Valor econômico, v. 19, n. 4597, 26/09/2018. Política, p. A7

 

Cancelamento de títulos é constitucional, diz STF

Luísa Martins

Isadora Peron

Marcelo Ribeiro

26/09/2018

 

 

O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por 7 a 2, que é constitucional o cancelamento dos títulos eleitorais dos cidadãos que não realizaram a biometria obrigatória. Dessa forma, foi negado o pedido do PSB para que os 3,3 milhões de cidadãos que não fizeram o procedimento pudessem votar nas eleições de outubro.

Os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Dias Toffoli acompanharam o relator, ministro Luís Roberto Barroso. Os únicos a divergir foram os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello. Os ministros Celso de Mello e Rosa Weber declararam-se impedidos e não participaram do julgamento.

De acordo com a tese vencedora, não há ilegalidade no modo como a legislação e a normatização do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) disciplinam a revisão eleitoral e o cancelamento do título em caso de não comparecimento para a sua renovação - o que inclui o cadastramento das digitais. "E, ainda que não houvesse impossibilidade jurídica, o TSE demonstrou de maneira insuperável as dificuldades técnicas e os riscos para as eleições de se proceder a reinserção de mais de 3 milhões de pessoas", observou o relator.

Em todos os votos dessa corrente, foi criticado o fato de o PSB ter impetrado a ação a poucos dias do primeiro turno, marcado para 7 de outubro. O ministro Gilmar Mendes se disse "perplexo", uma vez que os cancelamentos por falta de revisão eleitoral estão previstos desde 1985. "A dez dias da eleição, uma decisão dessa natureza seria inviabilizar o processo. Seria desfazer tudo o que foi feito com base na lei", complementou Cármen.

Por outro lado, Lewandowski votou por conceder a liminar. Ele acusou o TSE de "não querer fazer esforço de última hora" para incluir esses eleitores nos cadastros e disse que o cancelamento atinge eleitores mais pobres, que não tiveram o devido acesso à informação para realizar a biometria obrigatória. A medida foi exigida para 87,3 milhões eleitores de cerca de 2,8 mil municípios, em 22 estados. Reduto eleitoral do PT desde 2002, a região Nordeste foi a que teve o maior número de títulos cancelados.

Lewandowski lembrou que, em 2014, a diferença de votos entre Dilma Rousseff (vencedora) e Aécio Neves foi de apenas 3,5 milhões. Sem citar o candidato Jair Bolsonaro (PSL), criticou os questionamentos feitos sobre a segurança das urnas. "Imagine se tivermos uma eleição apertada como aquela? Uma diferença dessa natureza, em uma eleição que já vem sendo questionada por determinados setores - e não tenho pejo de dizer - antidemocráticos, como é que vamos ficar?", ponderou.

Ao acompanhar a divergência, Marco Aurélio disse que as resoluções do TSE preveem "sanções drásticas" que não podem se sobrepor à Constituição, que prevê o direito universal ao voto.

O placar final alinhou-se aos pareceres do TSE, da Procuradoria-Geral da República (PGR) e da Advocacia-Geral da União (AGU). Para esses órgãos, haveria insegurança jurídica nas eleições caso o Supremo concedesse a liminar para permitir a participação desses eleitores.

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Diap prevê PT como maior bancada

Raphael Di Cunto

26/09/2018

 

 

O Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) estima que o PT continuará a maior bancada da Câmara dos Deputados em 2019, o PSL de Jair Bolsonaro dobrará de tamanho e o número de siglas no Congresso pode subir de 26 para 32. O estudo divulgado ontem aponta que o Legislativo "não será muito diferente do atual, com pequeno crescimento da direta e da esquerda e encolhimento discreto do centro".

O "prognóstico preliminar" feito com base em análise dos principais candidatos e coligações estaduais diz que o PT elegerá de 55 e 65 deputados federais. O partido fez 68 parlamentares em 2014 e está, hoje, com 61.

Segundo a estimativa, o MDB do presidente Michel Temer disputará com PSDB e PP o posto de segunda maior bancada. Os emedebistas, que elegeram 65 deputados há quatro anos, estão com 51 e devem perder ainda mais espaço: farão entre 44 e 50 parlamentares. Os tucanos, que hoje são 49, elegerão de 42 a 50. O PP tem 50 deputados e deve fazer de 40 a 48.

Outros partidos do "Centrão", como PSD e PRB, devem ampliar suas bancadas (ver tabela). O PR ficará parecido: tem 40 deputados e perspectiva de eleger de 36 a 40. Já o DEM, do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), é um dos poucos partidos que o Diap estima que voltará menor das urnas. A sigla elegeu 21 deputados, mas cresceu com filiações e chegou a 43. A estimativa é que ele- ja entre 28 a 36 parlamentares.

Outros partidos que devem voltar menores, prevê o Diap, são o Podemos, do presidenciável Alvaro Dias, que tem 17 deputados e deve ficar com 10 a 13, e o Patriota, que disputa a Presidência com o deputado Cabo Daciolo (RJ) e deve fazer uma bancada de um a três deputados. O PSL, que abrigou a candidatura de Bolsonaro, tende a crescer de oito deputados para entre 15 e 18.

O estudo indica que a Câmara deve sair das urnas ainda mais fragmentada. Há quatro anos, 28 partidos elegeram representantes. Hoje 26 siglas têm cadeiras no Congresso, número que pode aumentar para 32. Legendas que disputam a eleição nacional pela primeira vez, como o Rede, da presidenciável Marina Silva, e o Novo, de João Amoêdo, agravariam o problema. Ambos têm podem eleger até 10 deputados.

A cláusula de desempenho, contudo, deve reduzir o número de partidos com as quais o futuro presidente da República terá que lidar. Quem não eleger pelo menos 9 deputados ou receber 1,5% dos votos para a Câmara ficará sem direito ao fundo partidário e a propaganda na TV e os eleitos poderão trocar de partido sem perder o mandato. Pelo estudo, 14 legendas podem ficar abaixo dos nove parlamentares.

Para Antônio Queiroz, diretor do Diap, haverá elevado índice de reeleição e muita "circulação no poder": deputados estaduais, senadores, ex-ministros, ex-deputados, suplentes bem votados, ex-prefeitos e ex-secretários se elegerão para a maioria das vagas de deputados que desistiram de concorrer ou que não terão sucesso nesta eleição. "Os poucos efetivamente novos serão policiais linha dura, evangélicos fundamentalistas, celebridades ou em razão da força do dinheiro e da relação de parentesco com oligarquias estaduais", diz.

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Para especialistas, campanha de Alckmin falhou na internet

André Guilherme Vieira

26/09/2018

 

 

A campanha do presidenciável Geraldo Alckmin (PSDB) falhou por apostar demasiadamente no horário eleitoral da TV, tratar a internet como ferramenta secundária e deixar de falar para a base eleitoral, avaliam especialistas em redes sociais e comunicação política entrevistados pelo Valor.

Dona da maior fatia da propaganda eleitoral na TV (44%), a campanha de Alckmin amarga meros 8% nas pesquisas de intenção de votos e, a 9 dias do primeiro turno, derrapa sem sinal de recuperação.

"A campanha do Alckmin parece incapaz de estabelecer conexão entre as peças apresentadas na TV e a internet. Por isso não gera debates nas redes sociais", observa o pesquisador sobre redes sociais, Fabio Malini.

"Se compararmos com a campanha do Aécio [Neves], em 2014, vemos que o então presidenciável do PSDB tinha a sua hashtag sempre nos primeiros lugares nos 'trend topics' [assuntos mais comentados nas redes sociais] o tempo todo, diz".

"O candidato que faz uma 'live' [transmissão ao vivo] tem, automaticamente, notificação para todos os seus seguidores. E é uma forma eficiente de mobilização na internet. O [presidenciável do PT, Fernando] Haddad tem usado essa ferramenta muito bem".

Na avaliação de Pablo Ortellado, professor doutor do curso de Gestão de Políticas Públicas da Universidade de São Paulo (USP), a maior dificuldade para Alckmin crescer nas pesquisas consiste no fato de ele disputar o mesmo campo eleitoral com o atual líder das intenções de voto, Jair Bolsonaro (PSL).

"O Bolsonaro é alguém que tem um enraizamento social muito grande, que passou pelo processo de mobilização em torno do tema de combate à corrupção, entre 2015 e 2017, e que tem apoio de quase todas as lideranças anticorrupção", afirma.

"A campanha eleitoral do Alckmin na TV é bem feita. Mas ele é um candidato de pouco carisma. E disputa com o Bolsonaro, que tem redes de comunicação e WhatsApp emprestadas para a sua campanha. E há muitos influenciadores anticorrupção engajados com o Bolsonaro. Isso explica, em parte, o insucesso da campanha do PSDB".

Já na opinião de Mauricio Moura, fundador do Instituto de Pesquisas Ideia Big Data, Alckmin e o PSDB acreditaram demasiadamente que apenas a comunicação de campanha superaria problemas do partido, como o fato de a legenda ter integrantes réus na Lava-Jato e a ausência de diálogo com a base eleitoral.

"Talvez essa seja a eleição em que os candidatos estão falando basicamente com a sua própria base. O PSDB perdeu votos no segmento acima dos 10 salários mínimos. A lição é que o PSDB se desconectou de sua própria base, dos locais de maior renda no Sul, Sudeste, nas cidades grandes. Era preciso focar todas as energias e recursos nesse grupo", pondera Moura.

"Falha importante foi ter apostado que somente uma boa comunicação resolveria esse passivo do PSDB. Os eleitores buscam mudança, seja na área econômica, seja na segurança pública. E essa campanha começou muito antes, tanto o Lula quanto o Bolsonaro começaram a fazer campanha muito cedo", afirma.

Para o jornalista e CEO da Torabit, Caio Túlio Costa, comparado a outros candidatos, Alckmin "tem uma presença muito tímida na internet".

"Ele apostou na velha mídia, na velha plataforma", diz.

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Tentativa de unir candidatos fracassa

Ricardo Mendonça

Fernando Taquari

26/09/2018

 

 

A tentativa de reunir numa mesa candidatos a presidente para montagem de uma frente em oposição à polarização Jair Bolsonaro (PSL) versus Fernando Haddad (PT) fracassou. O advogado Miguel Reale Júnior afirmou ontem ao Valor que passou os últimos dias se esforçando para promover uma reunião entre postulantes com essa finalidade.

Articulado com discrição, o encontro estava sendo programado para ocorrer ontem cedo em São Paulo, disse. Naufragou nas horas anteriores da reunião com as desistência, em sequência, dos presidenciáveis João Amoêdo (Novo), Marina Silva (Rede) e Henrique Meirelles (MDB). No fim, disse Reale, Geraldo Alckmin (PSDB) avaliou que não seria produtivo fazer reunião apenas com Alvaro Dias (Podemos). O tucano também acabou desistindo.

"Fizemos o nosso papel. Foi uma bela experiência, mas infelizmente não deu certo dessa vez", afirmou o advogado coautor da peça jurídica que resultou no impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016. Os convites e a organização do encontro estavam sendo feitos, segundo o advogado, por um grupo de ativistas chamado "Extremos, não. Voto, mas útil".

Reale conta que as cinco campanhas convidadas aceitaram enviar representantes para uma conversa prévia, por teleconferência, que ocorreu na manhã de segunda-feira. Um pouco antes do horário marcado, disse, o nome que representaria Amoêdo cancelou sua participação. "Disse que esse tipo de união era coisa da velha política", conta o advogado

Mesmo assim, afirmou, a conversa foi feita com nomes indicados pelos demais postulantes. "Foi ótima essa mesa virtual. O movimento conseguiu expor sua angústia, todos ouviram. Era o início de uma conversa para abrir uma terceira via no país."

Depois disso, porém, Marina desistiu, anúncio que começou a esvaziar a reunião principal. Na sequência, informa, chegou o aviso de cancelamento de Henrique Meirelles. "Aí o Geraldo [Alckmin] achou que iria ficar estranho fazer um encontro desse com as presenças só dele e do Alvaro Dias."

Reale explica que a iniciativa não tinha nenhuma relação com uma carta recém-divulgada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso pedindo união contra Bolsonaro e o PT. "Essa carta ajudava muito, era no mesmo sentido [da reunião]. Mas o que atrapalhou tudo foi o tuíte que ele [FHC] publicou logo depois. O tuíte enterrou a carta, deu muito trabalho para desfazer o estrago", completou.

No documento "Carta aos eleitores e eleitoras", divulgada no último dia 20, FHC fez um apelo pela união sem mencionar nome de nenhum candidato a ser ungido como representante da integração que queria promover. Mas pelo Twitter, minutos após a divulgação do texto, o ex-presidente afirmou que Alckmin é quem vestia "o figurino" descrito por ele na missiva.

Alvaro Dias disse que tinha interesse em participar da reunião chamada por Reale, chegou a confirmas sua presença, mas jamais cogitou abrir mão de sua própria candidatura. Segundo ele, sua ida ao encontro era para defender a própria candidatura.

Meirelles disse que foi consultado sobre o tema por um assessor dias atrás. Ele reproduziu assim a resposta que afirma ter dado ao assessor: "Não precisa de reunião. Basta o candidato do PSDB e de vários partidos do Centrão, Geraldo Alckmin, que está estagnado ou caindo nas pesquisas, renuncie a sua candidatura, me apoie. Porque eu sou o candidato do centro democrático que está crescendo".

Por meio de uma nota, a campanha de Marina informou que a assessoria da candidata foi procurada na semana passada por pessoas ligadas a Reale "com vista a um encontro com os candidatos Alvaro Dias e João Amoêdo". Os contatos prosseguiram até domingo quando, segundo a nota, foi informado que Alckmin e Meirelles também participariam.

"Diante do novo contexto, ainda no domingo a assessoria de Marina declinou do convite e sequer participou da reunião de segunda". Reale tem uma versão diferente. Diz que Marina teve, sim, um representante na reunião virtual da segunda, o "pastor Caio". Ele não soube precisar se foi o pastor Caio Fabio, da igreja Caminho da Graça, que anunciou apoio à candidata recentemente.

Alckmin disse que a reunião articulada por Reale nunca entrou em sua agenda. Ele afirmou que acha difícil uma união de candidatos neste momento.