada em modelos de diversidade, diz que a campanha em questão tem como mote o que vem sendo feito cada vez mais no Brasil.

— O país é extremamente diversificado. Essa é a representação da população. As pessoas não são apenas brancas e com perfis europeus, pelo contrário. E são só essas que eram vistas na mídia, mas finalmente o mercado acordou para isso — avalia Thais.