Título: Advogados contestam a divisão por blocos
Autor: Abreu , Diego
Fonte: Correio Braziliense, 18/08/2012, Política, p. 3

A decisão do Supremo Tribunal Federal de fatiar a denúncia e julgar as acusações por itens dividiu as opiniões dos advogados dos 37 réus. Parte deles não gostou da metodologia proposta pelo ministro-relator, Joaquim Barbosa, e acatada pela Corte. Outros acham prematura avaliar as consequências da decisão. O maior receio entre os opositores da proposta é que não haja uma concreta individualização das condutas de cada réu. Mas venceu entre os magistrados a ideia de que o método de separar o julgamento por item da denúncia facilita o entendimento e vai agilizar a análise do caso.

Para o advogado Leonardo Yarochewsky, representante de um dos réus, o fatiamento compromete a unidade do processo. "O Supremo Tribunal Federal já está julgando pessoas sem prerrogativa de foro, o que não deveria. Agora, com o fatiamento do julgamento, há o risco de os ministros perderem o foco em cada indivíduo", comentou. "O relator deveria esgotar todo o seu voto para então passar a palavra para o revisor. Não importa que o voto seja longo, todos os ministros têm computador, tablets, para facilitar o acompanhamento", justificou Yarochewsky. Até agora, a conduta de sua cliente não foi analisada pelo ministro-relator, que, na quinta-feira, durante o primeiro dia de votação, citou apenas Marcos Valério e dois sócios, além do deputado federal e candidato à prefeitura de Osasco, João Paulo Cunha (PT-SP). Barbosa pediu a condenação dos quatro réus.

A metodologia do relator surpreendeu, porque a maioria dos advogados esperava que os réus fossem julgados na ordem em que aparecem na denúncia. Nesse caso, o ex-ministro José Dirceu seria o primeiro. A expectativa com relação a essa ordem era tanta que o advogado de Dirceu, José Luís Oliveira Lima, foi ao plenário na última quinta-feira para acompanhar o voto do relator. Já o advogado de João Paulo Cunha, Alberto Zacharias Toron, não esteve no Supremo porque não imaginava que Joaquim Barbosa abriria o julgamento por seu cliente.

O advogado Hermes Vilchez Guerrero defendia a metodologia proposta pelo ministro revisor, Ricardo Lewandowski, de que o julgamento fosse por réu, não por item da denúncia. "O ministro Lewandowski preparou um voto para cada acusado, como acredito que todos deveriam fazer. Nunca vi julgarem um crime em vez de julgarem uma pessoa", comentou Guerrero. "Isso não é bom para os réus e, acima de tudo, não é bom para a Justiça. O método adotado pelo Supremo pode gerar uma jurisprudência. Outros tribunais podem alegar que, se o STF julga assim, eles também podem", finalizou.

Defensor do empresário Marcos Valério, o réu mais citado na denúncia da Procuradoria Geral da República, o advogado Marcelo Leonardo alegou que a metodologia usada não segue as normas do próprio Supremo Tribunal Federal. "Não está de acordo com o regimento, ficamos surpreendidos." Questionado se a metodologia prejudica os réus, ele disse que ainda precisa avaliar melhor o andamento das votações. "Pode ser que sim, pode ser que não, não dá para saber."

Regimento O artigo 135 do Regimento Interno do STF, citado dezenas de vezes durante o debate da última quinta-feira, diz que, "concluído o debate oral, o presidente tomará os votos do relator, do revisor, se houver, e dos outros ministros na ordem inversa da antiguidade". Com base nesse dispositivo, Lewandowski argumentou que os magistrados só poderiam votar depois que Joaquim Barbosa esgotasse toda a sua análise, mas foi voto vencido.

Ex-ministro do STF e ex-presidente da Corte, Carlos Velloso não vê nenhuma ilegalidade no "fatiamento" do julgamento, apesar de reconhecer que a medida é inédita. "Isso vai propiciar um melhor entendimento por parte dos ministros. Se o relator lesse um voto de mais de mil páginas e, em seguida, o revisor também votasse por longos dias, a compreensão do caso ficaria prejudicada", argumenta o especialista. "Esse método adotado vai tornar o julgamento mais legítimo e mais compreensível. Na minha avaliação, não há qualquer atropelo ao regimento", acrescentou Velloso.

As fatias

Item I Relata como se deu o suposto esquema. Segundo a denúncia, trata-se de uma organização criminosa pela qual eram desviados recursos de contratos da SMP&B e do Banco do Brasil para empresas de Marcos Valério, o braço operacional e intermediário entre núcleo o político e o financeiro.

Item II Trata do crime de formação de quadrilha. Aponta a existência de uma "sofisticada organização criminosa" estruturada em núcleos. Na parte política, era liderada por José Dirceu e tinha também como integrantes Delúbio Soares, Silvio Pereira e José Genoino. Também seriam integrantes da quadrilha Marcos Valério, sócios e duas empregadas da SMP&B.

Item III Analisa o contrato entre a SMP&B e a Câmara dos Deputados, firmado em 2003 e considerado irregular pelo Ministério Público. O então presidente da Casa, João Paulo Cunha (PT-SP), e o empresário Marcos Valério foram denunciados pelo suposto desvio de dinheiro, favorecimento à agência, corrupção e peculato. Cunha responde também por lavagem de dinheiro. O item ainda trata do contrato do Banco do Brasil com a DNA Propaganda e os supostos crime de corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro praticados pelo então diretor de Marketing do BB, Henrique Pizzolato.

Item IV Lavagem de dinheiro que envolveria os integrantes dos núcleos financeiro e operacional. Dinheiro repassado por bancos à SMP&B era distribuído a políticos. Nesse quesito, Marcos Valério responde 65 vezes pelo crime de lavagem de dinheiro. A Procuradoria Geral da República pede que as penas impostas ao empresário, em caso de condenação, sejam multiplicadas pelo número de eventos criminosos. Na pena mínima, pode chegar a 195 anos.

Item V Gestão fraudulenta de instituição financeira. Engloba o chamado núcleo financeiro do mensalão. A Procuradoria Geral da República aponta irregularidades em empréstimos feitos por instituições financeiras às empresas de Marcos Valério e ao PT.

Item VI Trata de corrupção ativa, corrupção passiva, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro. Aborda a estrutura que teria sido montada por José Dirceu, José Genoino e Sílvio Pereira para, segundo a acusação, angariar ilicitamente o apoio de partidos políticos.

Item VII Refere-se à suposta compra de apoio político mediante o pagamento de propina, a partir de recursos que o chamado núcleo publicitário-financeiro teria repassado para o PT. O ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto é citado como integrante do esquema.

Item VIII A PGR aponta que a atuação da suposta organização criminosa tinha por objetivo principal negociar apoio político, pagar dívidas pretéritas do PT e também custear os gastos de campanha e outras despesas do PT e de aliados. Os publicitários Duda Mendonça e Zilmar Fernandes estão incluídos por terem recebido dinheiro do esquema e enviado para o exterior, o que caracteriza, segundo a denúncia, lavagem de dinheiro e evasão de dividas.